A trágica perda de Fran: um alerta sobre o ameaçado ecossistema marinho

No verão de 2022, durante um passeio pela praia em Half Moon Bay, na Califórnia, avistei uma cena que se tornaria uma amarga lembrança. Ao ver algo estranho se aproximando nas ondas, reconheci que se tratava de uma baleia morta que, ao atingir a costa, deflacionou. O que tornava essa situação ainda mais tocante era que aquela baleia era Fran, uma das mais famosas da nossa base de dados. Segundo Ted Cheeseman, criador da HappyWhale.com, uma plataforma que registra avistamentos de baleias e que contém mais de 850 imagens de Fran, caracterizadas por suas marcas na cauda, a perda dela representou um profundo impacto emocional para muitos. “Ela tinha uma grande personalidade”, declarou Cheeseman, ao lembrar que Fran costumava interagir de forma brincalhona com os barcos de observação de baleias, criando um ambiente de alegria e aprendizado. Infelizmente, Fran foi vítima de uma colisão com um dos inúmeros navios de cruzeiro e cargueiros que realizam mais de 200 milhões de viagens anuais. Essa triste realidade levanta a questão sobre o verdadeiro número de baleias que perdem a vida em encontros com embarcações, já que a maioria afunda após o impacto, tornando a contagem exata um desafio impossível.

Desafios e ameaças à vida marinha

Conforme apontado por Sean Hastings, gerente de políticas da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA), os impactos de embarcações e os emaranhados em equipamentos de pesca são as principais ameaças enfrentadas pelas baleias. Espécies como a baleia azul, a jubarte e a baleia-de-direção estão na lista de animais em risco de extinção, e a baleia franca do norte, que já é praticamente extinta, conta com apenas cerca de 350 indivíduos restantes. Hastings enfatiza a importância da preservação dessas vidas, afirmando que cada baleia conta na recuperação das populações dessas espécies ameaçadas. Apesar das crescentes preocupações ambientais, existem vozes dentro da indústria de transporte marítimo que reconhecem a gravidade da situação. Bud Darr, diretor de políticas da MSC, a maior companhia marítima do mundo, declarou que não existe ninguém na indústria que deseje causar danos a essas majestosas criaturas. Ele elucidou que a sala de comando dos navios está a centenas de metros do casco, dificultando a visibilidade e a tomada de decisões rápidas ao detectar a presença de uma baleia no caminho. Como Darr destacou, “o navio é um objeto extremamente grande”, o que dificulta não apenas a percepção da abordagem de uma baleia, mas também seu impacto sonoro e velocidade.

Possíveis soluções: reconfigurando rotas e estratégias de redução de velocidade

Dentre as abordagens sugeridas para minimizar as ocorrências de colisões entre navios e baleias, uma é a reconfiguração das rotas de navegação. Darr comentou que, se fosse possível mover as operações de navios cerca de 15 milhas mais para o mar na costa do Sri Lanka, o risco de colisões poderia ser reduzido em até 95%. Mas essa solução depende da viabilidade das vias de acessos às marinas, que muitas vezes não possuem espaço adequado para alterações de trajetória. Como alternativa, a redução da velocidade dos navios de cruzeiro e cargueiros, de aproximadamente 18 milhas por hora para 12 milhas por hora, também foi discutida. Essa diminuição proporcionaria um tempo maior para que as baleias pudessem sair de suas trajetórias, aumentando a probabilidade de sobrevivência em caso de impacto. Além disso, a estratégia de desaceleração beneficiaria o meio ambiente, pois, conforme Hastings, navios mais lentos liberam menos poluição do ar e emissões de gases de efeito estufa.

Tecnologia como aliado na segurança marinha

No entanto, tanto a reconfiguração de rotas quanto a redução de velocidade exigem um fator essencial de informação para os capitães de navios: a localização das baleias. É nesse sentido que a tecnologia se torna uma aliada fundamental. O Instituto Oceanográfico Woods Hole opera uma frota de veículos autônomos, conhecidos como Slocum Gliders, que “voam” abaixo da superfície do mar, ouvindo o canto das baleias. Esses veículos emergem a cada duas horas para transmitir os dados coletados de volta a uma central. Além disso, uma rede de bóias equipadas com microfones é implantada para complementar a coleta de informações. O objetivo principal dessas inovações é fornecer dados precisos sobre as localizações das baleias, permitindo que os capitães reduzam a velocidade ao se aproximar delas. No entanto, na costa oeste dos Estados Unidos, as medidas de desaceleração permanecem não obrigatórias, resultando ainda em muitos navios navegando em alta velocidade, ignorando os avisos. Por meio do WhaleSafe.com, é possível acompanhar os trajetos dos navios, a localização das baleias e a conformidade das companhias de transporte, revelando que aproximadamente 30% ainda insistem em manter a velocidade máxima, desconsiderando as advertências recebidas.

Esperança para o futuro das baleias e ecosistemas marinhos

Mark Baumgartner, um dos responsáveis pelas pesquisas nas áreas de ecologia marinha em Woods Hole, mantém uma atitude cautelosa, mas otimista em relação ao futuro das baleias. Entretanto, a luta pela conservação das espécies continua uma batalha diária, com a necessidade urgente de regulamentações mais rígidas para garantir a proteção das habitantes do mar. A respeito da pequena Aria, a cria de Fran que acabou órfã, Cheeseman recebeu notícias que encheram seu coração de esperança ao confirmar a avistagem de Aria, uma luz em meio à escuridão provocada pelas recentes tragédias de colisões. Ele expresseda seu desejo de que Aria venha a se tornar mãe e que, com a implementação de práticas de proteção, as histórias de sucesso no resgate das baleias se tornem cada vez mais frequentes. O caminho para a recuperação das populações de baleias é complexo, requerendo a união de ciência, tecnologia, conscientização e esforço político. Contudo, o futuro deles poderá ser muito mais promissor se houver um comprometimento contínuo com medidas eficazes de proteção e uma busca ativa pela recuperação do saudável ecossistema marinho.

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