A televisão é um espelho da sociedade, refletindo as tensões, os amores e as complexidades do ser humano. Em tempos recentes, a série da Netflix, ‘Nobody Wants This’, protagonizada por Adam Brody e Kristen Bell, abordou de maneira leve e bem-humorada um relacionamento inter-religioso que cativou o público e garantiu uma rápida renovação para a sua segunda temporada. No entanto, quando falamos sobre a temática de relacionamentos inter-religiosos na televisão, não podemos esquecer da série ‘Bridget Loves Bernie’, que, apesar de ter sido lançada há mais de meio século, deixou uma marca indelével na memória dos telespectadores e na história da televisão. Criada por Bernard Slade, autor conhecido por seu trabalho em ‘The Flying Nun’, ‘Bridget Loves Bernie’ fez sua estreia em 16 de setembro de 1972, no horário nobre. A série radiava uma oportunidade única: uma comédia romântica que explorava a união de uma professora católica irlandesa, Bridget, interpretada por Meredith Baxter, e um motorista de táxi judeu, Bernie, interpretado por David Birney. O enredo não apenas atraía risos, mas também abordava as diferenças culturais que sempre existiram entre as tradições religiosas.
A série, no seu primeiro ano, foi um sucesso de audiência, posicionando-se como a quinta mais assistida na tela da época, uma façanha notável considerando a sua controvérsia. A química entre os protagonistas era palpável, e muitos se perguntam como o amor poderia prevalecer contra a forte oposição, especialmente de organizações como a Liga de Defesa Judaica, que considerou a representação de um casamento inter-religioso um ataque às tradições judaicas, levando a protestos e boicotes. Essa forte reação social levou à rápida cancelamento da série após uma única temporada. Meredith Baxter recorda-se de ter ficado confusa e abatida com a decisão da emissora, já que o programa estava indo bem em audiência e críticos o elogiavam. Segundo ela, não houve uma explicação clara da CBS na época, e a decisão de cancelamento acabaram com o entusiasmo que ela e os outros membros do elenco tinham pelo projeto. Esta rejeição à série que tinha potencial, e foi vista como a série de maior audiência já cancelada, destaca a luta constante que as produções enfrentam quando tentam romper com tabus sociais.
Ademais, mesmo com sua curta duração, o legado de ‘Bridget Loves Bernie’ ecoou nas produções que vieram a seguir, pavimentando o caminho para séries que parcelaram discussões semelhantes e complexas de maneira mais autêntica e, se possível, menos polêmica. O sucesso de ‘Nobody Wants This’ também pode ser visto como um resultado do caminho previamente trilhado por outras produções corajosas na representação de relacionamentos inter-religiosos. Com uma abordagem mais leve e contemporânea, a série ressoa em uma geração que está mais aberta ao diálogo e à aceitação das diferenças.
Num tom quase nostálgico, o produtor da série original, Jerry London, lembrou-se de ‘Bridget Loves Bernie’ com carinho, afirmando que a presença brilhante dos protagonistas foi o que realmente capturou o coração do público, mesmo que por um breve período. De fato, Baxter e Birney não apenas compartilharam a tela, mas também se casaram na vida real em 1974, embora o matrimônio tenha terminado em divórcio 15 anos depois. Baxter, em sua memória, mencionou a experiência dolorosa de viver um relacionamento abusivo que trouxe à tona discussões sobre a violência doméstica. Apesar dos desdobramentos trágicos, sua contribuição para a cultura pop permanece. Essa realidade traz à tona questionamentos sobre o que deve ser representado na tela, a escolha de temas e a repercussão que eles têm na sociedade.
Ao refletirmos sobre a trajetória de ‘Bridget Loves Bernie’ e de sua contemporânea ‘Nobody Wants This’, compreendemos que o amor entre pessoas de diferentes crenças pode ser um tema repleto de nuances, lutas e conquistas. Embora um espetáculo tenha encerrado antes de seu tempo, o outro está apenas começando a sua trajetória. Assim, o ciclo continua, e a audiência permanece ansiosa por mais histórias que desafiem as normas e celebram a diversidade. No final das contas, a luta por aceitação e amor é uma história que todos nós desejamos contar e ouvir.