Damascus – A capital da Síria vivenciou um dia de incertezas e esperanças na última terça-feira, quando o país começava a se ajustar à nova realidade política após a dramática ofensiva rebelde que resultou na queda do longo regime do ditador Bashar al-Assad, no último domingo. Enquanto a antiga facção da al-Qaeda que liderou a ofensiva assumiu posições de destaque em um governo transitório autodeclarado, muitos sírios pareciam determinados a retomar suas rotinas cotidianas, buscando um semblante de normalidade em meio ao caos.
Instituições, como o banco central da Síria, convocaram funcionários a comparecer ao trabalho, evidenciando uma tentativa de manter a ordem em um cenário repleto de incertezas sobre o futuro do país. A adesão à rotina diária pareceu ser a estratégia mais segura, uma forma de resiliência frente à transição política imprevisível e conturbada.
Para apaziguar os ânimos e a ansiedade generalizada, o político Mohamed al-Bashir, que já havia liderado a administração local nas regiões do noroeste da Síria e em Idlib, sob o controle do Hayat Tahrir al-Sham, foi nomeado primeiro-ministro interino por três meses. Seu papel será crucial neste período decisivo, enquanto a população busca se estabilizar e reconstruir um país que há anos é devastado pela guerra e pela opressão.
O ambiente em Damasco, embora permeado por uma nervosa expectativa, também transparecia um entusiasmo palpável. A capital, que até domingo passado era o centro do domínio brutal da família Assad por mais de cinquenta anos, viu suas ruas serem invadidas por multidões que queriam contemplar as mansões do antigo ditador e conhecer os combatentes islâmicos que trouxeram mudanças significativas à cidade. A atmosfera era quase festiva, uma celebração não apenas da queda de um regime temido, mas da esperança pela reconstrução de uma nação unida.
As forças rebeldes, que realizavam patrulhas nas ruas, adotaram uma postura amistosa, permitindo que cidadãos comuns portassem suas armas para fotos, encapsulando o momento tanto de vitória quanto de incerteza. “É uma celebração para todos nós, para todos os sírios: aqui e em todo o mundo”, comentou Lina Zacchar, uma das muitas sírias presentes no local. “Minha mãe é cristã, então ela está com medo. Mas estamos prometendo… esperamos por uma nova Síria. Somos todos irmãos, somos todos irmãs, somos todos um! Somos sírios!”
No ícone da antiga regime, o palácio presidencial, a população caminhava pelos vastos salões cerimoniais onde os Assads costumavam receber dignitários. O acesso a esse espaço, que antes parecia fora de alcance, agora estava desmistificado, com suas portas abertas. CBS News encontrou o palácio vigiado por um soldado rebelde chamado Ahmed, que havia quase perdido a vida enfrentando as forças de Assad nove anos antes. “Fui pessoalmente alvo e fui ferido em um ataque em 2015 em nossa casa. Meus parentes estão detidos e não sei seu destino”, confidenciou Ahmed à CBS News na segunda-feira. “Eles podem estar nas prisões do regime e espero que possamos libertá-los.”
Ahmed, assim como todos os combatentes rebeldes, ainda aguarda novas ordens. No entanto, permanece uma grande interrogação quanto aos esforços do Hayat Tahrir al-Sham de obter legitimidade política, sendo esse potencial manchado por um histórico questionável de direitos humanos nas áreas sob seu governo e pelas dúvidas persistentes sobre a capacidade do grupo de unir as divisões religiosas do país.
Enquanto isso, partes da Síria continuam devastadas pela guerra, com lutadores da oposição apoiados pela Turquia confrontando forças curdas aliadas dos EUA