No último dia 10 de dezembro, a General Motors (GM) anunciou uma mudança significativa em sua estratégia de desenvolvimento de tecnologia autônoma. A montadora decidiu interromper o financiamento da empresa de robotáxi Cruise e integrar suas operações com as iniciativas internas da GM voltadas para a assistência ao motorista e, eventualmente, para veículos autônomos pessoais totalmente independentes. Esta decisão demonstra uma reavaliação do foco da GM após anos de investimento pesado e uma série de eventos desafiadores que marcaram a trajetória da Cruise.
A aquisição da Cruise, em março de 2016, por 1 bilhão de dólares, foi vista como uma jogada visionária da GM para liderar o mercado de veículos autônomos. Desde então, a montadora investiu mais de 10 bilhões de dólares em tecnologia autônoma, na expectativa de comercializar essa inovação através de um serviço de robotáxi. No entanto, a GM emitiu uma declaração que destaca a necessidade de direcionar “recursos consideráveis de tempo e dinheiro” para escalar esse tipo de negócio, além da “crescente competitividade” no mercado de robotáxis. Essa mudança de direção será, conforme a companhia, responsável por uma redução de mais de 1 bilhão de dólares em gastos anuais, uma vez que o planejamento proposto for implementado na primeira metade de 2025.
A centralidade da eficiência e a adoção de uma abordagem incremental em relação à autonomia são os pilares que sustentam essa nova estratégia. Dave Richardson, vice-presidente sênior de engenharia de software e serviços da GM, será um dos principais responsáveis pela execução dessa mudança de abordagem. Segundo ele, o foco agora é “introduzir a tecnologia de veículos autônomos em milhões de veículos da GM”. Para isso, a companhia seguirá aprimorando seu sistema de assistência ao motorista, o Super Cruise, com o desenvolvimento contínuo de tecnologias que permitam a operação em um modo que permite ao motorista não ter as mãos ou os olhos no volante, algo que Richardson já havia insinuado em uma entrevista à TechCrunch no início deste ano.
Em termos técnicos, esses sistemas que dispensam as mãos e os olhos – conhecidos na indústria como Nível 3 – não são, de fato, veículos autônomos como aqueles em que a Cruise estava trabalhando ou os que a Waymo opera, classificados como Nível 4. Em geral, os sistemas Nível 3 operam apenas em autoestradas a velocidades reduzidas e continuam exigindo a pronta intervenção do motorista, em contraste com os serviços de robotáxi anteriormente almejados pela Cruise.
Atualmente, a GM detém cerca de 90% das ações da Cruise e planeja adquirir ações de acionistas minoritários para elevar sua participação para mais de 97%. No passado, a montadora buscou captar financiamento de investidores externos como Microsoft, Walmart e Softbank, mas a reavaliação da totalidade do desenvolvimento de robotáxis parece ser uma mostra de que o timing e o investimento em capital para tal avanço estão se tornando cada vez mais desafiadores. Somente em 2022, a GM aumentou sua participação na Cruise ao adquirir os ativos do SoftBank Vision Fund por 2,1 bilhões de dólares, além de realizar um investimento adicional de 1,35 bilhões de dólares na empresa, substituindo um compromisso anterior feito pelo fundo em 2018.
A CEO da GM, Mary Barra, foi clara sobre os motivos por trás dessa mudança de estratégia. Durante uma chamada com a imprensa e analistas, ela expressou a crença da empresa na importância da assistência ao motorista e da tecnologia de direção autônoma em seus veículos. Barra afirmou que essa direção possibilitará à GM e à Cruise aproveitar suas forças, simplificando e acelerando o caminho a seguir e proporcionando benefícios significativos aos clientes ao longo do processo.
No entanto, esta reviravolta vem em um momento delicado. Apenas um ano antes, a Cruise enfrentou uma série de escândalos que culminaram em um incidente trágico, onde um pedestre foi atropelado e arrastado por um dos seus robotáxis. O que se seguiu foram investigações rigorosas, multas, demissões de aproximadamente 24% da equipe e a revogação da licença de operação comercial pela reguladora da Califórnia. Após a saída do co-fundador e CEO da Cruise, Kyle Vogt, a GM trouxe novos executivos externos para ajudar a reestruturar a companhia e reconquistar a confiança do público. Em junho, a montadora nomeou Marc Whitten, um veterano da indústria de videogames e engenheiro fundador do Xbox, para assumir como CEO da Cruise, na esperança de iniciar um novo capítulo.
O próprio Vogt não hesitou em criticar a decisão da GM, desferindo um ataque na plataforma X, afirmando que “caso não estivesse claro antes, agora é evidente: a GM é um bando de tolos.” Em outra reviravolta, em novembro, a Cruise admitiu ter apresentado um relatório falso na tentativa de influenciar uma investigação federal sobre um incidente de segurança no ano anterior, resultando em uma multa criminal de 500 mil dólares conforme acordo de não persecução oferecido pelo Departamento de Justiça.
Em conclusão, o movimento da GM para abandonar o desenvolvimento de negócios de robotáxis representa não apenas um desvio significativo na sua estratégia, mas também um reflexo das dificuldades enfrentadas na indústria de veículos autônomos. À medida que a empresa se concentra em soluções autônomas que podem ser integradas nas linhas de produção existente, fica a pergunta: será que essa mudança levará a GM a um futuro mais promissor em um campo tão desafiador e competitivo?