O caso controverso de um pai condenado pela morte da filha revela desafios na compreensão do “síndrome do bebê sacudido”
Texas se prepara para executar Robert Roberson, um homem que, segundo seus advogados, foi condenado injustamente pela morte de sua filha de dois anos, Nikki Curtis, há mais de duas décadas. O caso, que culminou em uma sentença de morte, reflete não apenas as complexidades do sistema judiciário, mas também as dificuldades associadas à interpretação de diagnósticos médicos, especificamente o tão debatido “síndrome do bebê sacudido”. Os advogados de Roberson argumentam que Nikki faleceu em decorrência de pneumonia dupla que evoluiu para sepse, uma condição que foi agravada por medicamentos considerados inapropriados para crianças, colocando em dúvida a determinação da causa da morte como sendo abusiva.
No hospital, após o colapso de Nikki, os médicos e enfermeiros diagnosticaram imediatamente o caso como uma possível agressão, com base nas marcas e lesões observadas, entre elas um severo inchaço cerebral e hemorragias. Contudo, os defensores de Roberson sustentam que esse diagnóstico foi uma grave falha médica. Eles também ressaltam que o comportamento aparentemente “plano” do pai ao lidar com a situação foi interpretado como um sinal de culpa, quando na verdade isso refletia sua condição de autismo, não diagnosticada à época, mas que foi identificada em 2018. Em suas próprias palavras, Roberson afirmou: “Não cometi crime algum, fui falsamente condenado por um crime que não ocorreu. Tudo que eu queria era cuidar de minha filha doente”. Esta declaração ocorreu uma semana antes da data programada para sua execução, prevista para quinta-feira.
Se a execução ocorrer, Roberson se tornará o primeiro homem nos Estados Unidos a ser executado com base em uma condenação relacionada ao “síndrome do bebê sacudido” em um momento em que esse diagnóstico está passando por crescente escrutínio em tribunais americanos. O caso sublinha um risco inerente à pena de morte: a possibilidade de que um inocente seja levado à câmara de gás. Desde 1973, pelo menos 200 pessoas foram exoneradas após serem condenadas à morte, incluindo 18 no Texas, de acordo com o Centro de Informações sobre a Pena de Morte.
Apoios e críticas ao processo de condenação
Entre os apoiadores de Roberson estão o Innocence Project, grupos de defesa do autismo que expressam preocupação sobre o papel da deficiência de Roberson em sua condenação, um grupo bipartidário de mais de 80 legisladores texanos, e até mesmo o renomado autor de thrillers jurídicos, John Grisham. Também se destaca a figura de Brian Wharton, ex-detetive que agora se arrepende de sua participação em uma investigação que, segundo ele, foi excessivamente focada na suspeita de Roberson. Wharton reconhece que as reações emocionais da equipe de emergência ao estado da criança, aliadas à aparência de Roberson, influenciaram negativamente a investigação. “Esses dois fatores se somaram para criar um foco desproporcional em Roberson, excluindo a exploração de outras possibilidade,” disse Wharton.
O aspecto mais polêmico do caso reside na aceitação do “síndrome do bebê sacudido.” Embora reconhecido como um diagnóstico válido pela Academia Americana de Pediatria e por pediatras especializados em abuso infantil, a definição evoluiu nas últimas décadas. O “síndrome do bebê sacudido” tem sido considerado um tipo de trauma craniano abusivo, onde um cuidador, frustrado e em um momento de desespero, pode sacudir ou causar impacto traumático na cabeça de uma criança. Este fenômeno é uma das principais causas de morte por abuso infantil em crianças menores de cinco anos, de acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA.
No entanto, os advogados de Roberson contestam essa narrativa, referindo-se a um relatório de 2001 da Academia Americana de Pediatria que, segundo eles, promoveu um viés contra Roberson ao sugerir uma presunção de abuso em casos de lesões intracranianas em crianças pequenas. Eles alegam que outros fatores, como a condição de saúde de Nikki e os medicamentos que ela estava tomando, poderiam ter contribuído para sua morte, e que a abordagem dos médicos que a trataram pode ter sido tendenciosa e insuficientemente abrangente. Para seus defensores, não é um caso de abuso, mas sim uma série de eventos fortuitos que levaram à tragédia.
A apelação final e o futuro incerto
À medida que a data da execução se aproxima, a equipe legal de Roberson continua a buscar a anulação de sua condenação. Eles planejam apresentar novos argumentos em um tribunal, questionando a jurisdição do juiz que agendou sua execução, bem como pedindo clemência ao Conselho de Pardons e Parole do Texas, além do governador do Texas, Greg Abbott. Neste momento crítico, a morte de Nikki ainda pesa fortemente sobre a família e amigos, mas também levanta questões mais amplas sobre a justiça e a eficácia do sistema penal americano.
O caso de Robert Roberson é um exemplo emblemático de como diagnósticos médicos podem influenciar decisões judiciais e a vida de indivíduos. Às vésperas de sua possível execução, Roberson se mantém esperançoso, planejando um futuro em que espera um dia poder visitar o túmulo de sua filha e começar uma nova vida, caso consiga evitar o trágico desfecho que se avizinha. É uma situação repleta de incertezas que requer uma análise cuidadosa não apenas do caso em si, mas também das implicações mais amplas da aplicação da pena capital em um sistema em que falhas judiciais podem levar a consequências irreversíveis.