Investimento em Publicidade Centra Críticas às Posturas de Harris em Relação a Direitos Transgêneros
Durante o primeiro semestre de outubro, mais de 21 milhões de dólares foram investidos em anúncios de televisão pelo ex-presidente Donald Trump e seus aliados, com o objetivo de atacar a vice-presidente Kamala Harris em relação a seu histórico de apoio a direitos para pessoas transgênero. Esta estratégia se destaca em um cenário de campanhas publicitárias que ocorrem durante jogos da NFL, transmissões de jogos de futebol universitário e em estados-chave, onde as urnas podem ser decididas. O valor investido é impressionante, considerando que a maioria dos eleitores indica que questões sobre direitos LGBTQ não são as suas principais preocupações nesse ciclo eleitoral. No entanto, a campanha de Trump aposta que eleitores, que ainda estão indecisos entre os dois candidatos, podem ser persuadidos a tomar partido em uma controvérsia cultural que tem causado divisões significativas em legislativos estaduais e conselhos escolares nos últimos anos, promovendo um foco intenso em um grupo que já enfrenta discriminação e violência.
Os anúncios centrais contêm declarações que Kamala Harris fez em sua candidatura à presidência em 2020, quando ela defendeu cuidados de saúde de afirmação de gênero financiados por impostos para imigrantes detidos e prisioneiros federais, conforme já exigido pela lei federal. Em uma das propagandas, a frase “A agenda de Kamala é eles/delas, não você” é utilizada, referindo-se aos pronomes adotados por algumas pessoas transgênero e não-binárias. Nos primeiros quinze dias de outubro, quase 14 milhões de dólares foram investidos especificamente nesse anúncio. Ao ser questionada sobre sua posição atual em uma entrevista à Fox News, Harris mencionou que seguiria a lei, fazendo alusão a um relatório do New York Times que descreve como o Departamento de Prisões forneceu serviços de afirmação de gênero durante a administração de Trump, o que a campanha de Trump refutou.
A Agressividade do Discurso Contra a Comunidade LGBTQ e Suas Consequências Eleitorais
Ainda antes de oficializar sua candidatura para 2024, Trump intensificou seu discurso contra a comunidade LGBTQ, especialmente contra americanos transgêneros, de maneira que evitou antes e durante seu mandato presidencial de 2016 a 2020. Em um evento em julho de 2022, Trump expressou sua oposição à participação de mulheres trans em esportes femininos, elogiando a recepção favorável que recebeu do público. “Disseram para eu não fazer isso. E teve a maior aprovação. É louco”, comentou Trump. Logo no início de sua nova candidatura, prometeu punir hospitais que fornecessem cuidados de afirmação de gênero a menores, um resultado raramente visto em situações que exigem aconselhamento prévio e outros tratamentos prescritos. Assim, sua campanha, em um movimento errôneo, afastou a ideia de que escolas e professores informam as crianças que poderiam estar “presas no corpo errado”, permanecendo focada na narrativa de que as escolas estariam secretamente enviando crianças para cirurgias de afirmação de gênero.
Até agora, a maior parte desse discurso havia sido direcionada a seus apoiadores. Contudo, em outubro, cerca de um terço dos 66 milhões de dólares gastos em anúncios de TV pela campanha de Trump e aliados foram direcionados a anúncios sobre “direitos LGBTQ”. A maioria desses anúncios apresenta trechos de declarações de Harris feitas quatro anos atrás, demonstrando seu apoio a políticas favoráveis aos transgêneros. Esses anúncios superaram quase todo outro tópico abordado pelos republicanos para tentar influenciar a opinião pública durante uma fase crítica da campanha eleitoral, à frente de questões como criminalidade, inflação e imigração, e atrás apenas da tributação.
