Nova Iorque
CNN
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Recentemente, duas gigantes automotivas japonesas, Honda e Nissan, confirmaram a intenção de unir forças por meio de uma fusão que promete criar a terceira maior montadora do mundo. O que parecia um boato agora se torna realidade, à medida que as duas empresas buscam se adaptar às exigências de um mercado em constante transformação. A expectativa é que os detalhes finais do acordo sejam anunciados nos próximos seis meses, mas as implicações dessa união já ecoam por toda a indústria automobilística.
Historicamente, a indústria automotiva sempre foi marcada por fusões e aquisições. Desde a formação da General Motors (GM) na primeira década do século XX, esses movimentos são uma parte intrínseca do setor. Porém, especialistas acreditam que a fusão Honda-Nissan pode servir como um catalisador para uma série de combinações que remodelarão o cenário automotivo global. Segundo Jeff Schuster, vice-presidente de pesquisa automotiva da GlobalData, “O ambiente está propício para fusões adicionais. Não acredito que a fusão Honda-Nissan vá provocar uma onda de novas aquisições, mas pode acelerar o processo”. Essa perspectiva levanta a questão: quem será o próximo a entrar na dança?
Os motores que impulsionam as fusões são vários e incluem a necessidade urgente de investimento em pesquisa e desenvolvimento (P&D), as margens de lucro cada vez mais estreitas e a mudança tecnológica acelerada rumo aos veículos elétricos (EVs) e autônomos. O futuro reserva um cenário em que apenas as montadoras com dimensão suficiente para sustentar esses altos custos conseguirão prosperar. Schuster ressalta que “fica cada vez mais desafiador sobreviver e não ter economias de escala se todos os outros estão fazendo isso, especialmente à medida que se avança para novas tecnologias”. Essas pressões estão se intensificando à medida que a indústria avança em direção a um futuro sustentado por inovação.
Novas tecnologias e custos bilionários para a indústria automotiva
A transição de veículos movidos a gasolina para elétricos e tecnologias de direção autônoma já custou dezenas de bilhões de dólares às montadoras, e estima-se que serão necessários muitos bilhões a mais. As regulamentações ambientais, por sua vez, tornam o lucro proveniente de motores de combustão interna cada vez mais arriscado, gerando uma pressão adicional para o setor se adaptar. Enquanto empresas como Tesla conseguem lucrar com seus veículos elétricos, a maioria dos fabricantes, incluindo diversos que operam na China, ainda não veem receitas positivas provenientes desses novos modelos.
O cenário é desafiador e surpreendente: apesar do apetite dos consumidores por tecnologias assistivas ao motorista, como frenagem automática e direção em autoestrada sob supervisão humana, a promessa de carros realmente autônomos continua fora de alcance. Recentemente, a GM cancelou seus planos de robô-táxi, citando os altos custos envolvidos, enquanto a Ford diminuiu suas iniciativas de desenvolvimento autônomo na última temporada. A pressa pela inovação, no entanto, não parece ter diminuído, com a Tesla e outros concorrentes retomando a dianteira na corrida tecnológica.
Além disso, a crescente competição proveniente de montadoras chinesas, que outrora eram limitadas ao mercado interno, agora se projetam para o cenário internacional. Marcas como a BYD, que vendeu mais de 4 milhões de veículos em 2024, uma impressionante alta de 41% em relação ao ano anterior, estão estabelecendo um novo paradigma. Diferentemente de muitos fabricantes ocidentais que ainda dependem de veículos de gasolina para suas vendas, mais de um terço das vendas da BYD já são de veículos elétricos.
Essas montadoras chinesas estão agitando mercados na Europa e são esperadas para capturar fatias significativas do mercado norte-americano em um futuro próximo. “Acredito que isso seja apenas a ponta do iceberg”, afirma K. Venkatesh Prasad, vice-presidente sênior de pesquisa do Centro de Pesquisa Automotiva de Michigan, rimando a crescente pressão econômica e tecnológica com uma inevitável aceleração nas fusões no setor automotivo.
De acordo com Prasad, a projeção é a de que, nos próximos cinco a dez anos, o número de montadoras significativas no mercado seja drasticamente reduzido. Ele sugere que existe espaço suficiente para apenas algumas grandes categorias por região, possivelmente duas no Japão, duas na Europa, duas nos Estados Unidos e duas na China. “Passar de vinte para oito seria uma redução bastante significativa”, enfatiza.
Desafios históricos nas fusões automotivas e suas implicações no futuro
Contudo, especialistas alertam que essas fusões e aquisições não são tão simples e diretas quanto parecem. O passado está repleto de casos de fusões fracassadas, como a da Daimler-Benz e Chrysler no final da década de 1990, que terminou em divisão apenas uma década depois, culminando em um colapso do grupo combinado e um resgate federal. Outro exemplo recente é a aliança entre Nissan e Renault, que, embora não seja uma fusão formal, desmoronou após a prisão de Carlos Ghosn, CEO da Nissan, por suposta má conduta financeira.
Além disso, forças políticas podem atuar como barreiras em algumas fusões, conforme aponta Peter Wells, professor da Cardiff Business School e diretor do Centro de Pesquisa da Indústria Automotiva. Ele destaca que a relutância de alguns países em permitir a fusão de suas montadoras nacionais com empresas estrangeiras pode dificultar futuros acordos. Wells também enfatiza que novos entrantes, como Tesla e BYD, têm a capacidade de transformar drasticamente o mercado, mesmo em um cenário onde as grandes montadoras tentam se consolidar.
A dinâmica do mercado mostra que veículos elétricos, impulsionados por novas tecnologias e pela demanda do consumidor, podem remodelar a competitividade global e criar um espaço de oportunidade para novas alianças e parcerias. Em setembro, por exemplo, a GM e a Hyundai anunciaram exploração conjunta de desenvolvimento e produção de veículos, tanto tradicionais quanto elétricos, o que sinaliza uma mudança no modo como os players da indústria estão se reposicionando. Essa formação de alianças é uma alternativa viável para aqueles que buscam sobreviver em um mercado que está em rápida transformação.
Ao encerrarmos essa análise sobre as movimentações no setor automotivo, fica a indagação no ar: será que a fusão entre Honda e Nissan será o primeiro de muitos passos que moldarão um panorama diferente em um futuro não muito distante? As cartas estão na mesa e a indústria está prestes a passar por um período de transformações profundas e significativas.