A pandemia de COVID-19 trouxe à tona uma série de desafios não apenas no que diz respeito à infecção e recuperação imediata, mas também às consequências de saúde que persistem após a fase aguda da doença. Entre os diversos sintomas reportados por indivíduos que enfrentam o Long COVID, um dos mais curiosos e preocupantes é a sede excessiva. Este fenômeno pode se manifestar de formas surpreendentes, como um aumento significativo na sensação de sede, que pode durar mais tempo do que o normal e, paradoxalmente, pode não ser aliviado pela ingestão de água, que deveria ser a solução mais natural para amenizar a desidratação.
O Dr. Stuart Katz, cardiologista e professor no Departamento de Terapias Cardíacas Avançadas da New York University Grossman School of Medicine, teve uma experiência pessoal com os efeitos do Long COVID, que perduraram por quase um ano após sua infecção inicial pelo SARS-CoV-2 em dezembro de 2020. Ele relata que, desde então, passou a enfrentar sintomas de sede exacerbada, o que, junto a outros sinais da condição, afetou consideravelmente sua qualidade de vida. Essa situação é compartilhada por um número crescente de pacientes, conforme revela um estudo de 2023 publicado na revista JAMA, onde a sede excessiva foi identificada como uma das doze manifestações mais comuns entre aqueles diagnosticados com Long COVID.
Esse estudo é parte da iniciativa Researching COVID to Enhance Recovery (RECOVER), promovida pelos National Institutes of Health (NIH), que analisou dados auto-referidos de aproximadamente 10.000 pessoas em 85 locais ao longo de 33 estados norte-americanos, além de Washington, D.C. e Porto Rico. Os cientistas descobriram que 40% desses indivíduos relataram problemas de sede, o que indica que essa pode ser uma realidade para um número significativo da população afetada.
Ainda não se compreendem completamente os processos fisiológicos que levam à sede excessiva nos pacientes de Long COVID. Uma das hipóteses, proposta pelo Dr. Katz, sugere que o hormônio angiotensina II, conhecido por estimular a sede, pode exercer um papel crucial nesse fenômeno. A maneira como o SARS-CoV-2 invade as células, através de um receptor que também interage com a angiotensina II, pode estar interligada ao sintoma persistente de sede em pacientes com Long COVID. No entanto, mais pesquisas são necessárias para estabelecermos uma conexão sólida entre esses fatores.
No panorama atual, não existem tratamentos definitivos para a sede excessiva entre os indivíduos afetados pelo Long COVID. Apesar de em alguns casos essa sensação se resolver espontaneamente com o tempo, o Dr. Katz alerta que a ingestão excessiva de água pode acarretar riscos, como a produção excessiva de urina e a diminuição dos níveis de sódio no sangue. Como alternativa, o especialista recomenda o uso de gelo ou balas para ajudar a amenizar a sede, estratégias que já beneficaram alguns de seus pacientes com insuficiência cardíaca, uma condição frequentemente associada à sensação de sede excessiva.
O Dr. Katz utiliza sua experiência pessoal para alimentar sua busca por respostas. Ele ressalta: “Minha vivência com o Long COVID está recente na minha memória. Isso me motiva a concluir as pesquisas do RECOVER na esperança de entender melhor o que aconteceu comigo e como podemos ajudar milhões de pacientes que ainda sofrem com os sintomas do Long COVID.”
Em uma perspectiva mais ampla sobre as motivações humanas, a doutora Lisa Sanders, MD, destaca que a sede é uma das motivações mais intensas, até mesmo superando a fome. Os especialistas em sobrevivência na natureza referem-se à “regra de 3”, que estabelece que um ser humano consegue viver por 3 minutos sem ar, 3 dias sem água e 3 semanas sem alimento. Tal conceito sublinha a importância vital da água, e o fato de que a sede excessiva seja um sintoma de Long COVID só reforça a ideia de quão amplas são as implicações que o vírus pode ter sobre o corpo humano.
No ano passado, pesquisadores propuseram um conjunto de doze sintomas-chave que podem servir como indicativos ou até mesmo diagnósticos de Long COVID. Essa ferramenta, embora não deva ser usada para diagnósticos clínicos, permitiu que os pesquisadores atribuíssem um valor a cada sintoma conforme sua frequência. Com isso, a probabilidade de um paciente apresentar Long COVID é considerada mais alta entre aqueles que somam 12 pontos ao contabilizar todos os sintomas. A lista de sintomas inclui, entre outros, a perda de olfato ou paladar, cansaço, e, claro, a sede excessiva, que é um dos doze sintomas mais prevalentes na população afetada.
Portanto, a sede excessiva em pacientes de Long COVID é um sintoma que demonstra a complexidade e a natureza multifacetada do impacto do SARS-CoV-2 no organismo. Deve ser considerado não apenas em pesquisas clínicas, mas também no atendimento a pacientes que ainda lidam com os efeitos duradouros da COVID-19.
Se você gostaria de compartilhar sua experiência com Long COVID, pode enviar um e-mail para [email protected]. As informações fornecidas têm caráter informativo e não devem substituir a consulta a um médico ou profissional qualificado. Sempre busque orientação individual de seu prestador de serviços de saúde em relação a qualquer dúvida que você tenha sobre sua condição de saúde.