A promessa do Presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, de promover uma agenda favorável ao bitcoin, parece ter injetado uma dose de otimismo no mercado de criptomoedas, que, em essência, foi criado com o objetivo de manter as mãos do governo longe das finanças pessoais. Este giro de 180 graus nas relações de Trump com o setor não apenas tem atraído a atenção dos investidores, mas também desafiado as ideologias que sustentam a própria essência do bitcoin. Assim, o que está ocorrendo agora nesse cenário paradoxal onde aqueles que uma vez foram críticos se tornam apoiadores fervorosos?
Nos últimos tempos, o preço do bitcoin, que é considerado o ativo digital original criado há 15 anos a partir de código de computador, disparou mais de 30% desde o dia da eleição. O valor atingiu um pico próximo a US$ 90.000, um aumento impressionante, especialmente considerando que o preço mais que dobrou desde o começo do ano. Alguns analistas até ousam prever que o bitcoin pode atingir a marca de US$ 100.000 até o final de 2024, acendendo ainda mais a esperança de muitos investidores que veem no ativo digital uma nova oportunidade de lucro. O que se observa é um movimento no mercado financeiro em geral, com o mercado de ações também se ressentindo do alívio proporcionado pela rapidez e determinação dos resultados das eleições nos Estados Unidos.
Nesse contexto, as expectativas em torno da agenda pró-cripto do futuro presidente têm gerado um clima de otimismo em relação ao futuro do mercado de criptomoedas. Faryar Shirzad, chefe de política da Coinbase, enfatizou que o movimento positivo que estamos presenciando é uma normalização das dinâmicas de mercado que há algum tempo foram reprimidas pelas adversidades políticas enfrentadas pelo setor. O último período de turbulência que envolveu a queda da exchange de criptomoedas FTX e a subsequente condenação de seu fundador, Sam Bankman-Fried, trouxe um maior escrutínio sobre o setor, que agora vê uma oportunidade de resiliência graças a um ambiente político mais favorável.
Trump, que em 2021 havia classificado o bitcoin como uma possível fraude, provocou uma reviravolta em sua postura ao fazer promessas durante uma conferência de bitcoin. As duas promessas mais notáveis feitas por Trump foram a demissão de Gary Gensler, presidente da Comissão de Valores Mobiliários (SEC), considerado um inimigo declarado da indústria, e a criação de uma reserva nacional de bitcoin, que impediria o governo de vender os ativos confiscados em processos criminais. Embora a primeira promessa possa ser considerada uma tentativa direta de agradar à comunidade cripto, a segunda levanta questões sobre a coerência da proposta, uma vez que a ideia de criar uma reserva governamental contrasta fortemente com os princípios de descentralização que o movimento cripto defende.
O discurso de Trump reascendeu debates sobre o verdadeiro papel do governo no mercado de criptomoedas. A proposta de criar uma reserva estratégica para o bitcoin, embora possa ser vista como uma forma de legitimar o ativo no cenário global, tem causado desconforto entre aqueles que acreditam na essência independente do bitcoin. Como a jornalista e crítica do setor, Molly White, destacou, essa iniciativa parece contradizer a ideologia que promove a descentralização e um governo mínimo dentro do espaço financeiro.
Enquanto isso, também há quem veja essa mudança como um sinal positivo. Alguns entusiastas do bitcoin podem estar dispostos a sacrificar parte da filosofia original se isso significar que os preços vão subir. Yesha Yadav, professora de Direito da Universidade de Vanderbilt, observa que a legitimização do bitcoin como classe de ativo globalmente significativa é uma enorme vitória simbólica para a indústria, que apenas dois anos atrás estava no seu ponto mais baixo.
Esse enredo intrigante de promessas e mudanças de postura nos faz refletir: até que ponto a política pode moldar o futuro das criptomoedas? Os ativos que surgiram como uma forma de desafiar as narrativas estabelecidas do sistema financeiro podem agora encontrar abrigo sob as asas de uma administração que, ironicamente, uma vez tratou essa moeda digital com desdém. Enquanto o otimismo se espalha entre os investidores, a questão persiste: a natureza do bitcoin realmente mudará sob esta nova liderança, ou seus fundamentos permanecerão intactos, resistindo às tentativas de controle governamental?