No universo das organizações autônomas descentralizadas (DAOs), o debate acerca de sua governança continua a evoluir, especialmente após eventos recentes que colocaram em destaque a vulnerabilidade desses modelos. Com a crescente adoção das DAOs e a interação intensa de grandes investidores conhecidos como “baleias”, muitos especialistas apontam que uma reavaliação dos sistemas de governança é necessária. Um exemplo notável ocorreu com a plataforma de empréstimos Compound, onde um grupo de investidores utilizou sua influência para realizar o que foi descrito como um ataque de governança. Este episódio destacou a fragilidade do sistema atual de governança nas DAOs, que normalmente adota um modelo de “um token, um voto”, contrastando com estruturas de governança mais robustas, como a implementada pela Meta de Mark Zuckerberg.

No modelo de Mark Zuckerberg, a Meta possui uma estrutura de ações de múltiplas classes, onde as ações da Classe B, detidas por insiders, têm mais peso de voto do que as ações da Classe A, disponíveis ao público. Isso garante que Zuckerberg mantenha aproximadamente 58% do controle de votação na empresa, protegendo a companhia de ataques de governança que são, em muitos casos, inevitáveis no mundo das DAOs. Quando um investidor de grande porte, conhecido como Humpy, e seu grupo “GoldenBoys” se uniram para alocar US$ 24 milhões em tokens COMP em um protocolo de rendimento, a situação levantou questões sérias sobre a eficácia das práticas de governança em DAOs. Apesar de algumas afirmações considerarem o ataque um resultado da apatia dos votantes, outros apontam que o problema está na modelagem em si das DAOs.

Michael Lewellen, do OpenZeppelin, uma empresa de auditoria de segurança, expressou no evento Devcon que a fragilidade no modelo de governança das DAOs torna-as suscetíveis a esses tipos de ataques. Segundo ele, enquanto a descentralização é um princípio essencial para a tecnologia de blockchain, sua aplicação na governança é muito mais complexa. Ele argumenta que mais vozes não são necessariamente melhores se a maioria não está alinhada ou informada sobre os objetivos da DAO. A iniciativa de conhecer seu cliente (KYC) é uma proposta que pode transformar a governança da DAO, permitindo que a verdadeira identidade dos votantes seja verificada sem comprometer a anonimidade.

Essas medidas, de acordo com Lewellen, poderiam prevenir situações em que indivíduos criam perfis múltiplos para manipular o processo de governança. “Se alguém possui um poder de governança significativo, deveria ser transparente sobre isso”, defende Lewellen. “As pessoas devem ter a oportunidade de compreender a natureza da influência exercida e ter os meios de contrabalançá-la.” Assim, à medida que a indústria avança, exercícios de modelagem de ameaças, ou “wargaming”, se tornam essenciais para antecipar possíveis cenários danosos. Questões críticas ainda permanecem: o que fazer se um ator mal-intencionado obtiver um poder de votação significativo? Como podemos reagir no ambiente digital? Essas são questões que necessitam ser respondidas com urgência.

A apatia no engajamento dos votantes é uma barreira considerável e variável nas DAOs, muitas vezes resultando em baixíssimos índices de participação. Portanto, uma solução eficaz pende pela necessidade de incentivar um comportamento participativo mais assertivo. DAOs precisam adotar modelos de governança que priorizem a qualidade da tomada de decisão ao invés da quantidade, garantindo que as decisões críticas sobre fundos e segurança dos protocolos sejam avaliadas adequadamente e não fiquem sob a responsabilidade apenas de quem detém a maior quantidade de tokens. Como sugere Lewellen, “é imprescindível que ofereçamos motivos para que os detentores dos tokens sejam administradores responsáveis do protocolo”. Recompensar a participação ativa pode assegurar que as decisões de governança sejam tomadas por partes interessadas informadas e engajadas, estabelecendo um ciclo de excelência na gestão das DAOs.

Vislumbrando um futuro ideal, modelos de governança de DAOs que movimentam bilhões de dólares deveriam ser estruturados de maneira mais similar à da Meta, garantindo não apenas uma governança engajada, mas também segura e sustentável ao longo do tempo. “Precisamos de sistemas de governança que reflitam essa realidade, equilibrando a descentralização com salvaguardas que garantam a sustentabilidade a longo prazo”, finalizou Lewellen, deixamos no ar a pergunta: será que as DAOs conseguirão adotar esse novo modelo de governança, ou correrão o risco de se tornarem mais vulneráveis a ataques no futuro?

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