A doença cardiovascular é reconhecida como a principal causa de morte nos Estados Unidos, levando à morte aproximadamente 700.000 americanos anualmente. Durante décadas, a recomendação de médicos era que adultos mais velhos e saudáveis tomassem uma dose baixa de aspirina diariamente para ajudar na prevenção desse tipo de doença. No entanto, após uma série de ensaios clínicos que desafiaram as crenças estabelecidas sobre os benefícios da aspirina para determinadas faixas etárias, a American Heart Association (AHA), o American College of Cardiology (ACC) e o United States Preventive Services Task Force (USPSTF) alteraram suas diretrizes, aconselhando a maioria dos pacientes mais velhos a evitar o uso diário de aspirina se não houver histórico prévio de doenças cardiovasculares, devido aos seus potenciais efeitos colaterais perigosos.
Apesar dessas atualizações nas diretrizes, uma pesquisa de 2019 estima que aproximadamente 29 milhões de americanos sem histórico de doenças cardiovasculares ainda utilizam aspirina como medida preventiva, e 6,6 milhões fazem isso sem recomendação de um profissional de saúde. Diante de tais dados, surge a pergunta: você ainda deve tomar aspirina para prevenir doenças cardiovasculares? O cardiologista da Yale Medicine, Dr. Michael Nanna, afirma que a resposta não é simples, pois a decisão depende de diversos fatores, incluindo idade, grupo de risco e histórico médico. Nós consultamos o Dr. Nanna para entender melhor as diretrizes em mudança e receber orientações sobre quem deve ou não usar aspirina na prevenção de doenças cardiovasculares.
O termo doença cardiovascular abrange uma variedade de condições relacionadas ao coração e vasos sanguíneos, incluindo, mas não se limitando a, doença arterial coronariana, arritmias, pressão alta e doença arterial periférica. Além disso, engloba eventos cardiovasculares, como ataque cardíaco e acidente vascular cerebral (AVC). Os fatores de risco para doenças cardiovasculares incluem colesterol alto, tabagismo, diabetes, obesidade, dieta inadequada, inatividade física e consumo excessivo de álcool. A aspirina, sendo um anti-inflamatório não esteroidal (AINE), age como um analgésico e antipirético, mas também atua como um anticoagulante, impedindo que células sanguíneas menores se aglomerem e formem coágulos. Como sabemos, os coágulos sanguíneos são uma das principais causas de ataque cardíaco e AVC, fazendo com que durante muitas décadas médicos recomendassem que pessoas a partir dos 50 anos começassem a tomar aspirina diariamente para se proteger contra esses eventos.
Foi inicialmente constatado que a aspirina também era benéfica para aqueles que já tinham um histórico de doenças cardiovasculares, atuando na prevenção de eventos futuros. As recentes mudanças nas diretrizes foram motivadas pelo aumento no risco de sangramentos associados ao uso da aspirina, combinado com os benefícios limitados na prevenção de doenças cardiovasculares. O uso de aspirina pode elevar o risco de hemorragias no trato gastrointestinal e de AVC hemorrágico. Os adultos mais velhos já são mais propensos a sangramentos, portanto, a aspirina poderia agravar essas condições. Dr. Nanna observa que “há aproximadamente 20 anos, muitas pessoas com 60 anos ou mais estavam tomando aspirina como medicação preventiva, mesmo tendo baixo risco de desenvolver doenças cardiovasculares”. Três estudos de referência publicados em 2018 – ASPREE, ASCEND e ARRIVE – avaliaram os benefícios e riscos do uso diário de aspirina para a prevenção de doenças cardiovasculares. Apesar de um deles ter mostrado uma redução muito pequena nos eventos cardiovasculares, todos os estudos indicaram um aumento do risco de sangramento.
É fundamental destacar que os estudos focaram em pacientes que tomaram aspirina como medida preventiva contra o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Para pacientes com histórico de eventos cardiovasculares ou aqueles que se submeteram a cirurgias de revascularização do miocárdio, ainda existe “evidência sólida” de que a aspirina ajuda a prevenir novos episódios, conforme afirmado pela Journal of the American Medical Association (JAMA). Dr. Nanna enfatiza que “não se deve interromper a aspirina sem orientação do cardiologista, a menos que haja um motivo específico”. Essa distinção é crucial. Em função dos novos estudos, a ACC e a AHA atualizaram suas diretrizes em 2019, recomendando que o uso preventivo de aspirina seja considerado apenas para alguns indivíduos de alto risco entre 40 e 70 anos, enquanto deve ser evitado em pacientes acima de 70 anos. A USPSTF revisou suas orientações em 2022, recomendando a não iniciação do uso de aspirina para prevenção primária de doenças cardiovasculares em adultos com 60 anos ou mais.
O Dr. Nanna explica que “uma pessoa nessa faixa etária tem um risco básico baixo de sangramento, portanto, se ela estiver nesse grupo de idade e tiver um risco elevado de doenças cardiovasculares, pode haver um benefício maior no uso da aspirina, considerando que o risco de sangramentos é baixo”. Para aqueles que já tiveram um ataque cardíaco ou AVC, as diretrizes se mantêm, colaborando para a prevenção de novos eventos. O que complica a situação, no entanto, são os pacientes com doença aterosclerótica não obstrutiva assintomática, que não se enquadram perfeitamente nas categorias de prevenção primária ou secundária. “Esses pacientes estão em uma situação intermediária que ainda precisa ser estudada”, diz o Dr. Nanna.
Em síntese, para a grande maioria dos idosos saudáveis, a aspirina diária não deve ser utilizada para a prevenção de eventos cardiovasculares pela primeira vez. Dr. Nanna destaca que existem dados que mostram que, se a aspirina está sendo usada para prevenção primária, é melhor interrompê-la. “Esse é um tema difícil, e muitos pacientes relutam em parar, mas os dados sugerem que essa é a abordagem mais segura”, conclui. Em última instância, a decisão sobre o uso diário da aspirina deve ser feita individualmente com um profissional de saúde, que poderá avaliar as condições coexistentes, idade, histórico familiar e outros fatores de risco. “Estamos falando de medicina personalizada e de tomada de decisão conjunta. Analisamos cada caso isoladamente, pesamos o risco de eventos como ataque cardíaco e AVC e determinamos se esse risco é alto o suficiente para ultrapassar os riscos de sangramento associados ao uso da aspirina”, enfatiza Dr. Nanna.
O leitor que se pergunta sobre o uso de aspirina deve sempre se lembrar que a medicina avança rapidamente e que as diretrizes podem mudar com novas evidências. Portanto, é sempre prudente discutir sua condição e quaisquer medidas preventivas que você esteja considerando com seu médico. A saúde do seu coração é muito importante e merece a melhor atenção.
Saiba mais sobre saúde cardiovascular no site da American Heart Association