Embora o desejo feminino não seja uma novidade e certamente não se trate de uma tendência passageira, o ano de 2024 foi marcante ao elevar a libido feminina ao centro da cultura popular. Essa mudança não é simplesmente superficial; trata-se de uma revolução que vem se desenrolando ao longo de anos e que finalmente encontrou seu espaço no mainstream.

O fecho cultural deste ano promete ser emblemático, especialmente com o lançamento de “Babygirl”, um filme que estreia no dia de Natal no Reino Unido e em 10 de janeiro nos Estados Unidos. Estrelado pela talentosa Nicole Kidman, o filme apresenta uma narrativa intrigante na qual uma mulher de negócios de sucesso se torna sexualmente submissa a um de seus estagiários. Em uma conferência de imprensa durante o Festival de Cinema de Veneza, Kidman afirmou: “É contado por uma mulher, através de seu olhar — isso é, para mim, o que o torna tão único e libertador.”

Dirigido pela cineasta holandesa Halina Reijn, “Babygirl” também se propõe a abordar “o enorme fosso do orgasmo” que existe entre homens e mulheres. Esse é apenas um exemplo de como, nos últimos doze meses, o desejo feminino emergiu das margens para se tornar um tema predominante e explícito em diversas plataformas, incluindo filme, televisão, música e literatura, tudo sem vergonha, sigilo ou eufemismo.

A Sonoridade do Desejo: A Música Feminina em Alta

No universo musical, uma artista que viu sua popularidade crescer exponencialmente foi Chappell Roan. Enquanto em janeiro ela contabilizava cerca de 1 milhão de ouvintes mensais no Spotify, atualmente esse número ultrapassa os 43 milhões. Parte significativa do sucesso de Roan pode ser atribuída à sua representação autêntica de relacionamentos queer e letras que discutem abertamente a sexualidade, como em sua música que faz alusão a estilos populares de vibradores.

Outro exemplo marcante é Sabrina Carpenter, que não hesitou em expressar sua sexualidade nas redes sociais. Ao lançar seu álbum “Short n’ Sweet” em agosto, a artista legendou a postagem com “quatro dias de ovulação”, alinhando-se à temática hipersexual de suas letras, que incluem expressões diretas de desejo. O álbum atingiu o topo da parada da Billboard 200 com grande facilidade.

O verão de 2024 também foi embalado pela canção “Nasty” da cantora Tinashe, que pede repetidamente que alguém “acompanhe sua ousadia”. Em setembro, a artista FKA Twigs lançou “Eusexua”, um single que marca seu próximo álbum e que, durante uma entrevista, a artista explicou como a palavra foi criada para descrever a sensação de euforia que transcende o ser humano.

Além disso, o aplicativo de erotismo em áudio Quinn viu um crescimento imenso em sua receita, que aumentou 440% nos últimos dois anos, impulsionado pela participação de celebridades que narram suas histórias. Caroline Spiegel, a CEO do Quinn, observou que a mudança é evidente e que o desejo feminino agora é explicitamente discutido em todo o mundo, não sendo mais uma questão relegada ao oculto.

Televisão e Cinema: A Evolução do Olhar Feminino

No mundo da televisão, várias produções também colocaram o prazer feminino em primeiro plano. A adaptação da obra de Lisa Taddeo, “Three Women”, no Starz, desvendou a realidade complexa das diversas vidas sexuais de suas protagonistas. No Disney+, a adaptação de “Rivals”, de Jilly Cooper, trouxe à tona os desejos femininos em meio à estética ousada dos anos 80.

Outra série que chocou a audiência foi “Bridgerton”, cuja terceira temporada fez história com uma cena de quase seis minutos entre Penelope Featherington e Colin Bridgerton. A cena não só explorou o prazer da mulher, mas também promoveu a importância do consentimento de forma inovadora.

Literatura: Mulheres Escrevendo Seus Desejos

No domínio literário, o livro “All Fours” de Miranda July se destaca como um relato sobre o desejo durante a perimenopausa, abordando a realidade da vida após os 40 anos. O romance se tornou rapidamente um best-seller do New York Times, oferecendo uma perspectiva frequentemente negligenciada nas discussões sobre sexualidade.

Gillian Anderson, conhecida por seu trabalho em “Os Arquivos X”, editou “Want”, uma coletânea de fantasia sexual de mulheres, destacando desejos que frequentemente não são expressos em voz alta. A obra, que compilou 174 entradas anônimas de fantasias, pode ser um catalisador para uma nova conversa sobre poder sexual.

A Ciência do Prazer Feminino

Conforme a discussão sobre o prazer feminino avança, especialistas como o Dr. Justin Lehmiller, do Instituto Kinsey, observam que o escopo e a aceitação da sexualidade feminina estão mais evidentes do que nunca. A crescente demanda por produtos sexuais voltados para mulheres mostra que o prazer feminino tornou-se um tópico amplamente reconhecido e discutido.

Assim, enquanto o mundo observa e participa dessa transformação cultural, a consolidação do desejo feminino em diversas esferas aponta para um futuro em que o prazer será livremente explorado e celebrado, independentemente das normas sociais que historicamente o restringiram.

Se 2024 ensinou algo, é que o desejo feminino está aqui para ficar e que agora, mais do que nunca, ele deve ser ouvido, respeitado e celebrado.

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