Um dos anúncios mais impactantes da campanha de Trump até agora em outubro ataca Harris por sua posição em relação a leis que exigem cuidados médicos para prisioneiros, incluindo cuidados de afirmação de gênero, descritos como “insanos”. Outro anúncio semelhante, que já acumulou mais de 2 milhões de dólares em investimentos, ecoa essa linha. “É difícil de acreditar, mas é verdade. Até a mídia liberal ficou chocada ao saber que Kamala apoia mudanças de sexo financiadas por impostos para prisioneiros e imigrantes ilegais”, diz o anúncio. Em resposta a essas propagandas, Harris argumentou que Trump está tentando criar um medo desnecessário nos eleitores, visto que não possui um plano que priorize as necessidades do povo americano.
Desafios para os Democratas em Meio a Estratégias de Desinformação
Nos últimos meses, aliados mais conservadores de Trump têm pressionado o ex-presidente para que ele faça do tema dos direitos LGBTQ um aspecto central de sua campanha, argumentando que especialmente os pais poderiam ser influenciados por sua oposição a tratamentos transgêneros para menores. Eles acreditam que os democratas têm se mostrado cada vez mais inseguros em defender suas políticas progressistas sobre o tema. “A política é uma parte da cultura, não o contrário,” disse Terry Schilling, presidente do American Principles Project. “Se você quer vencer um assunto, as campanhas precisam estar correndo por ele.” Grupos que defendem os direitos de pessoas trans já enfrentaram ataques semelhantes antes, como foi o caso da campanha na Kentucky em 2022, onde o candidato democrata a governador, Andy Beshear, foi atacado por suas políticas referentes a questões trans, mas saiu vitorioso.
De acordo com pesquisas recentes da Gallup, apenas 38% dos eleitores registrados vêem a posição de um candidato sobre “direitos de transgêneros” como “extremamente” ou “muito” importante, colocando essa questão na última posição entre cerca de 20 tópicos. Contudo, a percepção americana sobre questões trans é mista, com algumas pesquisas sugerindo que uma margem crescente de eleitorados se posiciona ao lado de Trump, especialmente em relação a atletas trans competindo em times que correspondem à sua identidade de gênero. Por outro lado, muitos americanos são contrários à intervenção do governo em tais questões. Entre eles, apenas 34% dos independentes favorecem a proibição de certos tratamentos médicos.
Os conselheiros de Trump chegaram a acreditar que o ex-presidente não arriscaria alienar eleitores moderados que apoiam os direitos LGBTQ, caso sua oposição se concentrasse em políticas que afetam crianças. Em relação a esse tema, Chris LaCivita, co-gerente de campanha de Trump, afirmou: “O tema tem definido o Partido Democrata contemporâneo e é uma parte importante de sua plataforma. Contudo, eles escolheram não fazer parte de sua campanha. Nós decidimos fazer isso por eles.” Grupos pró-Trump seguiram a liderança de sua campanha, como o Preserve America, um PAC que recebeu milhões do megadonor Miriam Adelson, que lançou anúncios este mês que conectam questões como inflação e imigração às políticas trans.
Os democratas, por sua vez, não reagiram adequadamente aos ataques. Os dados mostram que não houve investimento em anúncios de TV de democratas que mencionassem direitos LGBTQ nos primeiros quinze dias de outubro. Até agora, apenas o deputado Colin Allred, que tenta derrotar o senador Ted Cruz no Texas, produziu um anúncio defendendo suas posturas, enfatizando que não deseja que meninos joguem em times femininos. Outro senador, Sherrod Brown, se juntou a esse coro com um anúncio que afirma que as decisões sobre esportes devem ser feitas pelas ligas e não pelos políticos.
As controvérsias que Allred e Brown enfrentam refletem a emergência deste tema nas campanhas do Senado, além da corrida presidencial. Ao mesmo tempo, Schilling acredita que o silêncio dos democratas frente ao ataque publicitário de Trump é bastante revelador: “A beleza desse assunto é que os democratas estão entre a cruz e a espada. Se eles fizerem o que Allred está fazendo, perderão sua base. Se dobrou sua posição, perderão eleitores no meio.” Com isso, muitos acreditam que, independentemente das controvérsias geradas, os candidatos democratas continuarão a se concentrar nas preocupações mais relevantes aos cidadãos, evitando assim uma escalada no debate sobre questões de gênero e sexualidade na sociedade atual.