Londres — O arcebispo de Cantuária, Justin Welby, a figura proeminente da Igreja Anglicana mundial, fez um anúncio impactante na terça-feira, ao divulgar sua renúncia após uma revisão independente que revelou que ele e outros líderes da igreja encobriram abusos sexuais “prolíficos e abomináveis” que afetaram mais de 100 meninos e jovens no Reino Unido e em outros países. Esses abusos foram perpetrados por John Smyth, um advogado britânico que se destacou como um dos principais organizadores de acampamentos cristãos durante as décadas de 1970 e 1980.

As graves acusações contra Smyth envolvem ataques a vários meninos e jovens que frequentei esses acampamentos cristãos. O advogado faleceu na África do Sul em 2018, aos 77 anos, sem que jamais tenha enfrentado um processo judicial. Este panorama de impunidade e descaso chocou a sociedade e despertou um clamor por justiça – um clamor que agora paira sobre a liderança da Igreja Anglicana.

Em sua declaração de renúncia, Welby confessou: “Os últimos dias renovaram meu profundo e antigo sentimento de vergonha pelos fracassos históricos na proteção de crianças da Igreja da Inglaterra.” Ele ressaltou a luta contínua que enfrentou nos últimos doze anos para implementar melhorias nos processos de proteção à infância na igreja, mas agora admite que é responsabilidade de outros julgar suas ações e eficácia. A dor e a indignação ressentida permeiam suas palavras, denotando a pressão que recai sobre sua figura após tamanha revelação.

Em resposta ao conteúdo da revisão, Welby expressou seu arrependimento: “Sinto muito que em lugares onde esses jovens, e meninos, deveriam ter se sentido seguros e onde deveriam ter experimentado o amor de Deus por eles, foram submetidos a abusos físicos, sexuais, psicológicos e espirituais.” Essas palavras revelam um reconhecimento contundente das falhas que permitiram que Smyth atuasse impunemente e ressaltam o impacto devastador que as ações da igreja tiveram sobre as vidas das vítimas.

A revisão independente da Igreja da Inglaterra, publicada na última semana, expôs que, “apesar dos esforços de alguns indivíduos para trazer os abusos à atenção das autoridades, as respostas da Igreja da Inglaterra e de outros foram completamente ineficazes e equivaleram a um encobrimento”, conforme revelou o líder da revisão. Essa constatação abala a confiança que muitos depositam na Igreja Anglicana, levantando questões fundamentais sobre sua capacidade de proteger os vulneráveis e garantir um ambiente seguro para todos.

Welby admitiu que só tomou conhecimento dos abusos de Smyth em 2013, ano em que assumiu como arcebispo. Ele também reconheceu: “Entretanto, a revisão é clara ao afirmar que eu pessoalmente falhei em garantir que, após o relato de 2013, essa tragédia cruel fosse investigada com energia.” Embora ele afirme que desde então houve mudanças significativas na forma como a Igreja da Inglaterra se relaciona com vítimas e sobreviventes de abuso, a crítica pública intensa evidencia que muitos consideram estas mudanças tardias e insuficientes.

A Igreja da Inglaterra, também conhecida como Igreja Anglicana, é a forma de cristianismo mais proeminente no Reino Unido, e Welby ocupou um papel central em eventos de grande visibilidade, como a cerimônia de casamento do Príncipe Harry e Meghan Markle, bem como o funeral de estado da Rainha Elizabeth II. No entanto, sua reputação agora permanece em discussão em meio a esse cenário sombrio de encobrimento e abusos não punidos.

Bishop Helen-Ann Hartley, da Diocese de Newcastle, expressou suas preocupações em entrevista à CBS News, questionando a capacidade da Igreja em garantir a segurança: “Acho que, com razão, as pessoas estão se perguntando: ‘Podemos realmente confiar na Igreja da Inglaterra para nos manter seguros?’ E acho que a resposta, no momento, é ‘não’.” Essa indagação não é apenas um eco das frustrações das vítimas, mas também uma representação da crescente desconfiança da população em relação a instituições que deveriam proteger os mais indefesos.

Andrew Morse, um sobrevivente que relatou ter sido abusado durante anos por Smyth, também pediu a renúncia de Welby. Ele disse que a admissão de Welby de que, em 2013, não fez o suficiente, foi um reconhecimento chocante. “A falta de rigor na investigação de suas ações em 2013 poderia ter evitado abusos adicionais”, concluiu Morse, evidenciando que, enquanto algumas vidas foram destruídas, outras poderiam ter sido salvas se ações apropriadas tivessem sido tomadas na época.

Esse caso alarmante, envolvendo não apenas figuras eclesiásticas, mas também a confiança de uma comunidade inteira, deve servir como um alerta para ações concretas. A resiliência da Igreja Anglicana será testada diante desse dilema ético, que não apenas reverbera dentro de suas paredes, mas ecoa na sociedade como um todo, demandando mudanças reais e efetivas para que todos, especialmente os mais vulneráveis, possam sentir-se seguros em todos os momentos.

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