A poucos dias da eleição presidencial americana, a situação no Oriente Médio passou por uma mudança significativa que, temporariamente, evitou o pior cenário para a administração do presidente Joe Biden e a campanha da vice-presidente Kamala Harris. Em um momento de grande tensão, a avaliação das autoridades de inteligência sinaliza que as operações militares de Israel contra o Irã estão a caminho de não elevar o conflito a um nível cataclismático. “Parece que eles não atingiram nada além de alvos militares. Minha esperança é que isso seja o fim”, comentou Biden após receber atualizações sobre as ações israelenses, apontando para uma tentativa de manutenção da estabilidade regional.
As preocupações iniciais eram válidas: o início do mês trouxe à tona um preocupante ataque de mísseis balísticos iranianos em direção a Israel, despertando temores de represálias massivas, possivelmente envolvendo alvos sensíveis, como instalações nucleares ou campos de petróleo no Irã. No entanto, embora o pior tenha sido evitado por enquanto, o complicado emaranhado que representa o conflito no Oriente Médio continua a ser uma questão crítica tanto para a administração Biden quanto para as perspectivas eleitorais de Harris. O ataque direto em solo iraniano traz a região a um novo ponto de perigo, criando expectativas sobre a reação de Teerã a essa retaliação militar.
Biden e Harris participaram de uma teleconferência com sua equipe de segurança nacional, onde foram informados sobre os desenvolvimentos mais recentes na região. Harris enfatizou a posição dos EUA em apoiar o direito de Israel à autodefesa, ao mesmo tempo que ressaltou a necessidade de uma desescalada das tensões. “Acreditamos firmemente que o Irã precisa interromper as ações que representam uma ameaça à estabilidade da região. Sempre estaremos ao lado de Israel contra qualquer ataque iraniano”, declarou a vice-presidente em uma coletiva de imprensa, sublinhando o delicado equilíbrio que o governo busca manter.
Porém, o cenário na região é tudo, menos calmo. As operações israelenses no Líbano se intensificaram, resultando na morte de centenas de civis, incluindo mulheres e crianças, enquanto a paciência da comunidade americana é testada. A situação em Gaza permanece precária, com as esperanças de uma nova proposta de cessar-fogo quase irreais após a morte do líder do Hamas, Yahya Sinwar, que Biden acreditou que poderia abrir um espaço para um acordo. Embora as negociações tenham uma janela de oportunidade, com encontros marcados esta semana no Catar, a previsão de resolução antes do dia 5 de novembro parece cada vez mais distante.
Os desafios são imensos para Biden e Harris, visto que a incapacidade de estabilizar a região é um ponto crítico que pode repercutir negativamente nas urnas. A expectativa inicial de que um ambiente calmo e controlado predominasse à medida que o Dia da Eleição se aproximava foi frustrada. Funcionários americanos acreditam que o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, não demonstra incentivo para encerrar suas operações em múltiplas frentes antes da votação. E não há dúvida de que Netanyahu vê em Donald Trump, candidato republicano e ex-presidente, um aliado próximo. Durante um comício em Michigan, Trump reuniu um grupo de imames sob os holofotes, destacando que os eleitores muçulmanos e árabes esperam um fim às guerras intermináveis e uma mudança de rumo na política do Oriente Médio, como o que ocorreu durante seu mandato.
O comportamento de Trump, que se mantém em contato constante com Netanyahu, não surpreendeu Biden, que expressou preocupação quanto à representação dos interesses dos EUA nas conversas. Kamala Harris, por sua vez, não apresentou evidências concretas de que seu possível governo adotaria uma abordagem diferente. Questionada em um evento da CNN sobre como impediria a morte de palestinos devido a bombardeios financiados com recursos do contribuinte americano, Harris voltou a se referir ao desenvolvimento de um acordo de cessar-fogo, sem descrever como superaria as dificuldades enfrentadas por Biden.
Perante as demandas e a fúria de eleitores árabe-americanos devido ao tratamento do governo em relação a Gaza, a vice-presidente não convenceu a todos sobre sua capacidade de trazer mudanças significativas. Abdullah Hammoud, o prefeito democrata de Dearborn, Michigan, uma das cidades com a maior concentração de árabe-americanos, optou por não endossar candidatos e encorajou os cidadãos a votar com base em sua consciência moral. “Não encontrei candidato algum, especialmente aquele com quem me afiliei, disposto a se desvincular do atual caminho que o presidente Biden nos levou no que diz respeito ao genocídio em Gaza”, trouxe à luz uma crítica importante sobre as dificuldades que a administração enfrenta em uma situação complexa nessa região do mundo.
A visita do Secretário de Estado, Antony Blinken, à região também não trouxe sinais de que o Hamas esteja disposto a rever suas exigências para a liberação de reféns, nem de que Israel estivesse mais interessado em obter um acordo. Sua atenção se voltou especialmente para o planejamento do pós-guerra em Gaza, embora os passos necessários para alcançar esse objetivo continuem muito distantes. Durante meses, Biden tentou sem sucesso pressionar Netanyahu para chegar a um acordo que acabasse com os combates em Gaza, acreditando que isso poderia reduzir as tensões regionais e possibilitar uma normalização mais ampla no Oriente Médio. Contudo, a realidade mostrou-se frustrante, com progressos quase inexistentes.
À medida que o clima de incerteza se aprofundava nas últimas semanas, Biden e seus assessores avaliaram cuidadosamente a resposta de Israel ao ataque de mísseis do Irã em 1º de outubro. Ao contrário do que ocorreu em abril, quando a interceptação bem-sucedida de foguetes e drones iranianos levou Biden a encorajar Netanyahu a “celebrar a vitória” e evitar represálias, a gravidade do ataque de mísseis desta vez exigia uma ação. A administração americana, em uma comunicação honesta, enfatizou que não apoiava ataques às instalações nucleares do Irã e recomendou evitar alvos estratégicos como os campos de petróleo.”
Durante a chamada em 9 de outubro, a primeira conversa em quase dois meses, Netanyahu tranquilizou Biden ao afirmar que esses alvos não estavam em sua mira, embora houvesse pressão de alguns conservadores em seu governo para aproveitar a fraqueza iraniana. Essa foi uma das raras ocasiões em que o conselho de Biden foi seguido por Netanyahu, que, mesmo assim, deixou claro que a tomada de decisões de seu país seria independente das orientações de Washington.
A situação permanece tensa e incerta, e aquilo que ocorrer a seguir está completamente fora do controle de Biden. Os desafios que se apresentam, tanto em termos de política externa quanto nas repercussões eleitorais, refletem a complexidade de um cenário mundial em constante mudança e as dificuldades de uma administração que busca navegar por águas turbulentas no Oriente Médio.