Em 2023, o cinema europeu atingiu um marco crítico impressionante, com diversas produções concorrendo e se destacando nas principais premiações do setor, incluindo o Oscar. Filmes como o musical de crime Emilia Pérez de Jacques Audiard, o thriller papal Conclave de Edward Berger, e o drama de final de vida The Room Next Door de Pedro Almodóvar, figuram atualmente entre os favoritos para receber grandes reconhecimentos. Essa temporada é uma celebração do talento e da inovação que o cinema europeu tem a oferecer, mostrando que os realizadores europeus continuam a quebrar barreiras criativas e a desferir impactos significativos no cenário internacional.
Por outro lado, as perspectivas comerciais desse mesmo cinema não são tão brilhantes. A recente publicação do Observatório Audiovisual Europeu (EAO) apresentou um quadro desolador sobre o desempenho global das produções europeias, confirmando que, apesar da aclamação crítica, as bilheteiras enfrentam desafios severos. O EAO observa que os filmes europeus conseguiram apenas 6% das vendas de ingressos no mercado mundial em 2023, um contraste agudo em relação aos 56% dos filmes estadunidenses e 26% dos filmes chineses, evidenciando uma queda dramática na participação de mercado.
As admistrações para o cinema europeu totalizaram 239 milhões no ano anterior, uma leve alta de 2,7% em relação a 2022, mas ainda assim esta cifra permanece 35% abaixo da média prepandêmica de 367 milhões, que ocorreu entre 2014 e 2019. A tendência se torna ainda mais preocupante ao observar que o número de ingressos vendidos em mercados-chave como os Estados Unidos e a China estão despencando. Nos EUA, as admissões para filmes europeus caíram drásticamente de 33 milhões em 2015 para meros 4,8 milhões no ano passado. Na China, os números também não são promissores, despencando de 35 milhões em 2017 para apenas 1,3 milhão de ingressos em 2023.
Além disso, o relatório do EAO reforça que os filmes blockbusters europeus, definidos como aqueles que vendem mais de 1 milhão de ingressos, estão se tornando uma “espécie em extinção”. O número de títulos que conseguem alcançar essa marca caiu 43% em comparação aos anos anteriores à pandemia, o que representa um sério risco para o futuro econômico do cinema europeu.
Curiosamente, a produção de filmes na Europa não está diminuindo; na verdade, observou-se um aumento na produção, com 3.349 filmes europeus circulando em 2023, um incremento de 7,8% em relação ao ano anterior, superando 52% do total de filmes em circulação mundial. Mas a disparidade entre a oferta e a demanda é claramente observada, principalmente devido ao forte apoio governamental que muitos desses projetos recebem por meio de subsídios e incentivos fiscais, assegurando que o cinema europeu seja sustentado, mesmo enquanto os públicos em salas de cinema continuam a encolher.
Matthijs Wouter Knol, CEO da Academia Europeia de Cinema, enfatiza que o mercado teatral europeu está em uma encruzilhada. Ele observa que a estrutura fragmentada da distribuição de filmes na Europa, onde as obras são lançadas em momentos diferentes em países diversos e muitas vezes com estratégias de marketing distintos, não se adequa mais à era digital atual, onde as barreiras não existem. “Precisamos convencer os distribuidores a quebrar os velhos hábitos. O mundo à nossa volta está mudando, e as expectativas do público também estão mudando muito rapidamente”, declarou Knol em entrevista.
Ele também ressalta o sucesso de lançamentos pan-europeus sincronizados, como The Triangle of Sadness, que acumulou 3 milhões de ingressos em todo o mundo, e Anatomy of a Fall, ganhador do Oscar, com 2,4 milhões de admissões, como um indicativo de que a colaboração além-fronteiras deve ser o futuro do cinema europeu. Knol conclui que “o cinema europeu tem a oferecer algumas das histórias e dos talentos mais originais e atraentes do mundo atualmente”.
Portanto, enquanto o cinema europeu se destaca em críticas e prêmios, é essencial que encontre soluções para os seus problemas comerciais. O futuro desse cinema pode depender de sua capacidade de inovar na maneira como é distribuído e promovido, se adaptando a um mercado em evolução e às novas preferências dos consumidores. À medida que este diálogo e essa evolução acontecem, as audiências esperam ansiosamente para ver como o cinema europeu se reimaginará e se revitalizará nos próximos anos.