No contexto de uma visita oficial que marca seu retorno à vida pública após um tratamento intenso contra o câncer, o Rei Charles III está em solo australiano para um evento de grande importância histórica e simbólica. O monarca britânico, que se tornou o primeiro a visitar a Austrália em mais de uma década, é recebido de maneira cordial, mas não sem polêmicas. Na segunda-feira, momentos após o início de suas atividades oficiais, a visita rapidamente se transformou em um campo de batalha retórico, onde uma lawmaker australiana lançou acusações contundentes sobre a história colonial britânica e seu impacto devastador sobre a população indígena do país.
A senadora independente Lidia Thorpe, conhecida por sua defesa ardente dos direitos dos povos indígenas, disparou de forma clara e corajosa após o discurso do rei na Casa do Parlamento de Canberra. “Isto não é o seu país”, gritou Thorpe, acusando Charles de cumplicidade em genocídio histórico contra os povos nativos. O contraste entre a pompa e a solenidade do evento e as duras palavras de Thorpe não passaram despercebidos, colocando em evidência uma questão muito mais complexa e sensível: a relação recém-descoberta entre a monarquia britânica e as realidades históricas do colonialismo.
As palavras da senadora foram um chamado apelativo para que o Rei e sua Rainha Camilla reconhecessem o legado conturbado do colonialismo britânico. “Vocês destruíram nossas terras. Devolvam-nos um tratado. Queremos um tratado neste país”, exclamou Thorpe, exortando o reino a devolver não apenas terras, mas também a dignidade e o respeito que há muito vem sendo negados ao povo aborígine. Ao ser escoltada para fora das instalações, suas afirmações ainda ecoavam, ressaltando as tensões existentes entre os representantes do reino e as vozes aborígines.
As críticas à monarquia britânica não terminam com o ato de Thorpe. O Australian Republic Movement, um grupo que defende a substituição da monarquia britânica pelo que eles chamam de um líder australiano, aproveitou a ocasião para ridicularizar a visita do rei. O grupo lançou a campanha “Diga Adeus ao Reinado Real com a Turnê de Despedida da Monarquia!”, traçando uma analogia entre a presença do Rei Charles na Austrália e a última turnê de uma banda famosa em decadência. A campanha manifesta resistência ao status da coroa como uma parte integral da identidade australiano.
Em meio a tudo isso, uma fonte próxima ao rei afirmou que Charles e Camilla estavam “profundamente tocados pela calorosa recepção que receberam desde sua chegada à Austrália”, insinuando que, apesar da controvérsia, o apoio popular ainda é forte. O rei, que reconhece o debate que cerca seu papel, acredita que cabe ao povo australiano discutir e decidir o futuro da monarquia na Austrália. Essa afirmação, embora diplomática, parece pouco convincente para muitos que exigem uma reflexão mais profunda e um apelo à reparação pelo passado colonial.
Antes mesmo do tumulto político no parlamento, Charles teve uma calorosa recepção em Canberra, onde participou de atos tradicionais como de colocar uma coroa no Memorial dos Veteranos Australianos. No entanto, a interação com o público apresentou uma troca inusitada: um encontro com Hephner, um alpaca que usava uma coroa, que indiscutivelmente forneceu um momento de leveza em uma agenda em meio a tensões. Em um dia marcado por protestos e reivindicações, a cena do rei acariciando um alpaca, que fez questão de espirrar nele, proporcionou um breve alívio cômico, sublinhando a curiosidade e o caráter peculiar de eventos reais.
Concluindo, a visita de Charles III à Austrália se destaca não apenas como uma simples formalidade diplomática, mas como um campo de discussão acalorada sobre colonialismo, direitos indígenas e identidade nacional. As vozes que se levantaram contra a injustiça inerente ao colonialismo não devem ser ignoradas, e o debate sobre o futuro da monarquia na Austrália continua a ganhar força, refletindo as complexidades da história e os anseios contemporâneos por uma verdadeira reconciliação com o passado. O que se espera agora é um diálogo significativo que possa pavimentar o caminho para um futuro mais inclusivo e respeitoso entre a coroa e o povo australiano.