Na emocionante edição deste ano da Frieze Londres, o trabalho da artista nigeriana Nengi Omuku se destacou ao desafiar as convenções do espaço expositivo. Com três grandes obras suspensas fora das paredes, Omuku permitiu que os espectadores circundassem suas criações, revelando um aspecto intrigante que caracteriza seu trabalho: cada pintura apresenta um lado vibrante, repleto de natureza, enquanto o outro é adornado com tiras de sanyan, uma densa e tradicional tecido nigeriano. Esta escolha não é meramente estética, mas uma profunda representação da identidade cultural que permeia a obra da artista, que explica: “O fato de eu estar pintando sobre uma superfície vintage dá alma ao meu trabalho.”
Aos 37 anos, Nengi Omuku já construiu uma carreira notável, desafiando a categorização comum de artistas em ascensão. Desde que completou seus estudos na renomada Slade School of Fine Art em 2012, sua arte foi exibida em algumas das metrópoles mais influentes do mundo, incluindo Londres, Paris, Bangkok e Nova Iorque. Seu trabalho não só adorna galerias, mas também figura em coleções relevantes, como o Museu de Arte de Baltimore, o Instituto de Arte Contemporânea de Miami e a Coleção de Arte Loewe. Recentemente, seu quadro intitulado “All Things Being Equal” (2024) foi selecionado pelo Primeiro-Ministro britânico, Keir Starmer, para ser exibido em sua residência oficial, o 10 Downing Street.
A escolha do sanyan por Omuku tem raízes em sua experiência pessoal e cultural. Inicialmente adotado por necessidade, esse tecido, que remonta ao período pré-colonial iorubá, encontrou um espaço integral em sua prática artística. Omuku relembra sua transição de telas tradicionais para o sanyan, um movimento que ocorreu após oito anos de estudos no Reino Unido, onde ela buscava redescobrir sua identidade e sua conexão com a cultura nigeriana. A artista compartilha que, ao voltar a sua terra natal, não encontrou telas de boa qualidade, ao passo que o sanyan a fascinou por sua estética e história. Essa mudança se mostra não apenas como uma escolha artística, mas uma forma de celebrar suas raízes culturais.
A jornada de Omuku inclui a pesquisa e a preservação da herança têxtil nigeriana, envolvendo-se com artesãos que estão por trás da produção do sanyan. Em sua busca por materiais autênticos e de qualidade, ela teve que recorrer a mercados locais e a técnicas tradicionais, defendendo uma prática que respeita tanto o processo artístico quanto a cultura. O ativismo cultural de Omuku é evidenciado pelo seu envolvimento com uma família de fiadores de algodão, com quem trabalha para produzir o sanyan especificamente para suas obras. É uma maneira de resgatar e manter viva uma tradição que corre o risco de desaparecer em meio à cultura da moda rápida que impera nos dias atuais.
Em suas criações, a artista não se limita a técnicas tradicionais ou a uma única narrativa. Suas obras são um espaço onde as figuras humanas se entrelaçam em ambientes naturais sonhadores, levando o espectador a refletir sobre as experiências coletivas e os desafios vividos pelos nigerianos. No maior quadro exposto em Frieze, intitulado “Swing Low” (2024), figuras que parecem desfrutar de um passeio em paisagens deslumbrantes compartilham espaço com imagens impactantes que retratam a desordem social. Omuku admite que seu jeito de ver a vida artística mudou ao longo do tempo, especialmente após retornar à Nigéria, onde se deparou com uma grave crise de saúde mental e questões sociais que afetam sua gente diariamente. “E foi nesse momento que comecei a me conscientizar sobre o coletivo”, diz a artista.
O alcance da arte de Nengi Omuku transcende a superfície visual de suas obras. Apesar da aparência encantadora e leve, sua arte é o resultado de um processo bem planejado que busca não apenas encantar, mas também provocar uma reflexão crítica sobre as realidades que ela e outros nigerianos enfrentam. Ao descrever suas intenções, Omuku revela que deseja resgatar a ideia de que o nosso mundo, apesar de suas imperfeições, ainda tem sua beleza. Com essa visão otimista, a artista busca lembrar aos espectadores da importância de valorizar a beleza ao nosso redor e a possibilidade de transformar a dor em arte. Afinal, o que seria da arte se não para nos fazer sentir e refletir sobre o nosso papel no mundo?