Durante anos, pescadores e autoridades norte-americanas têm levantado preocupações sobre a pesca ilegal do peixe-vermelho no Golfo do México, mas um recente anúncio do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos trouxe à tona uma realidade alarmante. A descoberta de que um cartel de drogas mexicano está por trás deste comércio ilícito tem causado indignação e espanto em diversas esferas, expondo uma intersecção inesperada entre crimes ambientais e atividades de tráfico.
Na última terça-feira, o Tesouro dos EUA anunciou sanções contra membros do cartel do Golfo, que opera nas cidades fronteiriças de Reynosa e Matamoros, nas proximidades das cidades texanas de McAllen e Brownsville. Essas sanções foram impostas a indivíduos diretamente envolvidos na captura ilegal e comercialização do peixe-vermelho, uma espécie altamente valorizada no mercado. Embora pareça inusitado associar o comércio de peixes a organizações criminosas, a realidade é que tais associações são uma estratégia de diversificação para os cartéis.
O departamento informou que o cartel utiliza barcos pesqueiros não apenas para a captura de peixe, mas como uma ferramenta facilitadora para o contrabando de drogas e imigrantes. Os barcos frequentemente partem da Playa Bagdad, localizada a leste de Matamoros, e na travessia, capturam toneladas de peixe-vermelho, que após são vendidas em cidades fronteiriças do México e, em algumas ocasiões, contrabandeadas para o mercado norte-americano.
A situação torna-se ainda mais alarmante quando se considera que enquanto os pescadores nos EUA são obrigados a cumprir restrições sazonais rigorosas e fechar a pesca para proteger as populações de peixes, os pescadores mexicanos, com a conivência de cartéis, não estão sujeitos a essas mesmas regras. O Departamento do Tesouro afirmou que a pesca de espécies como o peixe-vermelho e tubarões nos EUA é rigidamente controlada, o que os torna mais abundantes em águas americanas. Como resultado, as embarcações mexicanas cruzam a linha marítima e pescam em águas protegidas.
As consequências dessa pesca ilegal não se limitam apenas à sobre-exploração das populações de peixe, mas também à morte de outras espécies marinhas, que frequentemente ficam presas nas linhas de anzois utilizadas pelos barcos. O impacto ambiental dessa prática é preocupante, pois além de ameaçar a biodiversidade, provoca um ciclo vicioso que pode afetar a saúde dos ecossistemas marinhos. Os dados também indicam que barcos mexicanos são frequentemente apreendidos pela Guarda Costeira dos EUA, evidenciando a gravidade da situação e a continuidade das infrações.
Em uma análise mais ampla, as sanções anunciadas pela Tesouraria são uma resposta à crescente preocupação com as atividades dos cartéis de drogas não apenas em sua operação tradicional de tráfico, mas também em outras áreas de exploração ilegal. As sanções impostas na última semana incluem cinco indivíduos identificados como associados ao cartel, trazendo à tona não só suas atividades pesqueiras, mas sublinhando a natureza multifacetada da criminalidade organizada. As medidas contra o cartel do Golfo refletem uma tendência crescente dos EUA de se tornarem mais agressivos em suas ações contra esses grupos, que têm expandido suas operações muitas vezes para além do tráfico de drogas.
A história da pesca ilegal e seu impacto ambiental
Não é a primeira vez que cartéis estão envolvidos em atividades de pesca ilegal no México. Especialistas apontam que outros grupos criminosos também têm seu envolvimento em práticas de pesca proibida, como a pesca com redes gillnet para capturar a totoaba no Golfo da Califórnia, uma atividade que ameaça a vaquita marina, o mamífero marinho mais ameaçado do mundo. As medidas atuais se baseiam em um histórico de negligência e ineficácia por parte do governo mexicano em conter tais infrações, levando o governo dos EUA a proibir a entrada de embarcações pesqueiras mexicanas em portos dos EUA. Essa postura culminou em 2022, quando as autoridades norte-americanas decidiram impedir totalmente a entrada de barcos de pesca mexicanos nas águas e portos americanos, alegando que o governo mexicano não estava fazendo o suficiente para coibir a pesca ilegal.
Ainda mais alarmante é o fato de que, em 2018, os EUA importaram quase cinco toneladas de peixe-vermelho do México, levantando preocupações sobre a possível inclusão de peixes que poderiam ter sido capturados ilegalmente em águas americanas. A pesca indiscriminada de espécies marinhas com o uso de anzóis e redes não apenas estressa as populações de peixe, mas também coloca em risco a sobrevivência de outras espécies marinhas.
A ação dos EUA contra cartéis ganha força
Recentemente, as ações do governo dos EUA contra cartéis de drogas e suas operações ilícitas se intensificaram. Nos últimos meses, o Tesouro dos EUA impôs sanções a cartéis envolvidos em atividades variadas, desde tráfico de drogas até fraudes e roubo de combustíveis. Em outubro passado, autoridades americanas sancionaram membros seniores de um cartel que possuem forte presença nas áreas de fronteira de Chihuahua, México, destacando a crescente seriedade com que os EUA abordam a criminalidade organizada. Essas sanções não apenas visam interromper o ciclo de violência e crime, mas também têm um foco claro em intervir em economias ilícitas que se alimentam à custa da integridade ambiental e da segurança pública.
Diante do exposto, fica claro que as atividades dos cartéis de drogas se estendem muito além do que se pensava inicialmente, revelando um quadro que abrange não somente o tráfico de substâncias, mas também uma gama de atividades que ameaçam ambientes sustentáveis e a saúde do ecossistema marinho. Essa situação exige uma atenção contínua e medidas eficazes das autoridades, tanto nos EUA quanto no México, para proteger recursos naturais cruciais e combater esta forma insidiosa de crime organizado. Diante de tal evidência, a interdependência entre as políticas de combate ao narcotráfico e a preservação ambiental torna-se inegável, destacando a necessidade de uma abordagem holística que contemple ambas as questões.