Uma análise cuidadosa dos resultados das eleições de 2024 revela um fenômeno intrigante: Donald Trump, apesar de seu estilo polêmico e de um histórico de controvérsias, conseguiu manter-se competitivo entre as eleitoras, contrariando expectativas e descontentamentos. Esse fato chamou a atenção de especialistas e analistas políticos, que se questionam sobre as motivações que levaram muitas mulheres a votar no ex-presidente, mesmo diante de incertezas sobre sua agenda e impacto no futuro de seus direitos e da democracia americana.
Embora a vice-presidente Kamala Harris tenha vencido a maioria das eleitoras, seu avanço foi limitado a 8 pontos porcentuais sobre Trump, um desempenho que representa menos da metade da vantagem de 15 pontos conquistada por Joe Biden em 2020, conforme indicaram as pesquisas de saída realizadas pela Edison Research. É importante notar que, mesmo com as adversidades, Trump conseguiu angariar apoio surpreendente entre as mulheres, criando um cenário onde os fatores econômicos parecem ter um peso maior que as preocupações com direitos sociais e democracia, segundo revelaram as mesmas pesquisas e o AP VoteCast.
Essa ambivalência das mulheres em relação ao ex-presidente é fascinante. Muitos especialistas acreditam que, apesar de inquietações em relação ao comportamento e à retórica de Trump, as mulheres priorizaram suas preocupações imediatas e tangíveis, como a inflação e a segurança, ao tomarem suas decisões de voto. Em um cenário onde as questões econômicas pesam fortemente, as inseguranças relacionadas aos direitos de aborto, saúde e democracia passaram não apenas a ser relegadas a segundo plano, mas enfrentaram um contexto competitivo onde outros fatores se mostraram mais urgentes e palpáveis.
Jenifer Fernandez Ancona, estrategista de um grupo progressista, ressalta que aquelas mulheres mais preocupadas com a saúde, direitos e democracia se posicionaram amplamente a favor de Harris, mas a realidade da eleição mostrou que preocupações mais práticas e imediatas, ligadas à economia, conseguiram prevalecer. Isso torna evidente que a recuperação do partido Democrata, na expectativa que possuem a curto prazo, deveria iniciar com esse eleitorado que se manteve hesitante, mas assegurou a vitória de Trump, mesmo com ressalvas em relação a suas posturas.
Historicamente, Trump enfrentou resistência entre as mulheres durante seu primeiro mandato, conforme as pesquisas Gallup revelam uma média de aprovação de apenas 35% entre o público feminino. Entretanto, esse panorama se alterou em 2024, principalmente devido ao descontentamento com as políticas de Biden, que muitos eleitoras não consideraram satisfatórias. A dinâmica que se seguiu ao longo desses anos mostra como a narrativa econômica, que antes era desaprovada sob a liderança de Trump, passou a ser vista sob uma nova perspectiva, influenciada pela percepção negativa sobre o governo atual.
Ademais, Trump, a partir de suas escolhas de gabinete, que incluiu figuras controversas, reacendeu preocupações sobre como suas futuras políticas poderiam afetar positivamente ou negativamente o apoio das eleitoras. Por outro lado, a natureza de suas ações desde a vitória sugere que seu novo mandado pode estar repleto de mais conflito e tensões com a população feminina, um grupo que se distanciou consideravelmente em seus primeiros quatro anos de governo.
Ao observar os vaticínios sobre 2024, fica claro que as eleição deste ano disponibilizaram surpresas não apenas nos ganhos de Trump entre os homens, mas na maneira que conseguiu restringir suas perdas entre as mulheres. As expectativas para Harris não se concretizaram, e seu desempenho entre eleitoras foi o mais modesto entre todos os candidatos democratas da atual era, excetuando 2004. Apesar da franca vantagem entre as mulheres negras, seu desempenho entre outros grupos de mulheres foi aquém do esperado por muitos analistas.
Até mesmo entre eleitoras brancas, a margem de apoio de Harris foi mais fraca do que a esperada, fator que diminuiu suas chances em um momento decisivo da eleição. Particularmente notável foi a porcentagem de mulheres que, mesmo se identificando como pró-escolha em matéria de aborto, decidiram votar em Trump, delineando um cenário complexo sobre prioridades eleitorais que se sobrepuseram às questões sociais que geralmente galvanizam as mulheres em torno dos candidatos democratas.
Os dados das pesquisas também revelaram frustrações significativas dos democratas entre grupos como mulheres latinas, com uma redução do apoio previsto em comparação com 2020. O impacto de questões relacionadas à economia e ao bem-estar social foi palpável, uma vez que a deterioração econômica e as promessas não cumpridas formaram um pano de fundo desolador que muitos eleitoras optaram por ignorar, na esperança de que um retorno de Trump os beneficiasse de alguma forma.
Trata-se de um período altamente dinâmico e de incerteza para o futuro político dos Estados Unidos, onde áreas como política imigratória e saúde pública, que tradicionalmente poderiam alienar mulheres, ganham uma nova dimensão. A mudança de prioridades por parte do eleitorado feminino coloca em evidência a possibilidade de Trump não apenas manter, mas possivelmente expandir seu apoio feminino caso entregue resultados na área econômica. Por tanto, a questão central permanece em saber como a ambivalência das mulheres entre seus direitos e preocupações sobre o custo de vida será influenciada ao longo do novo mandato. Enquanto isso, as lições desta eleição podem manter um impacto duradouro na maneira como os partidos se aproximam do eleitorado feminino nas futuras contendas eleitorais.