Em meio a um cenário político tumultuado, os cidadãos da Moldova se preparam para votar no segundo turno de uma eleição presidencial crucial que pode definir os rumos do país. Markado por tensões geopolíticas e uma disputa acirrada, o pleito de 29 de outubro se apresenta como um divisor de águas entre a inclinação pro-europeia da atual presidente Maia Sandu e os interesses proeminentes da Rússia, que busca restaurar sua influência na região pós-soviética. Sandu, que defende a continuidade da aproximação ao bloco europeu, foi reeleita no primeiro turno com 42% dos votos, um resultado que ocorreu em meio a um referendo sobre a adesão à União Europeia, o qual foi aprovado por uma votação apertada. Contudo, ambos os eventos foram maculados por um esquema maciço de compra de votos, supostamente ligado ao Kremlin, que Sandu descreveu como um “assalto sem precedentes” à democracia moldava.

No cerne desta eleição, Sandu enfrenta Alexandr Stoianoglo, ex-procurador-geral e agora candidato do Partido dos Socialistas, que adota uma postura mais próxima do Kremlin. A possibilidade de apoio de outros partidos favoráveis à Rússia torna a competição acirrada e a vitória incerta. Durante debates presidenciais, Sandu, graduada em Harvard e ex-oficial do Banco Mundial, acusou Stoianoglo de ser um “Cavalo de Troia”, insinuando que sua candidatura representa os interesses russos dentro da cidade capital, Chisinau. Para especialistas na área, a questão transcende a mera retórica. Valeriu Pasha, diretor da organização não governamental WatchDog.MD, ressaltou que o pleito de domingo representa a escolha entre um presidente legitimamente eleito pelos cidadãos e um candidato que possa triunfar devido a financiamento ilícito proveniente de interesses russos.

A situação é exacerbada por relatos de Ilan Shor, um oligarca apoiado pela Rússia, que teria oferecido pagamentos para pessoas que trabalhassem em prol de um candidato alinhado ao Kremlin, além de impedir a aprovação do referendo sobre a adesão à UE. Sandu denunciou que o esquema visava corromper cerca de 300 mil eleitores, o que corresponde a aproximadamente 10% da população moldava. Apesar de uma aprovação nas pesquisas inferior a 10% antes da eleição, Stoianoglo obteve surpreendentes 26% no primeiro turno, evidenciando uma reação adversa ao governo Sandu. Enquanto isso, tanto o Kremlin quanto Shor negaram qualquer envolvimento, mas autoridades moldavas permanecem cientes de que o segundo turno poderá sofrer com manobras semelhantes de subversão.

Além da compra de votos, a primeira rodada da eleição revelou um descontentamento genuíno com a gestão de Sandu, que teve que enfrentar crises sucessivas durante seu mandato, incluindo a pandemia de Covid-19, a guerra na Ucrânia e uma crise energética que afetou severamente a população, que já vive em uma das nações mais pobres da Europa. A inflação, que chegou a ultrapassar os 30%, impulsionou a pobreza e afetou o apoio popular a Sandu. Críticos da presidente também apontaram para a decisão “cínica” de realizar a votação do referendo sobre a UE no mesmo dia da eleição, posicionando-se como a única opção viável para a integração europeia da Moldova. A estratégia do governo, conforme destacado por Samurokov, não gerou o efeito desejado; o descontentamento com Sandu acabou por prejudicar a aceitação da ideia de integração europeia.

A estratégia de Stoianoglo é, de acordo com analistas, manter uma postura ambígua entre as duas orientações. Ele propôs um “reset” nas relações com Moscovo e se disse disposto a se encontrar com o presidente Vladimir Putin, ao mesmo tempo em que afirma sua intenção de integrar a Moldova à União Europeia. Essa posição contraditória gera confusão e contradições nas políticas defendidas por ele, o que dificulta a reconciliação de um apoio consistente tanto à integração europeia quanto à colaboração com Moscovo.

À medida que o segundo turno se aproxima, as autoridades moldavas se preparam para uma votação que pode mais uma vez ser influenciada por manipulações externas. Uma eventual derrota para Sandu seria um golpe devastador para as aspirações do país de se alinhar ao Ocidente. Um governo favorável à Rússia poderia também provocar novas tensões em Transnistria, uma região separatista onde cerca de 1.500 soldados russos estão estacionados, levantando questões sobre a possibilidade de a região se tornar um novo teatro de conflito na guerra da Ucrânia. Pasha alertou para o pior cenário, onde, caso os candidatos pró-russos assumam o controle do parlamento, mais esforços para desmantelar instituições democráticas poderiam ser implementados, minando as bases de uma Moldova democrática e independente.

Assim, enquanto o país aguarda as eleições, a sombra da influência russa continua a pairar, refletindo um ato final que poderá decidir não apenas o futuro político da Moldova, mas também definir sua trajetória na complexa teia geopolítica da região, onde os ecos da luta por liberdade enfrentam as armadilhas da manipulação externa.

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