O tema dos medicamentos bloqueadores de puberdade, utilizados por crianças transgêneros, ganhou nova relevância após a declaração de uma pesquisadora envolvida em um estudo financiado federalmente, que expressou preocupações sobre a publicação dos resultados. De acordo com informações do New York Times, a cientista afirmou ter adiado a liberação de dados por temores de que fossem “armados” em um clima político inflamado. Este assunto, envolto em controvérsias e debates emocionais, torna-se ainda mais relevante em um contexto onde discussões sobre o apoio a jovem transgêneros se intensificam, sendo permeadas por uma diversidade de perspectivas e implicações para a saúde mental e física de adolescentes.
Dilemas de Publicação e Suas Implicações
Os comentários da doutora Johanna Olson-Kennedy, diretora médica do Center for Transyouth Health and Development no Children’s Hospital of Los Angeles, refletem um dilema crítico no panorama atual das pesquisas. Uma de suas descobertas principais no estudo revelou que os bloqueadores de puberdade não demonstraram melhora na saúde mental de 95 crianças, com idades entre 8 e 16 anos, acompanhadas ao longo de dois anos. Essas crianças estavam em tratamento para atrasar mudanças físicas associadas à puberdade, que incluem crescimento de pelos corporais, menstruação e o aprofundamento da voz. Seus comentários, relatados pela mídia, optaram, por outro lado, por sugerir que os participantes estavam “em excelente estado” ao final do acompanhamento, uma afirmação que parece contradizer dados anteriores, que indicavam que mais de um quarto dos participantes apresentava níveis clínicos significativos de depressão, ansiedade e pensamentos suicidas.
Embora Olson-Kennedy não tenha retornado aos pedidos de comentários da mídia, as reações não tardaram a surgir na comunidade de pesquisa. A doutora Amy Tishelman, psicóloga e professora associada da Boston College, ressaltou a importância de tornar os dados públicos, especialmente quando financiados por dinheiro do contribuinte. Tishelman alega que manter a integridade científica é essencial e enfatizou que, embora os participantes do estudo não tenham apresentado alterações mentais visíveis, isso não implica que a terapia não tenha benefícios. Ela sugere que os bloquear de puberdade pode, de fato, ter impedido um declínio na saúde mental, especialmente em crianças que sofrem de dissociação de gênero.
Participação e Autonomia: O Que Os Estudos Revelam
É vital considerar o impacto psicológico da puberdade nos jovens transgêneros e como as intervenções médicas visam mitigar essa angústia. A literatura médica mostra que altos índices de suicídio e pensamentos suicidas são comuns entre crianças e adolescentes trans. A prática de prescrever bloqueadores de puberdade se baseia no chamado “modelo holandês”, que foi adotado a partir de pesquisas iniciais na Holanda, que mostram a eficácia na redução da angústia ligada à disforia de gênero.
A Endocrine Society, uma organização profissional composta por cientistas e médicos, endossa o uso de bloqueadores hormonais, afirmando que trata-se de uma abordagem segura e geralmente reversível, que permite tempo para exploração e consideração de opções pelos adolescentes e suas famílias. Em um contexto mais amplo, o debate está longe de ser unilateral. Uma revisão de pesquisa recente realizada no Reino Unido, conhecida como Cass Review, desafiou o uso de tais intervenções, afirmando que os benefícios não estavam claros. Esta crítica gerou um retrocesso na aplicação do tratamento no Reino Unido, refletindo uma tendência mais ampla de ceticismo em relação aos cuidados afirmativos para jovens.
Restrição de Cuidados e Impactos na Saúde Mental
Nos Estados Unidos, desde 2021, 26 estados aprovaram legislações que proíbem ou restringem o acesso a cuidados afirmativos para jovens. Isso inclui medicamentos para suprimir a puberdade, entre outros procedimentos médicos. Pesquisas indicam que essas restrições podem ter consequências graves, uma vez que, em estados que implementaram essas leis, as taxas de suicídio entre jovens aumentaram. Embora debates e discordâncias sobre essas políticas persistam, um estudo recente na revista JAMA Pediatrics reportou que mais de 220 jovens que tiveram acesso a bloqueadores de puberdade e hormônios durante a infância e adolescência relataram altos níveis de satisfação e baixos índices de arrependimento.
Os resultados desse estudo apontam que 97% dos participantes estão contentes e continuam com o tratamento, enquanto apenas 4% expressaram arrependimento em relação a esses medicamentos. Tishelman adverte que o foco fundamental nesse debate pode estar sendo obscurecido pelas controvérsias relacionadas aos achados do estudo de Olson-Kennedy, enfatizando que os cientistas podem estar se autocensurando por temer que seus trabalhos sejam utilizados contra a comunidade que buscam ajudar. A discussão em torno de bloqueadores de puberdade e seus efeitos continua a ser um ponto focal nas interações entre ciência, política e saúde pública, exigindo um tratamento cuidadoso e uma consideração clara das implicações éticas, científicas e sociais.