A parceria entre Google e Kairos Power busca reforçar a energia limpa para data centers em um cenário de alta demanda
Em uma movimentação significativa no setor de energia, o Google anunciou hoje que firmou um acordo com a startup de energia nuclear Kairos Power, com o objetivo de construir sete pequenos reatores nucleares que fornecerão eletricidade para seus data centers. Essa colaboração ambiciona agregar cerca de 500 megawatts de energia livre de carbono em um momento em que a demanda por eletricidade, especialmente para data centers e Inteligência Artificial (IA), está em ascensão. O cronograma prevê que as novas usinas estejam operacionais até o final da década, embora ainda não esteja claro se os reatores estarão conectados diretamente às instalações do Google, uma configuração conhecida como “behind the meter”, ou se a energia será injetada na rede elétrica, com o Google reivindicando a energia livre de carbono com base em seu acordo com a Kairos.
Este empreendimento coloca o Google no mesmo patamar de outras gigantes da tecnologia, como a Microsoft e a Amazon, que também estão recorrendo à energia nuclear para atender sua crescente demanda por eletricidade. Em setembro, a Microsoft anunciou um acordo com a Constellation Energy para reiniciar um reator na usina de Three Mile Island, que havia sido desativado em 2019. Paralelamente, a Amazon revelou seus planos de construir um data center de grande escala que será diretamente conectado a uma outra usina nuclear na Pensilvânia. Caso a Kairos cumpra o prazo de 2030, esse será um leve ajuste em previsões anteriores, uma vez que, até julho, a empresa havia estabelecido como meta iniciar operações comerciais no início da década de 2030, conforme mencionado em um artigo do Departamento de Energia dos EUA. Essa corrida em direção à eletricidade nuclear coloca a Kairos em competição com startups de fusão, muitas das quais têm como objetivo ativar usinas de energia em escala comercial antes de 2035.
A Kairos Power se destaca como uma nova geração de startups nucleares que está desenvolvendo os chamados reatores modulares pequenos (SMR), na tentativa de reduzir custos e acelerar a construção de usinas nucleares. Enquanto a maioria das usinas nucleares convencionais é de grandes dimensões, com capacidade superior a 1.000 megawatts, o que requer anos de planejamento e quase uma década de construção, a abordagem SMR busca implementar técnicas de produção em massa para diminuir os custos e acelerar a construção das usinas. Os dois mais recentes reatores fissionários nos EUA, os Vogtle Units 3 e 4, na Geórgia, foram comissionados em 2023 e 2024, respectivamente, encerrando um período de seca de sete anos. No entanto, ambos chegaram ao mercado com um atraso de sete anos e um custo adicional de 17 bilhões de dólares.
Os SMR estão tentando construir usinas nucleares de forma mais rápida e econômica, e a Kairos vai um passo além ao utilizar, em seu projeto, um sistema de resfriamento baseado em sais fundidos de fluorídeo de lítio e fluorídeo de berílio, em vez da água, que é a norma da indústria. O plano da startup para um reator de demonstração de 35 megawatts já recebeu a aprovação da Comissão Reguladora Nuclear, um feito que escapou a outra startup de SMR, a Oklo. Entretanto, apesar do sinal positivo regulatório, a Kairos ainda enfrenta desafios significativos. Até o momento, nenhum reator modular pequeno foi comissionado, o que implica que a viabilidade econômica dessa tecnologia permanece amplamente não comprovada. Além disso, o design de sais fundidos da Kairos desafia décadas de experiência da indústria que tradicionalmente confia em reatores refrigerados a água.
Um dos maiores desafios para a Kairos pode não ser técnico, mas sim relacionado à percepção pública. Embora 56% dos americanos manifestem apoio à energia nuclear, segundo pesquisas realizadas pelo Pew Research, 44% permanecem contrários. É possível que essa oposição cresça quando forem escolhidas as localizações dos reatores, uma vez que a pesquisa do Pew questionou apenas se os Estados Unidos deveriam expandir o uso da energia nuclear de forma geral, e não se favorecem a instalação de reatores nucleares em suas proximidades. Ademais, enquanto o apoio à energia nuclear está em um patamar elevado, a maioria das pessoas prefere tecnologias como eólica e solar, que estão disponíveis e possuem custos significativamente inferiores em comparação com novos investimentos em usinas nucleares. Em um mundo que busca soluções sustentáveis, a nova iniciativa da Google, em parceria com a Kairos, pode criar um caminho inovador, mas a aceitação pública e o sucesso no cumprimento das metas estabelecidas serão fundamentais para o futuro da energia nuclear.