Análise da obra cinematográfica baseada na história de Tove Jansson
O filme ‘The Summer Book,’ dirigido por Charlie McDowell, proporciona uma profunda reflexão sobre os ciclos da vida e da morte, retratando a conexão entre gerações em um ambiente idílico. Com a participação da renomada atriz Glenn Close, na pele de uma avó que enfrenta o declínio da vida, a narrativa se desenrola em uma pequena ilha no Golfo da Finlândia, onde as memórias e a aceitação do inevitável se entrelaçam. A produção, que teve sua estreia no BFI London Film Festival, adapta com sutileza a obra original de Tove Jansson, conhecida por seus livros e ilustrações que encantam diversas gerações.
Visualmente rica e emocionalmente envolvente, a narrativa encontra sua força na interação íntima entre a avó e sua neta, Sophia, interpretada pela jovem e talentosa Emily Matthews. O filme evoca a saudade e a beleza nas lembranças, quando, em uma cena tocante, a avó lamenta a perda de suas memórias vívidas, remetendo a um tempo em que dormia sob as estrelas. Essa transição de experiências entre as gerações é uma constante no filme, onde Sophia tenta trazer à tona as lembranças da avó através de suas próprias experiências ao explorar a ilha, que simboliza tanto um lar quanto um espaço de cura.
O enredo se desenvolve em torno de uma tragédia não verbalizada que deixou o pai de Sophia, interpretado por Anders Danielsen Lie, em um estado de retraimento e tristeza após a morte de sua esposa. Este luto silencioso se torna um ponto central na dinâmica familiar. A avó, apesar de seu próprio desgaste físico, se apresenta como uma presença constante e confortante, oferecendo a Sophia um abrigo emocional em meio ao caos da ausência maternal. O roteiro, escrito por Robert Jones, habilidosamente balanceia o ambientalismo da narrativa com as complexidades dos relacionamentos humanos, refletindo um estilo contemplativo que privilegia a observação sobre a ação.
Embora a trama contenha um ritmo mais lento, que pode ser encarado como uma reminiscência do tempo gasto em ilhas, esse aspecto permite que o espectador saboreie cada detalhe da vida em ambiente natural. O ambiente, com suas águas geladas do Mar Báltico e tempestades repentinas, serve tanto como um cenário como um personagem em si, expressando a vulnerabilidade dos protagonistas em contraste com a força da natureza. A cinematografia de Sturla Brandth Grovlen capta a essência desse espaço quase místico, transmitindo essa atmosfera através de visuais impressionantes que falam por si mesmos. A presença da natureza não é apenas uma moldura; ela reflete e intensifica as emoções que os personagens experimentam.
Ciclos da vida apresentados por meio da aceitação e da empatia
A abordagem dos temas de luto e aceitação é desenvolvida ainda mais pelo relacionamento entre a avó e sua neta. Apesar de momentos de tristeza e tensão, há uma leveza nas interações que melhoram cada vez que estão juntas. Em uma das cenas cativantes, a avó e Sophia se aventuram para explorar uma casa moderna pertencente a recém-chegados à ilha, alterando temporariamente o ambiente rústico que lhes é familiar. Este episódio provoca risadas e reflete a resiliência da avó, mesmo frente à mudança. A avó exemplifica uma aceitação serena da vida e da morte, permanecendo carinhosa e curiosa sobre o futuro, mesmo quando confrontada diretamente com seu próprio destino inevitável.
As experiências compartilhadas culminam em um momento crucial quando a tempestade traz à tona o drama mais intenso do filme, representando uma quebra no ciclo de dor. A busca por algo emocionante, expressa por Sophia, leva a um evento que, embora arriscado, permite que a família se reconecte e comece a curar as feridas deixadas por sua perda. Esta passagem não apenas opera como um clímax narrativo, mas também sublinha o tema central da continuidade da vida que permeia toda a obra. A reconciliação emocional entre o pai e a filha é um dos momentos mais tocantes, proporcionando a Sophia um recurso emocional para lidar com a ausência de sua mãe.
A conclusão do filme é marcada por uma aceitação genuína, um retorno à natureza que ecoa a essência do texto original de Jansson. À medida que a avó se despede, abre-se espaço para um novo ciclo de vida, uma ideia que está presente em toda a obra. O final, embora melancólico, é também consolador. Ao deixar este mundo, a avó se dissolve na natureza que sempre fez parte dela, ilustrando de forma poética a ideia de que a vida é um ciclo eterno de começos e finais. ‘The Summer Book’ é um filme que não apenas narra uma história de amor familiar e perda, mas que também celebra a beleza e a complexidade da vida, reconhecendo a interconexão de todos os seres dentro deste vasto e encantador ciclo.