O clima está tenso no Los Angeles Times, onde a decisão editorial de não endossar um candidato à presidência nas eleições de 2024 gerou uma onda de renúncias significativas. Na última quinta-feira, três importantes jornalistas deixaram o periódico, cavando ainda mais a ferida aberta nas relações internas da redação. A controvérsia se intensificou após alegações de que o proprietário do jornal, Patrick Soon-Shiong, interferiu diretamente no processo de endosse, gerando indignação entre a equipe.
um cenário de incerteza e frustração na redação
A saída de Mariel Garza, editora da página de editoriais, foi especialmente impactante, uma vez que ela era membro ativo do conselho editorial. Em uma entrevista à Columbia Journalism Review, Garza expressou sua insatisfação com a decisão de não endossar um candidato, afirmando que estava insatisfeita com o silêncio imposto neste momento crítico. “Eu estou renunciando porque quero deixar claro que não estou bem com a nossa inatividade. Em tempos perigosos, pessoas honestas precisam se manifestar. É assim que estou me manifestando”, declarou Garza, cuja posição sempre foi de fervorosa defensora de valores democráticos.
Outros dois profissionais que decidiram deixar o jornal foram Robert Greene e Karin Klein. Greene, um renomado escritor editorial, havia ganhado um Prêmio Pulitzer em 2021 por seu trabalho sobre o sistema de justiça criminal em Los Angeles, enquanto Klein foi uma voz influente em questões relacionadas à educação e meio ambiente. As suas saídas foram vistas como perdas significativas para a redação, elevando uma atmosfera de descontentamento e desapontamento. Hugo Martin, membro do conselho da guilda dos jornalistas do Los Angeles Times, descreveu essas renúncias como “uma grande perda para a redação e o conselho editorial”, sendo o sentimento predominante entre os colegas de trabalho que muitos estavam “indignados” com a decisão de liderança.
As discussões sobre a ausência de um endosse claro durante a eleição presidencial estão longe de ser uma mera controvérsia interna. Em sua entrevista, Garza revelou que o conselho estava na iminência de endossar a candidatura da democrata Kamala Harris. Segundo Garza, ela já havia esboçado um editorial com a decisão, mas a interferência do proprietário rapidamente desgastou essa proposta. Apesar de reconhecer que o endosse poderia não influenciar as decisões de voto dos leitores, Garza defendia a importância de se expressar a consciência, destacando a necessidade de um debate aberto e honesto em momentos desafiadores.
o papel do proprietário e a resposta da comunidade
O dono do Los Angeles Times, Patrick Soon-Shiong, emitiu uma declaração sobre o ocorrido, revelando que tinha oferecido ao conselho editorial a oportunidade de elaborar uma análise “factual dos pontos positivos e negativos de cada candidato”. Na visão de Soon-Shiong, essa abordagem permitiria que os leitores decidissem de maneira mais informada e imparcial sobre quem seria o candidato mais adequado à presidência. Entretanto, sua perspectiva não parece ser compartilhada por muitos na redação, que já demonstraram sua indignação em uma reunião emergencial via Zoom, que atraiu cerca de 100 membros, em menos de um dia.
As renúncias de Garza, Greene e Klein não são apenas um reflexo de um dissenso em torno da política de endosse do jornal; elas também sinalizam uma crise maior que abala as fundações do periódico em um período em que a integridade e a transparência são mais necessárias do que nunca. Essa situação oferece uma visão clara das tensões enfrentadas por instituições de mídia tradicionais, as quais se veem à mercê de cadeias de comando cada vez mais motivadas por interesses pessoais e comerciais, em um contexto onde as preocupações éticas parecem ser colocadas de lado em prol de uma liderança controladora.
À medida que o Los Angeles Times enfrenta esta crise, a espera agora se volta para como o jornal se reerguerá ou se encontrará em um estado de confusão e declínio. Os leitores, por sua vez, devem estar atentos a essas mudanças, pois o impacto na qualidade da informação e na integridade do debate público pode ser significativo.