Nos últimos meses, as startups especializadas em representantes de vendas automatizados com inteligência artificial (IA) têm ganhado destaque no mercado. Entretanto, ao conversar com capitalistas de risco, é possível perceber uma narrativa cautelosa acerca desse fenômeno promissor. Embora diversas empresas estejam explorando soluções de IA, a integração efetiva dessas tecnologias nos processos de negócios tradicionais ainda é um desafio a ser superado. A crescente popularidade das chamadas AI Sales Development Representatives (AI SDRs), que utilizam modelos de linguagem avançados e tecnologias de voz para impulsionar vendas, oferece um vislumbre dos potenciais benefícios, mas também levanta questões sobre a sustentabilidade desse crescimento.
De acordo com Shardul Shah, parceiro da Index Ventures, em determinados mercados tem-se observado um surto de crescimento para essas startups. “Estamos vendo cinco a dez empresas todas tendo sucesso em um período bastante curto”, afirmou. Essa rápida ascensão não é comum dentro do cenário das startups, onde a competição é feroz e as incertezas são numerosas. Entretanto, no caso das startups que automatizam a criação de conteúdos para equipes de vendas, esse fenômeno parece ter encontrado uma aceitação significativa.
O crescimento das AI SDRs é um dos poucos casos em que a maioria dos participantes do mercado está se beneficiando simultaneamente. Shah ressalta que “quando se estuda individualmente qualquer uma dessas startups, é impressionante o que se vê em termos de adaptação ao mercado”. Contudo, o que ocorre quando várias delas desfrutam de um ajuste notável semelhante? Esse cenário intrigante gera dúvidas sobre a longevidade e a evolução dessas soluções inovadoras. Até o momento, a Index Ventures optou por não investir em nenhuma dessas empresas, que em grande parte têm menos de um ano de operação. Isso se deve ao fato de que, apesar de seus crescentes índices de aceitação por parte dos consumidores, permanece a incerteza sobre a capacidade desses serviços de manter um crescimento sustentável ao longo do tempo.
Arjun Pillai, fundador da Docket, startup que desenvolve engenheiros de vendas baseados em IA, reforça que a adoção das AI SDRs é particularmente alta entre pequenas e médias empresas. Essas organizações podem experimentar facilmente as ferramentas oferecidas pelas startups, especialmente em um cenário onde as taxas de resposta para e-mails frios despencaram em mais de 50% nos últimos dois anos. A afirmação de Pillai ilustra um fenômeno cada vez mais comum no ambiente de vendas, onde empresas ágeis e inovadoras estão buscando alternativas que possam melhorar seus resultados.
No universo dessas startups, destacam-se nomes como Regie.ai, AiSDR, Artisan e 11x.ai, enquanto incumbentes como ZoomInfo também estão investindo em tecnologias que rivalizam com essas novas soluções. Embora algumas delas estejam experimentando um crescimento considerável de receita, a efetividade real dessas ferramentas em ajudar empresas a vender mais eficientemente ainda continua uma incógnita.
Tomasz Tunguz, fundador da Theory Ventures, compartilha informações de uma reunião que teve com um diretor de receita de uma empresa pública. Segundo ele, mesmo quando uma AI SDR ajudou a gerar um volume substancial de leads ao longo de um período de nove meses, isso não se traduziu em vendas reais. “Não se trata de dizer que a IA não vai funcionar, mas que muitos de nós ainda não sabemos como utilizá-la de forma eficaz”, comentou Tunguz em um evento do setor.
Ainda existe a preocupação de que as startups de AI SDR sejam eventualmente superadas por empresas já consolidadas, como Salesforce, HubSpot e ZoomInfo, que possuem acesso a dados diferenciados de seus clientes. Chris Farmer, parceiro e CEO da SignalFire, destaca que a aplicação da IA em vendas e marketing pode representar uma grande oportunidade, mas ressalta que, sem o acesso correto a dados, essas startups correm o risco de se tornarem obsoletas. “Se essas empresas oferecerem bots que permitam aos clientes acessar seus próprios dados, esses bots poderão se mostrar mais eficazes”, alerta Farmer.
Como exemplo de um alerta sobre a sustentabilidade dos modelos de negócios baseados em IA, a Jasper, uma startup de redação que estava avaliada em 1,5 bilhões de dólares, enfrentou desafios significativos após a introdução do ChatGPT, levando a cortes de 30% de sua equipe. Tal situação tem servido como um lembrete para investidores acerca da volatilidade do setor e da necessidade de cautela ao considerar investimentos em novas tecnologias.
Atualmente, os investidores não se surpreendem com a rápida adoção das AI SDRs, mas questionam a durabilidade dessa adesão. A dúvida permeia o mercado e lança uma sombra sobre o futuro promissor que esses empreendimentos parecem ter, mostrando que, mesmo em tempos de inovação acelerada, as respostas definitivas para os desafios enfrentados ainda estão em aberto.
Acompanhar o desenvolvimento dessas startups e suas interações com as concorrentes estabelecidas pode oferecer uma visão mais clara sobre o caminho a ser seguido. Afinal, enquanto o cenário de vendas continua a evoluir, a tensão entre inovação e eficácia será um tema constante a ser observado.
Este artigo foi atualizado para incluir as opiniões de Tomasz Tunguz e comentar sobre as tendências emergentes neste setor, destacando o que o futuro pode reservar para as startups de AI SDR e seus desafios no competitivo ambiente de negócios atual.