O aguardado filme “Nosferatu”, dirigido por Robert Eggers, promete uma abordagem inovadora e provocadora ao clássico de horror, ao colocar a personagem Ellen, interpretada pela talentosa Lily-Rose Depp, no centro dos desejos sombrios do vampiro Transilvano, Conde Orlok. Lançado no dia de Natal nos Estados Unidos, essa nova versão não apenas revisita a narrativa original do filme de 1922, mas também questiona as normas de gênero e os limites da sexualidade durante o século XIX, tudo isso através de uma rica tapeçaria de vestuário que brinca ao mesmo tempo com a sensualidade e a inocência.
Na adaptação atual, a presença constante de Orlok em sonhos e pesadelos da jovem Ellen sugere uma luta não apenas pela sobrevivência, mas também pela expressão de um desejo reprimido. A familiaridade com a citação “Sinto você como uma serpente rastejando dentro do meu corpo” articula um clima de erotismo que permeia a obra. O filme se passa em 1838, uma época de grandes opressões sociais e mudanças culturais que foram cruciais na formação da identidade feminina, e tal jornada é refletida nas escolhas de vestuário meticulosamente elaboradas que trazem à tona a fragilidade e o desejo de controle da mulher.
A renomada figurinista Linda Muir colaborou com Eggers desde seu filme de estreia, “A Bruxa” (2015), e foi crucial na criação de um vestuário que equilibra a precisão histórica com um apelo sexual. Ela menciona a importância do diálogo criado pela moda, afirmando que “falamos sobre o poder sexual da roupa.” Muir detalha como as “tecidos diáfanos” e leves utilizados nas roupas de cama de Ellen revelam a vulnerabilidade de sua personagem. Para o público, a visualização de Ellen em trajes que evocam sensualidade também traz à luz a questão crucial de sua autonomia e as lutas contra a opressão patriarcal.
Entre os elementos mais significativos da produção está a atenção especial dada aos trajes de dormir. Como o filme ocorre majoritariamente à noite, os figurinos foram projetados para que Ellen aparecesse em roupões e camisolas íntimas que muitas vezes se tornam transparentes ao serem umedecidos, acentuando ainda mais sua vulnerabilidade. O processo para produzir esses trajes foi meticuloso, envolvendo a realização de várias versões e medições até que a cena correta fosse alcançada. “A vestimos como um rato molhado, filmando para avaliar como cada aspecto apareceria na tela”, diz Muir. Essa atenção ao detalhe não é apenas estética, mas diz respeito à construção da narrativa de Ellen e suas interações com o Conde Orlok.
A relevância dos trajes, no entanto, vai além da mera apresentação visual. A figurante menciona que a roupa de Ellen se torna um dispositivo narrativo, manipulada durante momentos cruciais, como a cena em que ela rasga o espartilho em um acesso de frenesim sexual, um símbolo dos limites da sexualidade feminina explorados na época. Muir também menciona como os costureiros da época utilizavam práticas que, embora parecessem limitantes, também refletiam a busca da mulher por autodeterminação. De fato, os espartilhos desenhados para Ellen demonstram um duplo sentido: uma expressão de controle e, ao mesmo tempo, uma forma de confinamento, sublinhando a dinâmica de poder subjacente à relação entre ela e Orlok.
Ao mesmo tempo, a força narrativa se baseia na autenticidade histórica. Muir se deparou com um diário de moda do ano de 1838, que trouxe insights sobre a vestimenta, ajustando a curadoria do vestuário às práticas e sensibilidades da época. Para Muir e Eggers, a ideia de vestuário realista e autêntico apenas aumenta o aterrorizante da narrativa, contrastando a beleza estilizada frequentemente associada a obras de horror contemporâneas. “Se é muito estilizado, pode ser lindo e emocional, mas não necessariamente crível”, diz Muir, reforçando a importância da autenticidade nos trajes como uma extensão da experiência de horror do filme.
Conforme o público se prepara para a estreia de “Nosferatu”, é inegável que a relação entre moda, desejo e horror está no cerne desta nova narrativa. Enquanto a representação da mulher durante o século XIX normalmente se limita a tropeços narrativos de opressão, Eggers, através da contribuição de Muir, redesenha essa relação, permitindo que as vestimentas não apenas um papel estético, mas se tornem protagonistas de uma história de resistência, desejo e libertação. A interação entre Ellen e a roupa não é apenas uma escolha de vestuário; é uma declaração que desafia as convenções da época. Nesse novo retrato de “Nosferatu”, a sedução está disfarçada de vulnerabilidade e poder, deixando o público na expectativa do que está por vir.
“Nosferatu” estreia dia 25 de dezembro nos Estados Unidos e um dia depois no Reino Unido, prometendo não apenas reviver um clássico, mas também provocar discussões sobre as dinâmicas de gênero através do olhar sensível e perspicaz de Eggers e Muir.