Nos Estados Unidos, milhões de toneladas de cinzas de carvão, resultado da queima deste combustível fóssil, estão armazenadas em fossas e aterros, apresentando riscos à contaminação de corpos d’água e solos. Contudo, uma pesquisa recente revela que este resíduo tóxico pode se transformar em um verdadeiro tesouro de elementos raros, essenciais para o avanço das tecnologias de energia limpa. A análise das cinzas de carvão de usinas de energia revela um potencial significativo para uma fonte doméstica de elementos raros sem a necessidade de novas atividades de mineração.
De acordo com um estudo conduzido pela Universidade do Texas em Austin, as cinzas de carvão podem conter até 11 milhões de toneladas de elementos de terras raras, quase oito vezes a quantidade atualmente registrada nas reservas domésticas dos Estados Unidos, com um valor estimado em aproximadamente 8,4 bilhões de dólares. A autora da pesquisa, Bridget Scanlon, destaca que a recuperação desses materiais não apenas promove uma utilização mais eficiente dos resíduos, mas também se coaduna com o conceito de “transformar lixo em tesouro” na busca por soluções sustentáveis.
Os elementos de terras raras, que incluem metais como escândio, neodímio e itérbio, desempenham um papel vital nas tecnologias de energia limpa, sendo essenciais na produção de veículos elétricos, painéis solares e turbinas eólicas. Apesar de seu nome, esses metais não são raros na natureza; no entanto, sua extração e purificação são desafiadoras e, frequentemente, caras, levando a uma demanda que supera sua oferta atualmente disponível.
Com o crescente movimento global em direção à eliminação do uso de combustíveis fósseis, a necessidade por esses elementos aumentará. A Agência Internacional de Energia prevê que a demanda por terras raras pode crescer até sete vezes até 2040. Em contrapartida, o suprimento disponível nos Estados Unidos é mínimo, com apenas a mina de Mountain Pass, na Califórnia, operando em escala significativa. Atualmente, mais de 95% dos elementos de terras raras consumidos no país são importados, principalmente da China, o que gera preocupações sobre a segurança e a estabilidade da cadeia de suprimentos.
Bridget Scanlon enfatiza a urgência de melhorar a situação, convocando a exploração de fontes não convencionais de elementos raros, como os resíduos de carvão. Embora as cinzas de carvão possuam concentrações relativamente baixas desses elementos, elas estão amplamente disponíveis, com cerca de 70 milhões de toneladas geradas anualmente nos Estados Unidos. “Estamos diante de grandes volumes desse material em todo o país. O processo inicial de extração já foi realizado, facilitando a coleta”, complementa Davin Bagdonas, coautor do estudo e pesquisador da Universidade de Wyoming.
A pesquisa ainda destaca que a localização da origem do carvão determina a viabilidade da extração dos elementos raros. As cinzas provenientes da bacia Appalachian possuem as maiores concentrações de elementos, mas apenas 30% podem ser extraídos. Em contrapartida, as cinzas da bacia do Powder River, que abrange Wyoming e Montana, apresentam menor concentração média, mas permitem a extração de mais de 70% dos elementos. Elisabeth Ziemkiewicz, diretor do Water Research Institute da Universidade da Virgínia Ocidental, adverte que o processo de extração pode incorrer em altos custos, sendo necessário avaliar a relação entre o custo da mineração e a quantidade recuperável.
A necessidade de ácidos e bases fortes para a extração dos elementos representa um desafio adicional, uma vez que estes produtos químicos são caros e sua quantidade e composição nas cinzas de carvão podem aumentar os custos, uma vez que a alcalinidade pode interferir na neutralização do ácido. Por outro lado, cabe ressaltar que a extração de elementos raros representa apenas uma fração do volume total das cinzas de carvão, que por sua vez contêm contaminantes como mercúrio, arsênio e chumbo, tornando o manejo deste resíduo uma tarefa de risco elevado.
Os autores do estudo são otimistas em relação ao potencial econômico que a extração de metais raros pode representar, ressaltando que tal atividade poderia financiar melhorias nas práticas de armazenamento e manejo das cinzas de carvão. Recentemente, a administração Biden anunciou um investimento de 17,5 milhões de dólares em projetos voltados para a recuperação de elementos raros a partir do carvão e de seus resíduos, conforme destacou a secretária de Energia, Jennifer Granholm, que afirma que isso não apenas reforçará a segurança nacional, mas também ajudará a revitalizar o setor de manufatura e as comunidades impactadas pela indústria de energia e mineração.
Embora existam preocupações de que transformar cinzas de carvão em um recurso valioso possa incentivar uma maior dependência do carvão, Bridget Scanlon assegura que a maioria das cinzas utilizadas será de resíduos já gerados, com mais de 2 bilhões de toneladas armazenadas atualmente nos Estados Unidos. A busca por métodos que permitam extrair produtos de value do carvão, além dos elementos raros, será fundamental para evitar a queima deste combustível, visando um desenvolvimento mais sustentável.
Assim, a descoberta de que as cinzas de carvão contêm uma abundância de elementos de terras raras não apenas oferece uma nova perspectiva sobre a gestão de resíduos nocivos, mas também pode ser um passo crucial na direção de um futuro energicamente sustentável, reforçando a importância de métodos inovadores na recuperação de materiais essenciais para a transição energética.