O Secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, confirmou que o país teve contato direto com o Hayat Tahrir al-Sham (HTS), um grupo rebelde sírio que atualmente exerce controle de fato sobre partes significativas da Síria. Esta revelação ocorreu em uma coletiva de imprensa no sábado, em Aqaba, na Jordânia, e reflete uma nova dinâmica na política externa americana em relação à Síria, especialmente após o colapso inesperado do regime do presidente Bashar al-Assad.
Este é o primeiro reconhecimento público de interações diretas com o HTS, uma organização designada como terrorista pelos Estados Unidos. Blinken fez esta declaração ao final de uma intensa “corrida diplomática” pela região, provocada pela recente queda da administração de Assad. “Sim, tivemos contato com o HTS e as outras partes”, disse Blinken, sem dar detalhes sobre o momento ou o nível do contato. Contudo, ele enfatizou que não há barreiras legais para dialogar com um grupo classificado como terrorista.
A confirmação da comunicação entre os Estados Unidos e o HTS surge em um contexto em que o governo americano intensificou seus esforços para localizar Austin Tice, um jornalista americano desaparecido há mais de dez anos na Síria. “Nós pressionamos todos que contatamos sobre a importância de ajudar a encontrar Austin Tice e trazê-lo de volta para casa”, disse Blinken. A busca por Tice foi redobrada na esteira do colapso do regime de Assad, tornando a situação ainda mais complexa e crítica para os Estados Unidos na região.
No cerne da abordagem americana, está um conjunto de princípios que são esperados de um novo governo sírio. Entre eles, existem diretrizes que incluem a necessidade de respeitar os direitos de todos os sírios, garantir que o país não se torne uma base para atividades terroristas, permitir a entrega de ajuda humanitária e assegurar que os estoques de armas químicas sejam devidamente destruídos. Esses princípios foram divulgados nos dias seguintes à queda de Assad e foram reforçados em uma declaração conjunta durante uma reunião ministerial urgente em Aqaba. “Este acordo envia uma mensagem unificada à nova autoridade interina e às partes envolvidas na Síria”, acrescentou Blinken.
Antes da reunião de sábado, Blinken se encontrou com líderes chave na Jordânia, Turquia e Iraque para buscar consenso em relação a essas diretrizes prioritárias. O Secretário de Estado destacou que “a América e nossos parceiros têm um importante interesse em ajudar o povo sírio a traçar este novo caminho”. Ele observou que o que acontece dentro da Síria pode ter consequências significativas muito além de suas fronteiras, refletindo sobre preocupações como deslocamento em massa e o ressurgimento do terrorismo.
Apesar desse cenário promissor, Blinken destacou que os desafios à frente não devem ser subestimados. Durante sua viagem, o Secretário de Estado procurou enfatizar a gravidade da situação, mencionando que a dinâmica no terreno na região poderá complicar os esforços de estabilização, mesmo diante de um consenso aparente sobre os princípios a serem seguidos.
Em meio a essa instabilidade, a região do norte da Síria experimentou intensos confrontos nas últimas semanas entre forças apoiadas pela Turquia e as Forças Democráticas Sírias (SDF), que são vistas pelos Estados Unidos como um parceiro crucial na luta para manter o Estado Islâmico (ISIS) degradado. Há uma frágil trégua em Manbij, mas a luta forçou as SDF a interromper suas operações contra o ISIS, conforme informado por seu comandante supremo.
O momento é descrito por Blinken como uma vulnerabilidade em que o ISIS busca se reorganizar, aproveitando a transição na Síria. Ele enfatizou a necessidade de cautela, principalmente em reuniões com líderes turcos, para evitar que qualquer grupo tome ações que permitam ao ISIS ganhar força novamente. As conversas também se concentraram na necessidade de coibir a influência das milícias apoiadas pelo Irã no Iraque e evitar que armas sejam transacionadas para a Síria.
Por fim, a resposta às recentes ações de Israel na Síria também se revelou um ponto de divisão entre os Estados Unidos e seus parceiros árabes. A administração de Netanyahu intensificou os ataques na Síria e enviou tropas à “zona de buffer” entre os Altos da Golã, recentemente capturada. Isso suscita preocupações sobre a estabilização da região e complicações para a segurança de todos os países envolvidos.
Em uma era em que o cenário geopolítico está em constante transformação, a situação na Síria e as políticas dos Estados Unidos terão repercussões não apenas para o Oriente Médio, mas também para a ordem internacional como um todo. Blinken deixou claro que enquanto os Estados Unidos continuarão a buscar soluções diplomáticas, a implementação efetiva dessas estratégias exigirá vigilância contínua e coordenação com aliados regionais.