A pressão sobre os entregadores de comida na maior economia do mundo
A situação dos trabalhadores de entrega de alimentos na China tomou um rumo preocupante, evidenciada por diversos episódios de estresse e conflito que têm circulado amplamente nas redes sociais chinesas. Esses registrados incluem momentos de desespero e reações explosivas de entregadores, que fazem parte de um setor que cresceu de forma extraordinária, mas que atualmente enfrenta uma dura realidade. Em pleno colapso econômico, muitos desses profissionais, que anteriormente mantinham uma vida estável durante os lockdowns impostos pela Covid-19, lidam com uma deterioração acentuada de suas condições de trabalho e de remuneração. A perda gradual de equilíbrio entre a demanda e a compensação financeira, combinada com a pressão intensa para atender prazos cada vez mais apertados e a competitividade crescente, transforma os entregadores em vítimas de um sistema que parece estar se desfazendo.
Impactos da economia e do mercado de trabalho no cotidiano dos entregadores
A indústria de entrega de alimentos na China, avaliada em cerca de 200 bilhões de dólares e considerada a maior do mundo em termos de receita e volume de pedidos, experimentou um crescimento explosivo durante os três anos de restrições causadas pela pandemia. No entanto, atualmente, a indústria enfrenta uma avalanche de desafios relacionados à crise econômica do país, que vai desde um prolongado colapso no setor imobiliário até a diminuição do consumo. Com uma economia estagnada, trabalhadores enfrentam jornadas de trabalho cada vez mais longas em busca da mesma quantia que anteriormente arrecadavam com menos esforço. Como destacou a professora associada de sociologia Jenny Chan, os entregadores estão sob pressão constante e enfrentam um cenário de cortes drásticos na possibilidade de mantenha de suas atuais condições de trabalho.
A gratuita nesses contratos, exacerbada pela dominância de duas plataformas principais que controlam o mercado, limita ainda mais as opções desses profissionais. Como muitos trabalhadores estão sob carga horária elevada e, ao mesmo tempo, experimentam uma diminuição em suas receitas, a consequência é um ciclo vicioso em que precisam trabalhar mais para garantir uma renda que se tornou insuficiente. Dados de pesquisas apontam que a remuneração média dos entregadores, que chegou a superar 1.000 dólares em 2018, caiu para menos de 950 dólares em 2023, mesmo com jornadas que facilmente se estendem por dez horas ou mais e com um número crescente de entregas diárias.
Consequências da concentração de poder e queda nos ganhos
A concentração do poder em um “duopólio” de plataformas de entrega não apenas minimiza o poder de barganha dos entregadores, como também colapsa o próprio mercado. Segundo a pesquisa do China Labour Bulletin, as empresas começaram suas operações investindo pesadamente em remunerações superiores para atrair um número suficiente de trabalhadores, mas a situação agora evoluiu para um ambiente em que os trabalhadores lutam para se manter em um mercado saturado, tendo suas condições de trabalho constantemente erosadas por uma lógica mercadológica que privilegia o lucro em detrimento da segurança e dignidade dos profissionais.
Casos de enfrentamento direto entre entregadores e segurança de prédios, por exemplo, não são mais uma exceção. Recentemente, um grupo de trabalhadores, em uma demonstração de solidariedade, se reuniu para protestar contra a bullying sofrido por um colega. Este tipo de evento reflete a crescente frustração e desespero que os trabalhadores sentem ao lidarem com as pressões sistêmicas. Além desse aspecto, o aumento da competição por um número limitado de pedidos de entrega provoca uma maior tensão e insatisfação entre os entregadores, comprometendo sua capacidade de negociação e aumentando os riscos envolvidos em suas atividades.
Mudanças necessárias para um setor mais justo e seguro
A temática em torno dos trabalhadores de entrega na China não deve ser subestimada, uma vez que ela toca em questões mais amplas sobre direitos trabalhistas e bem-estar econômico. Um dos pontos mais críticos a ser discutido é a forma como as empresas tratam seus trabalhadores. Alguns especialistas e defensores dos direitos dos trabalhadores afirmam que a condição de freelancer, sem garantias de um salário mensal e atrelada a cada entrega realizada, obstaculiza severamente a capacidade dos entregadores de se protegerem em um ambiente de trabalho cada vez mais hostil. Eles são incentivados a desconsiderar as condições inseguras de trânsito e a priorizar a eficiência em detrimento da sua própria segurança.
O atual paradoxo em relação à profissão é que, embora muitos entregadores reconheçam as dificuldades, eles ainda percebem o setor como uma fonte de renda flexível, onde podem ajustar suas jornadas conforme suas necessidades financeiras. Entretanto, é fundamental que a sociedade e os agentes reguladores reconheçam a necessidade de garantir condições de trabalho seguras e justas para todos os trabalhadores envolvidos na economia de entrega, especialmente à medida que eles se tornaram indispensáveis para a dinâmica da vida urbana na China. A transformação do quadro atual, que se destaca pela precarização e um aumento significativo nas tensões entre entregadores e plataformas de entrega, requer uma ação coesa para que os direitos laborais sejam universalmente respeitados e promovidos.