No mundo digital contemporâneo, o surgimento de sites que utilizam inteligência artificial para criar imagens de nus de pessoas reais está causando preocupação tanto pelo impacto social quanto pelas práticas não éticas que ocorrem nos bastidores. Um dos sites mais proeminentes nesse campo é o Clothoff, que já recebeu milhões de visitas mensais, conforme relata a Graphika, uma empresa que analisa redes sociais. A pesquisadora Kolina Koltai, integrante do grupo investigativo Bellingcat, levantou sérias questões sobre a operação desses sites, alegando que há uma total falta de transparência sobre sua administração e práticas financeiras.
Koltai enfatiza que a obscuridade em torno do funcionamento do Clothoff alimenta uma “sombrinha inerente” nos serviços que ele oferece. “Eles não estão sendo transparentes sobre quem os possui. Obviamente, estão tentando mascarar suas formas de pagamento”, aponta a especialista. O acesso ao site é condicionado à afirmação de que o usuário deve ter 18 anos ou mais e à proibição de uso de fotos de outras pessoas sem permissão, além da alegação de que “o processamento de menores é impossível”. No entanto, Koltai testificou que a verificação real dessas condições é praticamente inexistente, destacando que, após clicar em “aceitar”, os usuários são imediatamente expostos a fotos explícitas.
Como funciona o Clothoff e quais são as consequências sociais?
Ao entrar no Clothoff, a primeira geração de uma imagem de nu é oferecida gratuitamente, mas o custo começa a variar entre $2 e $40 para os serviços subsequentes. Além disso, o site oferece uma função de poses que permite aos usuários gerar imagens de pessoas em diversas posições sexuais. Esta abordagem não apenas facilita a criação de imagens potencialmente prejudiciais como também incentiva os usuários a compartilhar essas criações em redes sociais, expondo indivíduos, muitas vezes adolescentes, sem consentimento.
Um dado alarmante que Koltai trouxe à luz é a recorrência de postagens de imagens nuas criadas artificialmente de garotas que claramente são menores de idade, muitas vezes oriundas de competições esportivas escolares. Isso ressalta o uso não consentido de suas fotos originais, levando a uma sexualização indesejada e profundamente prejudicial das vítimas. “Essas imagens estão sendo feitas e publicadas em redes sociais sem consentimento. É uma violação grave dos direitos de privacidade”, diz Koltai.
Meios de pagamento em sites de nudificação levantam suspeitas
O programa 60 Minutes, ao investigar o Clothoff, constatou que o site oferece uma variedade de opções de pagamento, como PayPal, cartões de crédito e Google Pay. Entretanto, muitos serviços de pagamento online possuem políticas que proíbem o uso para imagens de conteúdo adulto, e o Clothoff utiliza métodos enganosos para contornar esses regulamentos. As transações são redirecionadas através de sites fraudulentos que alegam vender produtos como flores e aulas de fotografia. O PayPal confirmou ter banido o Clothoff de sua plataforma, mas a natureza evasiva do site permite que ele crie novos caminhos para suas atividades financeiras ao contornar as proibições.
Decepções e encobrimentos nas práticas do Clothoff
Outra camada de engano foi revelada quando 60 Minutes investigou a alegação de que o Clothoff seria uma empresa com sede em Buenos Aires, Argentina, sob o nome fictício de “Grupo Digital”. Ao visitar o endereço listado, a equipe encontrou apenas um escritório ligado a um canal do YouTube que não tinha conhecimento do Clothoff. Além disso, descobriu-se que a foto do suposto CEO do site também era provavelmente gerada por inteligência artificial, levantando questões sobre a autenticidade da operação. “A sofisticação dos grandes sites que operam dessa maneira sugere uma rede bem estabelecida e um planejamento cuidadoso”, completa Koltai, sugerindo que não é o caso de uma simples pessoa operando no porão de sua casa.
Apesar dos esforços do 60 Minutes para estabelecer contato com o Clothoff, os responsáveis não se manifestaram. Essa falta de resposta e clareza aponta para a urgência de uma discussão mais ampla sobre regulamentação e ética no uso da inteligência artificial, especialmente em relação a práticas que comprometam a dignidade e a privacidade individual. A reflexão que permanece é: até onde a tecnologia deve ir em nome da liberdade de expressão, e a que custo para os mais vulneráveis?