Uma nova pesquisa revela a transferência clandestina de 3.500 crianças sem pais legais pelo Vaticano

Revelações chocantes contrastam com as crenças sobre a adoção e os direitos das mães solteiras

Durante a década de 1950, o Vaticano implementou um programa controvertido que permitiu a transferência de aproximadamente 3.500 crianças italianas para os Estados Unidos sob a alegação de que eram órfãs, quando, na verdade, muitas delas eram filhos de mães solteiras. O escândalo traz à luz histórias de desespero e dor, revelando uma rede de adoções forçadas e o uso indevido da terminologia de orfandade. Essas revelações se tornaram ainda mais notórias após o pedido de desculpas do Papa Francisco em relação a um programa semelhante na Bélgica, que separou crianças de mães não casadas e colocou-as para adoção, muitas vezes sem o consentimento dessas mulheres.

A pesquisa realizada pela autora Maria Laurino, em seu livro intitulado “O Preço dos Filhos”, detalha o funcionamento desse programa cujo impacto intergeracional se faz sentir até os dias atuais. No período de 1950 a 1970, muitas mães italianas, que enfrentavam a desaprovação social e a pressão familiar, foram obrigadas a entregar seus filhos. Essas mulheres frequentemente acreditavam que estavam temporariamente deixando seus filhos sob os cuidados da Igreja, com a esperança de um retorno quando suas vidas se estabilizassem. O testemunho comovente de John Campitelli, um dos adotados criados em um ambiente católico nos Estados Unidos, reflete a tragédia e as mentiras associadas a esse sistema. Campitelli, conhecido como Piero Davi ao nascer, recorda que sua mãe nunca assinou um documento autorizando sua entrega, e que em nenhum momento consintiu em perdê-lo para sempre. Sua história retrata a profundidade do engano que muitas mães italianas enfrentaram, uma vez que foram levadas a acreditar que tinham perdido seus filhos para sempre, sem qualquer indicação do que realmente havia ocorrido.

O programa foi viabilizado por uma lei americana de 1950 que expandiu a definição de órfão, permitindo que crianças com apenas um pai vivo, mas sem condições de cuidar delas, fossem enviadas para adoção. Essa oportunidade foi rápida e vorazmente explorada pela Igreja, que até mesmo cobrava uma taxa substancial por cada criança transferida, uma prática que, segundo Laurino, resultou em uma verdadeira “máquina” que buscava bebês nas áreas rurais da Itália, visando atender a uma demanda crescente por adoções nos Estados Unidos. No contexto da época, discursos que idealizavam as adoções como a única chance de vida para essas crianças ocultavam uma realidade muito mais complexa, marcada pela exploração e desumanidade.

A pesquisa de Laurino também revela que, muitas vezes, os consentimentos eram obtidos de forma enganosa, com médicos ou advogados assinando em nome das mães, ou mesmo por meio de pressões intensas. Algumas mulheres foram informadas que seus filhos haviam morrido, uma horrenda tática utilizada para evitar que buscassem suas crianças. As cartas preservadas nos arquivos da Igreja são testemunhos comoventes de mães que pediam a repatriação de seus filhos, confusas e destroçadas pela separação forçada. Em uma dessas cartas, uma mãe implora ao Monsenhor Landi, que gerenciava o programa, falando sobre sua dor e desesperança.

Ao longo das décadas que se seguiram, muitas dessas crianças, agora adultos, lutaram para entender suas identidades e as histórias de suas mães biológicas. Ampla documentação da atividade da Igreja foi descoberta, mostrando o quanto o Vaticano estava ciente de cada movimento. A desencorajada Igreja, que afirmava que a adoção era a melhor solução para essas crianças, ainda hoje enfrenta as consequências legais e morais de suas ações. As versões das mães, agora tidas como “mulheres descartáveis”, revelam a brutalidade da época, onde a compaixão foi substituída pela conveniência da Igreja, que buscava preservar sua imagem e interesses religiosos em uma sociedade de moral rígida.

A história de Campitelli não é um caso isolado, mas um exemplo emblemático de como as adoções forçadas afetaram innumeráveis vidas, criando um ciclo de dor e silêncio que ecoa nas gerações futuras. Sua busca por sua mãe biológica, que começou anos após sua adoção, expõe não apenas a desintegração da relação entre mãe e filho, mas também a luta pela verdade e identidade que milhares de pessoas têm enfrentado após serem separadas de suas famílias. Uma mensagem clara ressoa entre esses relatos: o legado desse programa ainda persiste, gerando uma profunda reflexão sobre direitos, maternidade e o impacto das instituições religiosas na vida pessoal de suas congregações.

Ainda que o programa do Vaticano tenha sido encerrado em 1970, os ecos do passado não podem ser facilmente esquecidos. As reuniões entre adotados e suas mães biológicas revelam a dor e a alegria de reencontros, mas também trazem à tona uma realidade sombria que muitos prefeririam esquecer. O reconhecimento da Igreja, ou a falta dele, sobre sua responsabilidade nas vidas de tantos não é suficiente para reparar o estrago causado. O testemunho contrário da experiência de vida desses indivíduos clama por justiça e entendimento em um campo emocional e social que ainda está se recuperando do impacto dessas decisões.

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One Comment

  1. A Igreja é uma organização humana, carreando por isso consigo todos os defeitos do Homem. Pedro, o primeiro Papa nomeado por Jesus Cristo ( Tu és Pedro e sobre essa pedra construirei a Igreja/ Organização ), na noite da crucificação, negou o seu Mestre por três vezes. Caindo em si, chorou amargamente e arrependeu-se, acabando mais tarde por dar a sua vida a Cristo, crucificado de cabeça para baixo. O arrependimento é a pedra de toque para que as más acções sejam perdoadas. Quem organizou no Vaticano a operação das falsas adopções deve arrepender-se, ou não entrará no Reino Celestial!

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