Desafios da limpeza na usina nuclear e inovações tecnológicas

Em 2011, o mundo parou para assistir ao desdobrar de uma das maiores tragédias nucleares da história, quando a usina nuclear Fukushima Daiichi, no Japão, sofreu uma falha catastrófica em seus sistemas de refrigeração, desencadeada por um terremoto de magnitude 9.0 seguido de um tsunami devastador. O evento resultou em um derretimento do núcleo do reator, que liberouemissão de materiais radioativos em múltiplas direções, caracterizando-se como uma das piores catástrofes ligadas à energia nuclear até os dias atuais. Passados mais de dez anos, o processo de limpeza continua em andamento, e uma nova iniciativa promete trazer esperança para a descontaminação da área. No mês passado, o governo japonês iniciou um procedimento de testes para remoção de detritos radioativos nas imediações da usina, marcando um passo significativo no processo de descomissionamento da planta, previsto para ser concluído até 2051. Nesse contexto, uma startup inovadora, a Ookuma Diamond Device (ODD), está desempenhando um papel fundamental usando chips de diamante para auxiliar esses esforços de descontaminação através de amplificadores movidos a chips de diamante. Recentemente, a ODD conseguiu captar 4 bilhões de ienes, equivalentes a aproximadamente US$ 27 milhões, para a construção da primeira instalação de fabricação de semicondutores de diamante do mundo na cidade de Ookuma, localizada nas proximidades da usina de Fukushima. A previsão é que a fábrica comece a ser construída em janeiro de 2025 e inicie suas operações no verão de 2026.

Vantagens dos semicondutores de diamante em comparação aos tradicionais

Mas por que optar por chips de diamante ao invés dos semicondutores de silício tradicionais? O diamante é reconhecido como um material semicondutor de larga banda, similar ao carbeto de silício (SiC) e ao nitreto de gálio (GaN). Os materiais de larga banda são considerados superiores em termos de eficiência na conversão de energia e gerenciamento térmico excepcional. Diferentemente dos processadores baseados em silício, que operam como fontes de eletricidade, os chips de diamante funcionam mais como dispositivos de controle potentes, conforme declarado por Ken Nishimura, parceiro da Coral Capital. Ele explicou que os semicondutores de diamante são especialmente projetados para atender às exigências de grandes instalações, como usinas nucleares, que precisam suportar altas temperaturas e níveis de radiação, algo que os chips de silício não conseguem fazer de forma eficaz. Prototótipos de amplificadores de semicondutores de diamante que operam a temperaturas de até 300°C foram desenvolvidos com sucesso, utilizando as instalações do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Industrial Avançada (AIST) e da Universidade de Hokkaido.

O CFO da ODD, Yuhei Nagai, ressaltou em uma entrevista exclusiva que os semicondutores de diamante que a empresa desenvolve são fundamentalmente diferentes dos chips tradicionais de silício, devido às suas propriedades superiores. Comparado a outros semicondutores avançados como SiC e GaN, os semicondutores de diamante apresentam eficiência de conversão de energia superior e um gerenciamento térmico aprimorado para as tecnologias de próxima geração, incluindo 6G, espaço, defesa e aplicações nucleares. Um aspecto notável é que os chips de diamante podem ser fabricados a partir de gás metano, o que potencialmente permite a produção total no Japão. Isso contrasta com o GaN, que depende fortemente de materiais controlados pela China. O foco estratégico da ODD é o desenvolvimento de “semicondutores de diamante puros”, em oposição a semicondutores GaN em substratos de diamante, conforme esclareceu Nagai. O tamanho do mercado para materiais de diamante utilizados em chips deverá crescer para US$ 10 bilhões até 2032, um aumento significativo em relação aos US$ 113,7 milhões de 2023, segundo um recente relatório do setor.

A ODD, que surgiu como um desdobramento do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Industrial Avançada (AIST) e da Universidade de Hokkaido, foi especificamente fundada em 2021 com o objetivo de auxiliar no descomissionamento da usina nuclear Fukushima Daiichi. Os cofundadores, Dr. Junichi Kaneko e Dr. Hitoshi Umezawa, têm mais de 20 anos de pesquisa em chips de diamante e encontraram suas pesquisas sendo colocadas em evidência após o desastre, o que levou a um aumento significativo nos recursos disponíveis para P&D e à fundação da startup. Em 2021, a ODD fabricou o primeiro chip de diamante prático do mundo. Apesar do progresso, ainda existem muitas etapas a serem superadas entre a teoria, a produção de chips e o produto final. Os cofundadores também lideram um projeto nacional mais amplo do governo japonês, que visa desenvolver um produto capaz de remover detritos radioativos de desastres naturais. Nagai descreveu os protótipos da ODD como uma conquista inédita no mundo, uma vez que nenhuma outra empresa conseguiu até o momento desenvolver amplificadores semicondutores de diamante em funcionamento. Além da ODD, um pequeno número de empresas globais, como a Diamfab na França, a Element Six no Reino Unido e a A.L.M.T. no Japão, uma subsidiária da Sumitomo Electric Industries, também estão trabalhando na área dos semicondutores de diamante. A ODD se diferencia ao afirmar ser a única empresa com expertise completa, que abrange desde o substrato até o embalamento, possibilitando a criação do protótipo mundial de um amplificador semicondutor de diamante.

Perspectivas futuras e captação de recursos

A startup está em diálogo com mais de 10 clientes potenciais ao redor do mundo, nas indústrias de energia nuclear, aeroespacial e telecomunicações, um segmento que ganhou nova atenção recentemente, após a divulgação de um acordo entre o Google e um consórcio de empresas para desenvolver parcerias que utilizem energia nuclear para alimentar centros de dados. O financiamento recente foi liderado pela Globis Capital, elevando o total arrecadado pela empresa para aproximadamente US$ 45 milhões (6,7 bilhões de ienes) desde sua fundação, com a participação de investidores como Coral Capital, aSTART, Green Co-Invest Investment, o Fundo de Inovação Regional do Japan Post Bank, o capital de risco Mitsui Sumitomo Insurance, SMBC Venture Capital, entre outros. Atualmente, a ODD conta com 27 funcionários e já recebeu cerca de US$ 15 milhões em subsídios do governo japonês, incluídos na lista das agências participantes como o Gabinete do Primeiro Ministro, Ministério da Economia, Comércio e Indústria, Ministério das Comunicações e Agência de Reconstrução.

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