Na última segunda-feira, um influente painel governamental dos Estados Unidos não conseguiu chegar a um consenso sobre os potenciais riscos à segurança nacional ligados à proposta de aquisição da U.S. Steel pela empresa japonesa Nippon Steel, no valor aproximado de $15 bilhões. Com isso, a responsabilidade da decisão final sobre essa importante transação ficará nas mãos do presidente Joe Biden, que já se manifestou anteriormente contra o negócio. Ao longo do processo, a questão gerou uma ampla discussão sobre a segurança econômica do país e as implicações de permitir que uma empresa estrangeira assuma o controle de uma fabricante de aço americana, especialmente em um período de crescente competição global.
O painel em questão, conhecido como Comitê de Investimentos Estrangeiros nos Estados Unidos (CFIUS), enviou seu relatório sobre a fusão para Biden, que agora tem um prazo de 15 dias para formular sua decisão. Apesar do relatório apontar para a falta de consenso, alguns membros das agências federais representadas no painel expressaram dúvidas sobre a hipótese de que a venda de uma companhia americana para uma empresa japonesa prejudicaria a segurança nacional.
A questão em pauta não é apenas sobre a segurança nacional, mas também envolve a dinâmica econômica do setor de aço dos Estados Unidos. Tanto Biden quanto o ex-presidente Donald Trump tentaram conquistar os trabalhadores sindicalizados da U.S. Steel, prometendo barrar a aquisição devido a preocupações com a propriedade estrangeira de uma empresa emblemática americana. No entanto, analistas ressaltam que a Nippon Steel possui os recursos financeiros necessários para investir nas usinas e modernizá-las, o que poderia, por sua vez, ajudar a preservar a produção de aço dentro dos Estados Unidos e proteger empregos.
O CFIUS tem o dever de revisar tais negócios levando em conta os riscos potenciais à segurança nacional. A segunda-feira era o prazo final para que o comitê aprovasse a transação, recomendasse que Biden a bloqueasse ou sugerisse uma extensão do período de análise. O Washington Post destacou anteriormente a submissão do relatório do comitê.
Os termos do acordo, que representa uma transação totalmente em dinheiro de aproximadamente $14,9 bilhões, estipulam que a U.S. Steel manterá seu nome e sede em Pittsburgh, onde foi fundada em 1901 por J.P. Morgan e Andrew Carnegie. Com a fusão, a nova empresa se tornaria uma das três maiores produtoras de aço do mundo, conforme os dados de 2023 da World Steel Association. Contudo, Biden, apoiado pela United Steelworkers, reiterou que é “vital que a U.S. Steel permaneça uma empresa americana, de propriedade e gestão doméstica.”
A oposição a esse negócio é significativa e se reflete também em Trump, que, através da sua plataforma Truth Social, se comprometeu a “bloquear este acordo”. O ex-presidente sugeriu reviver a U.S. Steel por meio de uma série de incentivos fiscais e tarifas. O sindicato dos trabalhadores do aço anunciou que não acredita que a Nippon Steel manteria os empregos nas fábricas sindicalizadas, comprometeria os benefícios negociados coletivamente ou protegeria a produção de aço americana de importações estrangeiras a preços baixos.
“Nosso sindicato vem chamando por uma rigorosa supervisão governamental da venda desde que foi anunciada. Agora é a vez do presidente Biden determinar o melhor caminho a seguir”, declarou David McCall, presidente dos trabalhadores do aço, em um comunicado. “Continuamos acreditando que isso significa manter a U.S. Steel de propriedade e operação nacionais.”
Diante da oposição política, a Nippon Steel e a U.S. Steel conduziram uma campanha de relações públicas para conquistar a confiança dos céticos. A U.S. Steel afirmou em um comunicado que o acordo “é a melhor maneira, de longe, para garantir que a U.S. Steel, seus funcionários, comunidades e clientes prosperem no futuro”.
Com o aumento do apoio de conservadores, a Nippon Steel começou a conquistar alguns membros do sindicato dos trabalhadores do aço e autoridades locais em suas usinas na Pensilvânia e Indiana, que perceberam que a empresa japonesa tem um balanço financeiro mais robusto do que seu rival Cleveland-Cliffs e estaria em posição de investir os recursos necessários para atualizar as obsoletas instalações da U.S. Steel. A Nippon Steel prometeu investir $2,7 bilhões em instalações representadas pelos trabalhadores do aço, incluindo as usinas de altifurnos, garantindo ainda que não importaria placas de aço que competissem com estas usinas.
Esse apoio à venda emergiu em um contexto de renovado respaldo político para a reconstrução do setor manufatureiro americano, em uma campanha presidencial na qual a Pensilvânia é um campo de batalha crucial, além de uma longa sequência de tarifas protecionistas dos Estados Unidos que, segundo analistas, ajudaram a reenergizar a produção de aço doméstica.
Presidido pela secretária do Tesouro, Janet Yellen, o CFIUS é responsável por examinar as transações comerciais entre empresas americanas e investidores estrangeiros e tem a capacidade de bloquear vendas ou forçar as partes a modificar os termos de um acordo para proteger a segurança nacional. Os poderes do comitê foram amplamente ampliados em 2018, por meio de uma lei chamada Foreign Investment Risk Review Modernization Act (FIRRMA). Em setembro, Biden emitiu uma ordem executiva que amplia os fatores que o comitê deve considerar ao revisar os negócios, como o impacto na cadeia de suprimentos dos EUA ou o risco de dados pessoais sensíveis dos americanos.
A Nippon Steel já possui operações de fabricação nos Estados Unidos, México, China e Sudeste Asiático, e fornece grandes montadoras, incluindo a Toyota, além de produzir aço para ferrovias, tubulações, eletrodomésticos e arranha-céus.
A decisão do presidente Biden será um divisor de águas, não apenas para o futuro da U.S. Steel, mas também para a indústria do aço como um todo. O enredo se desenrola em um contexto onde os interesses de segurança nacional, emprego local e a competitividade global estão em constante conflito, e a pressão sobre Biden aumentará à medida que a data limite para sua decisão se aproxima.