O Festival de Cinema Camerimage, um evento altamente reverenciado dedicado à arte da cinematografia, se encontra em meio a uma tempestade de controvérsias dias antes da abertura da sua 32ª edição. Recentemente, diversas organizações internacionais de cinematografia manifestaram suas preocupações em relação a um editorial provocador escrito por Marek Żydowicz, o fundador e CEO do festival. Publicado na edição mais recente da revista *Cinematography World*, o artigo era uma resposta a uma petição feita em setembro pela organização Women in Cinematography, que visa representar melhor as mulheres na cinematografia e solicitou um apoio mais robusto do Camerimage. Contudo, em vez de aceitar a crítica e promover mudanças em seu programa — um movimento que outros festivais, como Cannes, Berlim e Tóquio, têm feito nos últimos anos — Żydowicz argumentou que a inclusão de mais trabalhos de diretoras de fotografia mulheres arriscaria a qualidade artística do evento.

Em seu editorial, Żydowicz sustentou: “A indústria cinematográfica está passando por mudanças rápidas que afetam a imagem cinematográfica, seu conteúdo e estética. Uma das alterações mais significativas é o crescente reconhecimento das diretoras de fotografia e diretores. Essa evolução é crucial para corrigir injustiças históricas na sociedade. No entanto, levanta a questão: a busca por mudanças pode excluir aquilo que é bom? Podemos sacrificar obras e artistas com realizações artísticas excepcionais apenas para dar espaço a produções medíocres?” A resposta de Żydowicz não apenas desconsidera a luta por equidade no setor, como também provocou uma onda de reações entre os profissionais de cinematografia, levando a respostas quase imediatas de várias associações.

A British Society of Cinematographers (BSC), uma entidade estabelecida em 1949, manifestou sua desaprovação ao editorial de Żydowicz através de uma carta pública. Na mensagem, a BSC expressou: “Estamos desanimados e irritados com seus comentários profundamente misóginos e o tom agressivo, que consideramos sintomáticos de um preconceito entranhado.” A American Society of Cinematographers (ASC) rapidamente apoiou a carta da BSC, enquanto críticas adicionais surgiram da Canadian Society of Cinematographers (CSC), da Associação de Cinegrafistas do Brasil (ABC), da Society of Camera Operators e da Rede de Mulheres Cinematográficas, abrangendo a Alemanha, Áustria e Suíça.

A controvérsia paira sobre o Camerimage em um momento crucial, já que o festival está prestes a iniciar com a exibição do novo longa-metragem de Steve McQueen, *Blitz*, com a presença do diretor vencedor do Oscar. Espera-se que várias personalidades da indústria estejam presentes no evento, incluindo Cate Blanchett, que será a presidente do júri do concurso de 2024, e diversos diretores de fotografia cotados para o Oscar, como Greig Fraser (*Duna 2*), Jarin Blaschke (*Nosferatu*) e Alice Brooks (*Wicked*).

Não demorou para que Żydowicz respondesse às acusações levantadas, desferindo críticas à BSC em uma carta publicada no site do Camerimage. Ele afirmou: “Acredito realmente que as acusações feitas contra mim na declaração publicada no site da BSC são completamente errôneas e ofensas. Se essas acusações fossem verdadeiras, este festival simplesmente não existiria mais. O respeito pelos outros sempre foi minha prioridade, e continua a ser uma prioridade para nosso festival.” Żydowicz também assegurou que a equipe do festival está em diálogo com a Women in Cinematography para avaliar formas de colaboração que ajudem na evolução do festival.

Adicionalmente, Żydowicz revelou que eles elaboraram uma Política de Diversidade e Inclusão em conjunto com a organização, a qual pretendem lançar em breve. Entretanto, a resposta da Women in Cinematography não tardou em chegar, salientando que a própria fundação da organização foi inspirada pelas deficiências do Camerimage em apoiar adequadamente as mulheres no campo, ressaltando que “a exclusão histórica das mulheres no Camerimage é exatamente a razão pela qual a Women in Cinematography foi formada no início deste ano.” Além disso, a entidade advertiu que a programação recente do festival demonstra claramente como as cinegrafistas femininas foram negligenciadas.

A Women in Cinematography criticou a divulgação da Política de Diversidade e Inclusão formulada por eles, afirmando que ela foi publicada sem reconhecimento de sua origem e sem crédito às mulheres que trabalharam na sua criação. O grupo expressou seu contentamento por ver finalmente o compromisso de Żydowicz com o progresso, reiterando sua afeição pelo festival, e demandou um conjunto de compromissos que promovam maior transparência nos processos de seleção do evento.

Entre essas demandas estão a total transparência dos comitês de seleção, criação de um conselho consultivo para supervisionar a política de D&I, e cooperação extensiva com organizações que representam minorias no setor cinematográfico. “Esperamos que as iniciativas deste ano possam estabelecer as bases para um progresso significativo e duradouro, e acreditamos que o Camerimage irá se comprometer com esses princípios”, acrescentou a WIC.

O Festival Camerimage ocorrerá na histórica cidade de Toruń, na Polônia, entre os dias 16 e 23 de novembro, quando líderes da cinematografia se reunirão para celebrar a arte que une tantos através da tela, mas com a sombra de um debate crucial que chamará atenção não apenas para o evento, mas para todas as festividades e oportunidades que ainda necessitam de um olhar atento para a equidade de gênero nas artes.

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