A recente descoberta de fragmentos de DNA humano, os mais antigos já recuperados, revela novas informações sobre a interação entre os primeiros Homo sapiens e os Neandertais, ajudando a esclarecer detalhes importantes sobre a história compartilhada dessas duas espécies. A pesquisa foi conduzida a partir de restos humanos encontrados em uma caverna sob um castelo medieval na cidade de Ranis, na Alemanha, e suas implicações podem mudar a forma como entendemos as dinâmicas sociais e reprodutivas entre esses grupos pré-históricos.
Os cientistas conseguiram sequenciar o DNA de 13 fragmentos ósseos pertencentes a seis indivíduos que viveram na região há cerca de 45.000 anos. Entre eles estavam uma mãe, sua filha e alguns primos distantes. Os resultados foram publicados na revista Nature e mostram que os genomas analisados carregam evidências de ascendência Neandertal. As pesquisas clássicas já apontavam que os Homo sapiens se entrelaçaram geneticamente com os Neandertais, mas não estabeleciam uma linha do tempo precisa para esses encontros. Agora, os pesquisadores indicam que houve uma interação significativa entre essas duas linhagens humanas ocorrendo aproximadamente 80 gerações ou 1.500 anos atrás na região.
Embora a interação entre Homo sapiens e Neandertais tenha sido uma descoberta documentada desde que se determinou o primeiro genoma de Neandertal em 2010, detalhes sobre **onde, com que frequência e como** esses encontros aconteceram permaneciam obscuros. As teorias anteriores acreditavam que esses encontros ocorreram principalmente no Oriente Médio durante a migração dos Homo sapiens saindo da África, onde os Neandertais haviam habitado por pelo menos 250.000 anos. Porém, os novos dados sugerem uma interação mais complexa e localizada em outras regiões da Europa.
Estudos amplos sobre a ascendência Neandertal, também publicados recentemente, analisaram informações de 59 humanos antigos e 275 habitantes modernos, sustentando o cronograma estabelecido sobre a troca de genes entre as duas espécies. A maioria da ascendência Neandertal nos humanos modernos pode ser atribuída a um “período prolongado de fluxo gênico”, o que sugere um grau de integração muito mais alto entre esses hominídeos do que se pensava anteriormente. “Nós éramos bem mais semelhantes do que diferentes”, declarou Priya Moorjani, uma das autoras da pesquisa, ressaltando que as diferenças que imaginávamos entre Homo sapiens e Neandertais eram, na realidade, mínimas.
A pesquisa sugere também uma fase crucial que abrangeu de 50.500 a 43.500 anos atrás, um período que corresponde ao início do desaparecimento dos Neandertais no registro arqueológico. Durante esses 7.000 anos, houve um encontro frequente entre os Homo sapiens e os Neandertais, sugerindo que o contato sexual, a procriação e o intercâmbio cultural eram comuns. Os dados sugerem que o pico dessas interações ocorreu há 47.000 anos.
As variantes genéticas herdadas de nossos ancestrais Neandertais, que hoje compõem entre 1 e 3% de nosso genoma, variaram significativamente ao longo do tempo. Algumas variantes relacionadas ao sistema imunológico mostraram ser benéficas durante a última era glacial, quando as temperaturas eram consideravelmente mais frias, e continuam a fornecer benefícios até hoje. Os pesquisadores observaram que a descoberta de dados genéticos desse período crucial da evolução humana é extremamente rara e que cada novo estudo que analisa genomas antigos fornece uma perspectiva poderosa que refina nossa compreensão da migração humana e do processo de introgressão com Neandertais.
“Esses estudos sublinham como a análise de até mesmo alguns genomas antigos permite aos pesquisadores aprimorar nossa compreensão sobre a complexa história evolutiva humana”, comentou Tony Capra, professor de epidemiologia na Universidade da Califórnia, São Francisco. O novo cronograma também possibilita uma melhor compreensão sobre quando os humanos deixaram a África e como se espalharam pelo mundo. Segundo as análises, a principal onda de migração fora da África foi concluída por volta de 43.500 anos atrás, highlightando que a maioria dos humanos fora de África hoje possui ancestrais Neandertais que remontam a esse período.
Entretanto, muito ainda permanece desconhecido. Não está claro, por exemplo, porque as pessoas na Ásia Oriental têm uma maior quantidade de ascendência Neandertal do que os europeus, e por que os genomas Neandertais desse período parecem mostrar pouca evidência de DNA de Homo sapiens. Os pesquisadores continuam a investigar esses aspectos, além de explorar o impacto da mistura gênica sobre a saúde atual dos humanos.
Por fim, a geração atual pode se perguntar: “Serei parte dessa história de encontros ancestrais?” A resposta é afirmativa. A evidência encontrada até agora explica não apenas quem somos, mas como chegamos até aqui, revelando que a história da humanidade é repleta de interações e entrelaçamentos que moldam nosso ser até os dias de hoje.