Esta história foi publicada originalmente por ProPublica.
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Sharelle Menard sempre se preocupou com o futuro de seu filho Benji, diagnosticado com autismo severo. Quando Benji tinha quase três anos, Sharelle ficou angustiada ao perceber que ele mal se comunicava, capaz apenas de chorar e gritar em frustração. Com o apoio de terapias especializadas, Benji conseguiu dar passinhos em direção à comunicação. O primeiro palavra que conseguiu pronunciar foi ‘bolhas’, um momento comemorado com um espetáculo de bolhas no quintal. O que parecia um futuro incerto começou a se transformar em uma esperança renovada.
Porém, essa esperança foi colocada à prova quando a UnitedHealthcare, responsável por cobrir o tratamento de Benji, começou a negar horas de terapia essenciais. Segundo um relatório obtido pela ProPublica, a empresa iniciou uma campanha interna para cortar custos, que inclui a limitação do acesso ao tratamento necessário para crianças com autismo, mesmo frente ao cleitado de uma equipe clínica que atesta que essas horas são cruciais para a manutenção do progresso de Benji.
A situação se torna ainda mais alarmante quando se considera que a terapia de Análise Comportamental Aplicada (ABA) é amplamente reconhecida como o padrão-ouro para crianças com necessidades especiais. Com o aumento progressivo de diagnósticos de autismo nos Estados Unidos, passando de 1 em 150 crianças para 1 em 36 nos últimos 20 anos, a UnitedHealthcare foi forçada a repensar suas estratégias de gerenciamento de custos. No entanto, essa reestruturação acabou se traduzindo em uma barreira ao tratamento acessível.
Os documentos internos revelam que a UnitedHealthcare está implementando planos de ação direcionados para limitar a acessibilidade das crianças ao tratamento ABA. A companhia admite que alguns locais apresentam “longas listas de espera”, mas está se comprometendo a evitar novas aderências de provedores ao seu sistema, mesmo sabendo que isso pode responsabilizar famílias a procurar novos profissionais que aceitem seus seguros, levando a gastos explícitos que podem chegar a dezenas de milhares de dólares por ano.
Essa estratégia tem um impacto direto sobre as crianças com autismo que dependem de cuidados via Medicaid, um programa estatal apoiado pelo governo para aqueles com mais vulnerabilidades financeiras. O financiamento para estes serviços é fixado, permitindo que seguradoras reduzam seus gastos mantendo os restantes. Essa prática é frequentemente chamada de “corte de cuidados” e, em alguns casos, significa limitar o acesso a tratamentos já reconhecidos como necessários.
Com mais de 10 mil crianças em tratamento com autismo, a Optum, divisão da UnitedHealthcare, investiu cerca de 290 milhões de dólares para os serviços de ABA, prevendo uma crescente necessidade de atendimento no futuro. Os gastos da empresa com terapia aumentaram 20% apenas no último ano.
Ao realizar essa série de avaliações rigorosas sobre a “necessidade médica” de cada paciente, a empresa acaba por negar um grande volume de pedidos, sentenciando as crianças a perderem acesso aos cuidados essenciais. Para muitos, isso significa que os sintomas que deveriam ser tratados e gerenciados sistematicamente se agravam, levando a um estado de crise e comprometendo o bem-estar emocional e físico das crianças. Especialistas se juntaram à indignação, referindo o procedimento como “inconcebível e imoral”.
Ainda que a UnitedHealthcare tenha uma trajetória de problemas legais relacionados à cobertura de saúde mental, permanecem questões éticas que cercam como as seguradoras administram a cobertura de tratamentos essenciais. Grupos de defesa e especialistas expressaram preocupação sobre as possíveis violações das leis federais de paridade, que exigem um acesso equânime a cuidados mentais e físicos. Essa é uma luta contínua que pode trazer consequências, não apenas para o presente, mas para o futuro das crianças afetadas.
Benji, que atualmente possui 10 anos, precisa de 33 horas semanais de terapia para continuar a evoluir. Seu time de terapia documentou as consequências de uma diminuição de horas, que incluem não só regressões comportamentais, mas também uma deterioração em seu aprendizado e socialização. Apesar de a UnitedHealthcare negar o pedido de cumprimento do tratamento, sua terapeuta e o grupo que o atende continuam incessantemente a buscar os cuidados de que tantas famílias dependem.
Essas preocupações são reais quando se considera que o futuro é incerto e o sistema de saúde mental nos Estados Unidos enfrenta desafios complexos. Assim, Benji continua a receber suas horas de terapia, mesmo que não totalmente cobertas pelo seguro. No entanto, o cenário coloca em dúvida as políticas de cobertura da UnitedHealthcare, as práticas de avaliação de risco e a ética no tratamento.
A batalha de Sharelle Menard e de outras famílias parece longa, mas a determinação pela luta por cuidados adequados reflete uma necessidade real e urgente de mudanças no sistema social e de saúde.
Essencialmente, quando se opta por reduzir ou negar cobertura a crianças vulneráveis, a esperança de um futuro melhor pode ser rapidamente desfeita, e a luta pela justiça e acesso igualitário à saúde se torna imperativa. A transformação começa com a conscientização de práticas que envolvem aproveitamento e descaso em um momento de muito esforço e apoio que essas crianças precisam.
A história de Benji representa um vislumbre das lutas enfrentadas por muitas outras crianças e seus cuidadores ao redor do país. Somente através de práticas que priorizem o bem-estar e desenvolvimento das crianças, poderá haver esperança real de mudança e melhora no sistema em que vivem.