A cidade de Kherson, localizada no sul da Ucrânia, tornou-se um palco de horror para seus habitantes, que, lamentavelmente, agora têm que esperar por dias de chuva intensa para encontrar alívio dos incessantes ataques aéreos. Esta mudança climática é o único fator que reduz a atividade de drones russos que sobrevoam a região, tornando-se uma nova rotina de sobrevivência. Desde o início deste outono, o número de ataques às vidas civis disparou, com relatos de interceptações indiscriminadas, atingindo pedestres, veículos, coletivos e até ambulâncias – uma clara demonstração da brutalidade e desumanidade dos ataques.

De acordo com autoridades locais, a escalada de ataques aéreos é alarmante. Desde o início de setembro, pelo menos 14 pessoas perderam a vida por conta das operações com drones, além de 222 adultos e três crianças terem ficado feridos. A dor e o desespero sentidos por quem vive em Kherson são traduzidos em palavras de cidadãos que, sem medo de expor suas angústias, relatam a total indiferença do inimigo. “Eles não se importam com quem estão atingindo. Avós, avôs, homens ou mulheres, não faz diferença”, denunciou Tetyana Yakovleva, uma trabalhadora de fábrica e voluntária humanitária da suburbana Antonivka. Para os locais, a rua que leva a Antonivka ganhou o nome de “estrada da morte”, servindo como um lembrete sombrio das batalhas que ali ocorreram e da proximidade mortal das forças russas.

Kherson é a maior cidade ucraniana localizada na linha de frente e foi a primeira grande cidade a ser ocupada pela Rússia, em março de 2022, permanecendo sob controle inimigo até sua libertação oito meses depois. No último verão, partes da cidade enfrentaram inundações após a destruição da represa de Nova Kakhovka, que fica 58 quilômetros a montante do rio Dnipro, em território sob controle russo. Apesar de ter sido libertada, o espectro da ocupação ainda assombra a região, com instalações militares russas visíveis no horizonte.

O cenário é desolador. Tetyana Yakovleva, que permaneceu em sua aldeia durante a ocupação russa, foi ferida diversas vezes desde que o conflito começou. Sua história reforça o desespero da população local. Recentemente, um drone atacou um abrigo onde ela prestava assistência humanitária, onde relatou: “O drone ficou pairando sobre nós, por um longo tempo. E então, ele lançou uma granada ao lado da porta. Nós todas ficamos em estado de choque.” Ao falarmos de atrocidades de guerra, tornamo-nos mais sensíveis ao horror que se esconde no cotidiano dessas pessoas. “É realmente assustador… Antes de sairmos, seguimos o olhar para o céu. Temos que nos certificar de que não há um zumbido”, acrescentou ela, destacando o inusitado em sua nova rotina.

A dinâmica dos ataques drone é complexa. Fontes das Forças Armadas Ucranianas indicam que não há uma lógica militar clara por trás da estratégia russa que tem como alvo as populações civis. Um dos membros ouvidos afirmou que “é apenas para aterrorizá-los”. O volume de ataques é alarmante: mais de 2.700 drones foram disparados na região em setembro, já em outubro, os números já ultrapassavam 1.500, segundo Oleksandr Prokudin, chefe da administração militar da região de Kherson. A velocidade e o tamanho reduzido dos drones tornam a defesa das forças ucranianas quase impossível. Dificultades em interceptar os dispositivos são muitas vezes intensificadas por suas operações em altitudes e frequências cuja detecção é desafiadora, conforme apontou Kateryna Stepanenko do Instituto para o Estudo da Guerra.

A escalada dos ataques aéreos na região coincide com a retirada de forças ucranianas de posições na margem oriental do rio Dnipro. Observadores e analistas acreditam que, ao mudar o foco de ataques a grupos ucranianos em locais como Krynky, os russos intensificaram suas operações contra civis em Kherson. Adicionalmente, a pressão sobre os militares russos para manter a intensidade dos ataques é palpável, particularmente em face de preocupações sobre redisposição de suas forças em outras frentes de batalha.

Os relatos de atentados dirigidos a infraestruturas civis são frequentes. Uma das cenas mais impactantes ocorreu recentemente quando uma ambulância foi atingida enquanto atendia civis em Kherson, ferindo gravemente dois paramédicos. Essa é a segunda ocorrência de ataque a ambulâncias nas últimas semanas, e a comoção entre os residentes é evidente. “Sobreviver à ocupação foi aterrorizante, e sobreviver à enchente foi um milagre. Mas esses ataques aéreos são insuportáveis”, desabafou Natalya, residente de Antonivka, que também sofreu ferimentos em um ataque anterior. “É como se estivéssemos sendo caçados”, ela completou, reforçando as tensões que permeiam a vida cotidiana na região.

A violência russa em Kherson levanta questões sérias e cruciais sobre o direito internacional. A direção intencional de ataques contra civis e infraestrutura não militar é considerada um crime de guerra de acordo com as convenções internacionais. Apesar das repetidas negações da Rússia sobre a acusação de ataques a civis, registros ao longo do conflito demonstram uma inegável intensidade e frequência neste tipo de ataque. Atualmente, a vida em Kherson é marcada por um medo constante, refletindo o desespero de uma população que, em meio a tantas adversidades, ainda busca encontrar alguma esperança em um futuro de paz.

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