A nova temporada de Star Trek: Lower Decks trouxe uma série de surpresas em seu primeiro episódio, intitulado “Dos Cerritos”. Nesse episódio, os jovens oficiais da nave USS Cerritos se deparam com uma anomalia espacial que os transporta para uma realidade alternativa. A nova capitã, Becky Freeman, interpretada por Tawny Newsome, apresenta uma abordagem drástica para o comando, refletindo uma regra originalmente proposta por Gene Roddenberry, o criador da franquia Star Trek. No contexto do episódio, Roddenberry acreditava que, no século 24, a humanidade teria evoluído a ponto de os conflitos interpessoais não serem mais uma preocupação. E assim, a capitã Freeman impõe a proibição de qualquer discordância a bordo, propondo uma dinâmica de poder rigorosa e hierárquica.

A trama se desenvolve quando a tripulação da USS Cerritos, ao confrontar suas versões alternativas, descobre que a capitã Becky Freeman não é apenas uma líder, mas uma autoridade temida. A frase de efeito da capitã “Não permito conflitos interpessoais na minha nave!” captura a essência de sua política de comando. Essa visão de Roddenberry contrasta com as experiências reais de interações humanas, onde a tensão e o conflito são inevitáveis. Surpreendentemente, a capitã Freeman não promove a harmonia genuína entre sua tripulação; ao contrário, seu comando é marcado por uma implacável disciplina que deixa claro seu domínio sobre os oficiais subalternos. Os frequentadores da nave USS Cerritos, sob seu comando, têm que lidar com a realidade de um ambiente onde as consequências severas para qualquer desvio da disciplina são a norma.

Sob a fascinação do espectador, as reações e sentimentos da nova tripulação refletem a complexidade da natureza humana. Essa abordagem ironiza a perspectiva original de Roddenberry, que imaginou um futuro onde a civilização teria superado esses conflitos. Ao longo da série, aprendemos que a verdadeira evolução da humanidade e suas interações pode ser encontrada na capacidade de resolver conflitos de forma construtiva, em vez de ignorá-los ou proibi-los. Essa nova temporada de Star Trek: Lower Decks aprofunda-se nestas questões ao mostrar uma capitã que defende uma regra de “não conflito” como uma ditadura disfarçada de amor pela ordem.

Contrapondo-se ao espírito de colaboração que caracteriza a história da franquia, a capitã Freeman suscita discussões sobre a eficácia e a moralidade da imposição de uma cultura de disciplina absoluta. A primeira temporada de Star Trek: Lower Decks foi uma introdução refrescante ao mundo de Star Trek, trazendo uma nova perspectiva humorística e crítica ao universo. Destacar como as situações tensas são frequentemente musas para momentos dramáticos, os escritores da série têm uma longa história de contornar o histórico “não conflito” estabelecido por Roddenberry nas suas regras fundamentais. Esta tradição de habilidades narrativas se estendeu para Star Trek: Deep Space Nine, que apresentou uma gama diversificada de novos e intrigantes personagens não pertencentes à Frota Estelar, proporcionando intensos conflitos que refletiam e desafiavam as normas do universo Star Trek.

Com a supressão gradual da regra de Roddenberry após sua morte em 1991, a série permitiu expressões de conflito e resistência, resultando em episódios memoráveis, como os da sexta temporada de Star Trek: The Next Generation, que exploraram rivais e dilemas morais na Frota. Essa transformação na narrativa é importante, pois gera um espaço para desenvolver personagens mais complexos e relacionáveis, envolvidos em conflitos autênticos que espelham a diversidade da experiência humana.

Os novos programas de Star Trek agora abraçam a ideia de que conflitos interpessoais são parte intrínseca do ser humano, mesmo aqueles que servem à Frota Estelar. Portanto, os personagens contemporâneos de Star Trek trazem à mesa suas individualidades, emoções e agendas, levando a interações mais autênticas, que muitas vezes culminam em desentendimentos e climas tensos entre eles. Isso é especialmente notável em Star Trek: Lower Decks, onde a experiência dos oficiais júnior da USS Cerritos é central, refletindo suas lutas e triunfos ao enfrentar os desafios do espaço, enquanto tentam encontrar um ponto de entendimento — uma qualidade que contrasta com a dura linha tomada pela capitã Becky Freeman.

Em conclusão, a estreia da temporada inédita de Star Trek: Lower Decks não só traz humor, mas também convida os espectadores a refletirem sobre a verdadeira natureza das relações humanas e a evolução da narrativa na franquia Star Trek. Com a transição para uma abordagem que permite conflitos, a série destaca o que significa ser humano, dialetizando não apenas a evolução da ficção científica, mas também as interações do dia a dia. Assim, a mensagem ressoa: talvez o verdadeiro crescimento da humanidade seja exatamente a capacidade de discordar e, ainda assim, encontrar maneiras de se unir em prol de um objetivo maior.

Similar Posts

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *