Na última segunda-feira, em um evento que se desenrolou sob as tensões de um passado colonial, o Rei Charles III enfrentou um inesperado protesto de uma senadora indígena durante sua visita ao Parlamento da Austrália. A senadora Lidia Thorpe, de maneira enfática, fez ecoar sua resistência ao afirmar: “Você não é meu rei”, ao ser confrontada com a presença da realeza britânica em um contexto que muitos consideram marcado por injustiças históricas. Esta cena emblemática ocorreu enquanto Charles e a Rainha Camilla estavam na capital australiana, Canberra, para se encontrar com líderes da nação.
A declaração da senadora e o clamor por reparações históricas
Logo após o discurso proferido por Charles, onde ele reconheceu a dignidade e a cultura dos povos indígenas australianos, a senadora começou a gritar seu protesto. Thorpe, que é descendente do povo DjabWurrung, Gunnai e Gunditjmara, demandou que fossem devolvidas as terras que, segundo ela, foram tomadas de seus ancestrais. Ao ser retirada por seguranças, a senadora reforçou o sentimento de resistência contra o que muitos consideram um legado opressor da colonização britânica. Este ato de protesto não foi uma ação isolada; ele se insere em um contexto mais amplo em que os povos indígenas na Austrália continuam lutando por reconhecimento, reparação e igualdade.
O discurso de Charles mencionou como os povos indígenas australianos têm compartilhado suas tradições e histórias ao longo das gerações, e, embora seu reconhecimento tenha sido um sinal positivo, muitos acreditam que tal posicionamento é insuficiente frente às demandas de justiça e reparação histórica. O reconhecimento de que os australianos indígenas nunca cederam sua soberania e que as negociações de tratado com a Coroa Britânica nunca ocorreram é um ponto crucial que Thorpe e outros ativistas levantam constantemente.
As lembranças de um passado doloroso e a luta por justiça
A situação atual da população indígena australiana é marcada por profundas desigualdades e discriminação sistêmica, consequências diretas do colonialismo que perduraram por mais de dois séculos. A chegada dos colonizadores britânicos na Austrália resultou em massacres de povos indígenas, um legado de dor que ainda repercute nas comunidades atuais. Para muitos, a visita da realeza britânica representa não apenas um encontro amistoso, mas um lembrete das injustiças e do trauma contínuo causados por séculos de opressão. Thorpe, que já havia descrito a então Rainha Elizabeth II como “a colonizadora”, e outros membros do Parlamento estão se mostrando cada vez mais insatisfeitos com a falta de ações concretas da Coroa Britânica para reparar essa herança de injustiça.
Atos de protesto e as reações da sociedade
Durante a visita real, a resposta do público foi um misto de celebração e protesto. Enquanto alguns australianos receberam calorosamente o rei e a rainha, segurando bandeiras e demonstrando amor pela monarquia, outros levantaram a bandeira indígena, expressando seu descontentamento. A Greens Party, da qual Thorpe é membro, emitiu uma declaração enfatizando que a presença do rei é, para muitos, um “lembrete visual do trauma colonial contínuo” que ainda afeta os povos nativos. A senadora Dorinda Cox, identificada como uma mulher Yamatji Noongar, enfatizou a necessidade de Charles ser claro em seu reconhecimento e apoio à justiça para os povos indígenas.
A resposta da Australian Monarchist League não tardou a surgir, exigindo a renúncia de Thorpe após o que chamaram de uma “demonstração infantil”. No entanto, a insatisfação com a monarquia se reflete em um crescente movimento de conscientização sobre as injustiças enfrentadas pelos povos indígenas na Austrália.
Um ambiente real com toques de leveza
Apesar das tensões, a visita também teve momentos de leveza e descontração. Durante um dos encontros, um alpaca chamado Hephner roubou a cena ao espirrar sobre o Rei Charles, momento que se tornou viral entre aqueles que acompanharam a visita. O rei, que se comprometeu a tratar questões ambientais de forma consistente, participou de atividades de plantio de árvores, enfatizando seu interesse por causas ecológicas que são especialmente críticas para a Austrália, dada sua vulnerabilidade às mudanças climáticas. O primeiro-ministro Anthony Albanese elogiou o trabalho de caridade da realeza, enquanto ressaltou a necessidade de ações concretas para combater a realidade das mudanças climáticas, que, para a Austrália, se tornam cada vez mais prementes.
Reflexão sobre a continuidade da questão colonial
À medida que a visita prossegue, especialmente com planos para a próxima parada em Sydney, onde o rei participará de recebimentos públicos, a expectativa é que os diálogos sobre colonialismo, reparações e reconhecimento ganhem destaque. Embora haja claramente um apoio significativo pela monarquia entre alguns australianos, a crescente voz dos povos indígenas e seus aliados promete que a conversa sobre a desigualdade colonial não será facilmente silenciada. Encarar o passado e trabalhar em direção a um futuro mais justo continua a ser uma necessidade urgente enquanto a Austrália avança.