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No final de uma noite quente de verão em 2023, Kei Jokura, um biólogo marinho, adentrou o laboratório do Woods Hole Oceanographic Institution, em Massachusetts, empolgado, trazendo um recipiente com um exemplar peculiar em seu interior. Este espécime era uma medusa comb, um tipo de organismo gelatinoso, e o que chamava a atenção era o fato de que parecia ser um híbrido, resultado da fusão de dois indivíduos. “Eu não podia acreditar no que via a princípio”, recordou Jokura, que na época era pesquisador de pós-doutorado na Universidade de Exeter, no Reino Unido.
O espécime impressionou não apenas Jokura, mas também Mariana Rodriguez-Santiago, sua colega de laboratório na Colorado State University, que estava envolvida em sua própria pesquisa. “Todos nós ficamos surpresos e intrigados, pensando, ‘Como eles podem se fundir e ainda assim nadar e se mover como uma unidade?'”, comentou Rodriguez-Santiago. Para esclarecer suas dúvidas, ela e Jokura realizaram experimentos, combinando pares de medusas comb, conhecidas cientificamente como Mnemiopsis leidyi, para observar o que ocorreria.
Os resultados, publicados em 7 de outubro na revista Current Biology, mostraram que não apenas os corpos dos dois organismos podiam se fundir, mas também seus sistemas nervosos e digestivos. O estudo revelou que duas medusas, em efeito prático, tornavam-se uma só. “O fenômeno de fusão levantou perguntas instigantes, como quais genes estão envolvidos nesse processo, o que acontece na sinalização neural, e o que define ‘eu’ e ‘não-eu'”, disse Jokura.
Os ctenóforos, que incluem as medusas comb, são conhecidos por serem alguns dos animais mais antigos da Terra, possivelmente um “irmão” de todas as outras formas de vida no nosso planeta, fornecendo uma oportunidade única para estudar aspectos fundamentais do funcionamento do sistema nervoso, afirmaram os pesquisadores. Eles se distinguem das águas-vivas não apenas por não possuírem veneno, mas também por pertencem a um filo diferente: Ctenophora, que significa “portadores de pentes”, uma referência aos apêndices semelhantes a pelagens que utilizam para se locomover.
Implications of jewel’s fusion study
Os achados vão além do meramente curioso; eles sugerem que os ctenóforos podem carecer do mecanismo de alorecognition, que no caso dos humanos auxilia na rejeição de órgãos transplantados, o que permitiria que indivíduos de espécies diferentes se fundissem sem risco. Jokura estava originalmente estudando a resposta de M. leidyi à luz quando se deparou pela primeira vez com dois espécimes feridos que haviam se unido. Ao replicar essa condição, eles cortaram partes de diversas medusas e colocaram as seções juntas em placas de Petri, observando que 90% dos pares se fundiram com sucesso, resultando em organismos com dois órgãos sensoriais e dois conjuntos de aberturas anais, ao contrário das medusas típicas, que têm apenas um de cada.
O processo de fusão foi mais rápido do que esperado. Em menos de duas horas, os movimentos musculares, que inicialmente eram independentes, começaram a sincronizar-se. Com um toque, ambos os lados do organismo fundido contraíam simultaneamente, revelando um nível de conexão que desafia a noção de individualidade nos seres vivos. Além disso, os pesquisadores notaram que os sistemas digestivos também se interligaram. Quando um camarão fluorescente foi alimentado a uma das medusas fundidas, os pesquisadores observaram que a digestão ocorria de forma compartilhada, com o material atravessando a linha de fusão e sendo expelido por ambos os ânus do organismo combinado.
Futuras direções na pesquisa com medusas
Rodriguez-Santiago expressou seu entusiasmo pelo fato de que a pesquisa questiona as fronteiras que anteriormente pensava serem rígidas entre “eu” e “outro”. Os ctenóforos, além de serem fascinantes por suas capacidades biológicas, podem fornecer chaves para a compreensão da evolução da alorecognition em organismos mais complexos e o desenvolvimento de sistemas nervosos. Os pesquisadores agora buscam entender como as redes neurais das medusas se integram após a fusão, explorando a possibilidade de algo semelhante à fusão da consciência. “Ninguém nunca realmente examinou como esses sistemas neuronais podem se entrelaçar”, ponderou Jokura, teçando um novo e empolgante caminho para futuras investigações nesta enigmática e antiga linhagem animal.
Amanda Schupak é uma jornalista de ciência e saúde na cidade de Nova Iorque.