No último dia 21 de novembro, a Comissão Federal de Comércio (FTC) dos Estados Unidos anunciou a decisão de processar o neobank online e aplicativo de dinheiro Dave, sob acusações de que a empresa utilizou práticas de marketing enganosas que teriam como objetivo confundir os consumidores. A polêmica gira em torno das promoções de adiantamentos em dinheiro oferecidos pela empresa, especificamente em relação a um montante de até US$ 500, que, segundo a FTC, era raramente concedido. Além disso, chama a atenção a taxa “Express Fee”, cobrada quando os consumidores desejam receber o dinheiro imediatamente.
A FTC argumenta que a forma como Dave comercializava esses adiantamentos era enganosa, pois suas campanhas publicitárias davam a entender que os adiantamentos em dinheiro seriam “instantâneos”, utilizando termos como “na hora” para descrever o processo. No entanto, as taxas cobradas pelo serviço eram informadas apenas após o consumidor finalizar o cadastro e permitir que Dave tivesse acesso à sua conta bancária, o que levantou sérias preocupações sobre a transparência da empresa.
As taxas variavam de US$ 3 a US$ 25, de acordo com a reclamação feita pela FTC. Caso o usuário optasse por não pagar a taxa, teria que aguardar de dois a três dias úteis para que a transferência padrão fosse concluída, uma situação que poderia causar frustração. Para complicar ainda mais, a FTC denunciou que a Dave muitas vezes aplicava uma taxa surpresa, caracterizada como uma “gorjeta”. A interface do aplicativo, conforme descrito pela FTC, era configurada de tal maneira que tornava difícil para os usuários detectarem ou evitarem essa cobrança adicional, levando muitos consumidores a se sentirem enganados.
Esse tipo de prática é um exemplo do que a FTC denomina de “padrões obscuros”, que são técnicas de design manipulativo usadas para guiar os usuários a tomar ações que beneficiam as metas da empresa, em vez de atender aos interesses dos consumidores. Entre as ações que a FTC pretende penalizar, estão comportamentos como a seleção automática de caixas ao se inscrever e a apresentação de botões maiores para ações que a empresa deseja que os usuários realizem. Um estudo recente da agência revelou que uma grande parte dos aplicativos e sites de assinatura utiliza padrões obscuros para enganar os usuários.
No caso da Dave, os consumidores eram expostos a imagens de uma criança em um ambiente lúdico, com mensagens como “10 refeições saudáveis”, “15 refeições saudáveis” ou “20 refeições saudáveis”, insinuando que a gorjeta seria direcionada para a compra de alimentos para aqueles que precisam. A FTC afirmava, porém, que apenas 10 centavos de cada “gorjeta” eram efetivamente doados, enquanto a empresa retinha a maior parte do valor. Assim, a gorjeta não chegava a garantir uma refeição completa, quanto mais as 10 a 20 refeições prometidas. Além disso, quando os consumidores tentavam reduzir o valor da gorjeta, a interface do aplicativo mostrava a comida sendo retirada do prato da criança, até que chegassem a um prato vazio, conforme relatado na reclamação.
De acordo com registros financeiros enviados à SEC, a Dave obteve mais de US$ 149 milhões em receita proveniente de gorjetas de 2022 até o primeiro semestre de 2024, conforme informou a FTC.
Outro ponto criticado pela FTC foi a cobrança de uma taxa mensal de US$ 1, debitada diretamente das contas bancárias dos clientes. Quando os usuários se deparavam com essa taxa, muitas vezes encontravam dificuldades em cancelá-la, conforme descrito na reclamação. Alguns deles até tentaram excluir suas contas na esperança de se livrar da cobrança, mas continuaram sendo cobrados, segundo a FTC.
A reclamação completa inclui diversas capturas de tela das práticas enganosas da Dave, que, segundo a FTC, estão em violação da Seção 5(a) da Lei FTC e do Ato de Restauração da Confiança dos Consumidores Online (ROSCA). A agência busca uma liminar para impedir que a Dave continue essas práticas e poderá solicitar compensação monetária ou outros reparos conforme determinado pelo tribunal.
Em resposta à reclamação, a Dave expressou sua decepção com a decisão da FTC de ajuizar a ação. Em um comunicado, a empresa afirmou que a FTC apresenta várias alegações incorretas a respeito das informações que a Dave fornece e da forma como obtém o consentimento para as taxas associadas a seus produtos. A declaração ressalta: “Para evitar qualquer dúvida, a capacidade da Dave de cobrar taxas de assinatura, gorjetas opcionais e taxas expressas não está em discussão. Acreditamos que este caso é mais um exemplo de exagero regulatório por parte da FTC, e pretendemos nos defender vigorosamente. Levamos a conformidade e a transparência ao cliente muito a sério e acreditamos que sempre atuamos dentro da lei. Continuamos focados em atender nossos membros que amam e dependem de nossos produtos”.