A coroação do Rei Charles III e da Rainha Camilla, realizada em maio do ano passado, não foi apenas um evento marcante na história da monarquia britânica, mas também um dos assuntos mais debatidos entre os cidadãos, levando a questionamentos sobre gastos em tempos de crise. Com um custo total de £72 milhões (aproximadamente $91 milhões), a cerimônia se tornou alvo de críticas por muitos que consideraram essa quantia excessiva diante da atual crise de custo de vida no Reino Unido. Enquanto os cidadãos enfrentam desafios financeiros significativos, a ostentação de tal evento levantou uma série de discussões sobre prioridades orçamentárias e o papel da monarquia na sociedade contemporânea.
De acordo com o Departamento de Cultura, Mídia e Esporte, que divulgou suas contas anuais na última quinta-feira, mais de £50 milhões ($63 milhões) foram gastos para coordenar o evento, que foi descrito como “uma vez na vida”. Além disso, o Ministério do Interior investiu quase £22 milhões ($28 milhões) em segurança para a ocasião. Este desdobramento financeiro ocorreu em um contexto onde, segundo dados recentes, pelo menos 40% da população do Reino Unido relatou dificuldades em pagar contas de energia e alimentação, acentuando ainda mais a sensação de desconforto e descontentamento público em relação aos gastos reais da monarquia.
Este marco na história britânica foi o primeiro coroação desde que a Rainha Elizabeth II subiu ao trono em 1953. O evento, que atraiu uma audiência global de aproximadamente 2 bilhões de pessoas em 125 países, é frequentemente defendido por entusiastas da monarquia que argumentam que eventos desta magnitude podem impulsionar o turismo e os gastos dos consumidores.
No entanto, muitos questionaram a sensibilidade de realizar um espetáculo tão grandioso em um momento em que milhões de britânicos estavam lutando para colocar comida na mesa. O governo do país continua a lutar contra uma crise de custo de vida iniciada em 2021, que trouxe consigo aumentos acentuados nos preços de energia e alimentos. “Pilhas de problemas estão se acumulando para muitos, e, honestamente, não é ético para os royals gastar essa quantia em uma parada quando crianças vão à escola sem refeições”, afirmou Graham Smith, executivo da República, um grupo ativista que defende o fim da monarquia britânica.
A cifra investida na coroação de £72 milhões poderia ter alimentado 24 milhões de crianças em Londres, considerando o custo médio de £3,00 ($3,75) por refeição do atual orçamento da cidade. Este programa de refeições visa aliviar as pressões financeiras sobre as famílias e garantir que as crianças não passem fome durante o horário escolar.
O financiamento da coroação e o papel da família real
A família real também contribuiu para os custos do evento, com cerca de £800.000 ($1 milhão) provenientes da Grant Sovereign, que é uma porcentagem dos lucros do Crown Estate. Este patrimônio colossal é estimado em cerca de £15,5 bilhões ($19 bilhões) e fornece a maior parte de seus lucros ao governo britânico anualmente. Além disso, uma parte do gasto foi coberta pelo Privy Purse, a fonte de renda privada do monarca, que gera a maior parte de sua receita a partir de um portfólio de terras e propriedades conhecido como Duchy of Lancaster, avaliado em cerca de £648 milhões ($811 milhões).
Em resposta às duras críticas sobre os custos elevados, uma fonte real comentou que os “planos foram reduzidos”, citando a necessidade de equilibrar a importância de uma ocasião histórica com a realidade econômica do momento. Isso gerou um desfile de carro de ouro mais curto do que o realizado para a Rainha Elizabeth II e menos convidados foram convocados para a cerimônia principal na Abadia de Westminster, onde a coroação ocorreu. Além disso, segundo os relatórios do departamento cultural, o orçamento do evento foi subestimado em £2,8 milhões ($3,5 milhões), demonstrando um certo esforço para minimizar os custos.
Esses acontecimentos mostram não apenas as tradições enraizadas na monarquia britânica, mas também a crescente pressão sobre a instituição para se adaptar a um contexto social em crise. As discussões em torno dos gastos com a coroação de Rei Charles III ressaltam a complexidade da relação entre a monarquia e o povo britânico, trazendo à tona a necessidade de um debate mais amplo sobre como as tradições podem coexistir com as realidades contemporâneas de uma nação que ainda busca estabilidade financeira.
Assim, além das festividades e da celebração, as reflexões e críticas sobre os gastos demonstram que a monarquia ainda pode ter um caminho trabalhoso a trilhar, especialmente quando se trata de se conectar com um público em transição, que anseia por um futuro mais sustentável e que prioriza o bem-estar coletivo acima de todo o glamour real.