No dia 26 de outubro de 1882, o vilarejo Tlingit de Angoon, localizado na região sudeste do Alasca, foi alvo de um ataque devastador por parte da Marinha dos Estados Unidos. Com cerca de 420 habitantes na época, a comunidade sofreu consequências catastróficas em um evento que, mais de um século depois, ainda ecoa nas memórias e cicatrizes dos descendentes daquelas vítimas. Recentemente, 142 anos após o fatídico episódio, a Marinha se pronunciou, reconhecendo seu envolvimento e expressando suas desculpas por essa tragédia. O almirante Mark Sucato, comandante da região noroeste da Marinha, fez essa declaração durante uma cerimônia emocional que rememorou a data, enfatizando a importância da reparação histórica.

Na solenidade, transmitida ao vivo de Angoon, o almirante Sucato reconheceu as profundas feridas infligidas ao povo Tlingit, afirmando: “A Marinha reconhece a dor e o sofrimento causados, e sabemos que essas ações erradas resultaram na perda de vidas, na perda de recursos e na perda de cultura, além de terem gerado e imposto um trauma intergeracional a esses clãs.” Esta declaração de desculpa representa um passo importante em direção à cura para uma comunidade que, por décadas, clamou por reconhecimento e reparação, iniciando anualmente suas lembranças pedindo uma reação da Marinha. O líder tribal Daniel Johnson Jr. expressou o anseio por esse pedido de desculpas, mencionando como o sofrimento de suas gerações echoa a busca por explicações sobre o que realmente aconteceu em 1882.

A tragédia se insere em um contexto mais amplo de conflitos entre o exército norte-americano e os nativos do Alasca, após a aquisição do território dos russos em 1867. Além de Angoon, a Marinha recentemente pediu desculpas pela destruição do vilarejo de Kake em 1869 e o Exército também anunciou planos para se desculpar pelo bombardeio de Wrangell, embora ainda não haja uma data definida. As comunidades de Angoon e Kake foram devastadas por ações que causaram mortes, perda de recursos e trauma geracional, refletindo um legado de injustiça que se arrasta até os dias atuais.

Ainda que em 1973 Angoon tenha recebido um pagamento de 90 mil dólares em um acordo com o Departamento do Interior, a busca por um pedido de desculpas se tornou um clamor constante entre os líderes da vila. Durante a cerimônia, Sucato se comprometeu a levar o peso histórico desse evento a sério, ressaltando que o pedido de desculpas, embora tardio, é um passo necessário para a reconciliação. Angoon, com suas casas coloridas e totens, se destaca como um vilarejo que luta para fortalecer sua identidade e ecoturismo, apesar das lembranças pesadas do passado. O local ainda é marcado pela presença de ursos-pardos e pela rica vida marinha, no entanto, as cicatrizes da história permanecem visíveis.

Os relatos sobre o que motivou a destruição da vila variam, mas todos concordam que o incidente teve início com a morte acidental de um xamã Tlingit, Tith Klane. A versão da Marinha relata que os nativos forçaram uma embarcação a encalhar, reivindicando compensação. No entanto, a narrativa contada pelos Tlingits difere significativamente. Segundo os membros da comunidade, a tripulação estava ali para prestar respeito ao falecido, e não havia intenção de revolta. O que se seguiu foi um ataque brutal, com a destruição de casas e armazéns de alimentos, resultando na morte de muitas pessoas — incluindo seis crianças — e deixando muitos outros vulneráveis ao frio e à fome durante o inverno rigoroso que se seguiu.

À luz deste histórico sombrio, a adesão da Marinha às alegações e narrativas Tlingit representa um passo significativo. Para muitos na comunidade, como Eunice James, descendente de Tith Klane, o pedido de desculpas traz esperança de que tanto seu espírito quanto o de seus ancestrais sejam reconhecidos em um caminho de cura. “Não apenas o espírito dele estará presente, mas também o de muitos de nossos ancestrais, porque perdemos tantos,” afirmou James, ressaltando a importância emocional do ato. A cerimônia de desculpas, portanto, não serve apenas como um reconhecimento do passado, mas como um sinal de esperança para um futuro em que diferentes culturas possam reconhecer suas experiências passadas e construir um entendimento mútuo.

Em um país que frequentemente se vê confrontado com seus erros históricos, a Marinha dos EUA fez um movimento que, embora tarde, pode abrir um diálogo valioso sobre o reconhecimento e a reparação. Que essa aceitação das faltas do passado sirva de exemplo para outras instituições enfrentarem suas credenciais históricas e buscarem uma verdade compartilhada.

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