A tão aguardada sequência do épico Gladiador chega às telonas, trazendo uma mistura intrigante de fatos históricos e elementos de pura fantasia. Embora o filme e sua continuação sejam inspirados em eventos reais e nas práticas culturais do Império Romano, a imaginação dos cineastas vai longe demais ao trazer criaturas exóticas, como tubarões e rinocerontes, para o Coliseu. A diretora Ridley Scott, aos 86 anos, junto com os roteiristas David Scarpa e Peter Craig, apresenta aventuras que parecem mais saídas de um episódio de ficção científica do que da história antiga, levando os espectadores a questionarem até onde a realidade se confunde com a fantasia.

De acordo com Shadi Bartsch, especialista em cultura romana e professora destacada da Universidade de Chicago, a forma como elementos como o rinoceronte foram exibidos no filme provoca risos e espanto. “Claro, Hollywood quer que tudo seja maior e mais audacioso, e agora eles conseguem isso graças à tecnologia digital,” observa Bartsch sobre uma cena impactante do trailer, onde um rinoceronte avança em tamanho colossal. “Eu não sabia se ria ou se gritava”, acrescenta, refletindo a reação dos espectadores que aguardam ansiosamente por esse espetáculo.

Entretanto, existem aspectos do Gladiador II que, surpreendentemente, têm raízes históricas. Os romanos, de fato, introduziam uma variedade de animais exóticos em seus eventos de entretenimento, não apenas para assistir à morte dos mesmos, mas também como símbolo da grandeza e do domínio do Império Romano. Bartsch explica que animais oriundos da Ásia e da África não apenas serviam para a diversão do povo, mas representavam o imenso poderio do império. “Eles potencializavam a imagem de domínio total sobre a natureza”, completa. Entre essas feras, estavam ursos, tigres, leões, elefantes e avestruzes, com uma preferência por aqueles que eram mais exóticos.

Surpreendentemente, até mesmo os rinocerontes deram o ar da graça, embora Bartsch esclareça que ser tratava da variedade asiática e não da africana que aparece nas telas atualmente. “Os romanos não montavam rinocerontes”, enfatiza, contestando a veracidade de algumas cenas do filme. Além disso, a representação de nobres se deliciando com a carne do rinoceronte em uma festa está longe da realidade, uma vez que a evidência histórica sugere que, tipicamente, os animais eram desmembrados e dados aos espectadores para serem consumidos em casa. Caso contrário, não existia a prática de presentear um nobre com uma carne tão exótica para ser saboreada em uma refeição.

A narrativa histórica também menciona o imperador Commodus, que foi retratado no Gladiador de 2000 por Joaquin Phoenix, comprometido em lutar com um rinoceronte a uma distância segura. Isso foi uma tentativa de mostrar seu poder, com a plateia encantada pela exibição — uma comparação interessante seria imaginar se um personagem contemporâneo, como Donald Trump, estivesse em uma arena lutando contra um leão, atraindo uma multidão igualmente doida.

No que diz respeito aos babuínos carecas que foram introduzidos em uma cena da arena em Gladiador II, Bartsch confirma que esses animais são puramente fictícios. Realmente, não há nenhum relato da participação de babuínos nas lutas gladiatórias, sendo que, de forma geral, os primatas eram bastante raros em Roma. Já Caracalla, co-imperador no filme interpretado por Fred Hechinger, tinha um “leão favorito” na vida real, uma mudança que dá espaço para a criatividade dos roteiristas, que escolheram exibir um macaco em vez disso.

Outro elemento fascinante do filme é a representação de batalhas navais no Coliseu, onde o personagem de Paul Mescal enfrenta adversários em barcos em uma arena inundada. Bartsch valida essa representação, afirmando que esses combates eram comuns como uma forma de entretenimento, embora em versões em miniatura dos barcos reais. Apesar da dramatização, a popularidade de tais eventos na Roma antiga era inegável, refletindo o espírito de competições reais.

Entretanto, o aspecto mais criativo, mas questionável, de Gladiador II é a presença das águas infestadas de tubarões durante essas batalhas. Bartsch é categórica ao afirmar que tubarões nunca foram trazidos para a arena. Além dos desafios logísticos de transportar tubarões vivos — que precisariam de água para a sobrevivência — ela explica que, embora existam espécies de tubarões no mar Mediterrâneo, nem todos os tubarões têm o hábito de atacar seres humanos e, na verdade, muitos eram pequenos e não representavam risco. A compreensão dos romanos sobre tubarões não era tão diferenciada; eles enxergavam os tubarões como apenas mais um tipo de peixe.

Com Gladiador II já em exibição nos cinemas, o público está ansioso para ver até que ponto a realidade romana e a inventividade do cinema se entrelaçam. O filme promete emoções e surpresas, mas, acima de tudo, nos convida a refletir sobre os limites da história e da ficção, criando uma experiência cinematográfica que, sem dúvida, vai despertar a curiosidade dos espectadores, levando todos a se questionar sobre o que é fato e o que é lenda nesta emocionante narrativa da antiga Roma.

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