As tiras de quadrinhos têm o poder de unir gerações e criar laços afetivos indeléveis entre seus personagens e o público. Dois dos personagens mais célebres e amados em todo o mundo, Charlie Brown e Garfield, são frutos das mentes criativas de Charles Schulz e Jim Davis, respectivamente. O que muitos podem não saber é que além da influência mútua entre esses dois ícones dos quadrinhos, um gesto de amizade e colaboração resultou em uma mudança significativa no design do famoso gato Garfield. Nesta narrativa, exploraremos não apenas essa mudança, mas também como um simples encontro acidental teve repercussões profundas na maneira como vemos esse adorável felino diariamente.
Um episódio intrigante ocorreu durante a criação do primeiro especial de TV de Garfield, intitulado “Aqui Vem Garfield”, exibido em 1982. Jim Davis, o criador de Garfield, encontrou-se em uma situação complicada: sua inabilidade em fazer o gato dançar durante os créditos finais foi resultado do design original da personagem. Garfield, com suas pequenas patas e um corpo volumoso, se tornou um sério obstáculo para a coreografia planejada. Em meio a essa crise criativa, Davis sabia que precisava de ajuda e, surpreendentemente, a resposta estava a poucos metros de distância. Charles Schulz, creator da conhecida tira “Peanuts”, estava apenas no próximo estúdio, trabalhando em um especial de Natal. A conexão que se formou neste momento crucial entre os dois criadores de quadrinhos se tornou o ponto de partida de uma colaboração improvisada que mudaria para sempre a aparência do icônico gato.
Durante uma conversa com Davis, Schulz prontamente tomou a iniciativa e ofereceu sua visão artística. Em um relato emocionante, Davis compartilha como Schulz pegou seu esboço e, com a precisão de um artista habilidoso, desenhou novos pés para Garfield. “Quando Snoopy está em quatro patas, ele tem patas de filhote, mas quando ele se levanta, as patas traseiras ficam maiores, proporcionando um melhor equilíbrio. Ninguém percebe isso, mas ele parece ótimo em pé”, disse Schulz. Assim, o novo design de Garfield tornou-se uma realidade, com suas pernas traseiras significativamente maiores, conferindo ao personagem o equilíbrio necessário para realizar suas travessuras e ações, e tornando possível que o adorado gato ganhasse vida em sua nova forma.
A técnica que Schulz empregou nesse redesign é frequentemente descrita como uma “trapaça” artística, uma maneira de garantir que a arte se mantenha coerente, mesmo quando não precisa ser literal. Os detalhes do personagem podem mudar de uma imagem para outra e, enquanto os espectadores não perceberem, não há problema. Isso é semelhante a fenômenos que encontramos em animações populares, como a famosa cena do filme “Frozen”, onde o cabelo de Elsa atravessa seu braço de uma maneira fisicamente impossível. Dessa forma, Garfield e Snoopy nascem com designs diferentes ao sentar e ficar em pé, mas essa diferença sutil pode passar despercebida pelos fãs mais atentos.
O impressionante papel de Charles Schulz nessa história vai além da mera colaboração; ele ajudou a estabelecer uma evolução no design de Garfield que permanece visível até hoje. Ao longo dos anos, o design de Garfield passou por mudanças significativas, e embora as grandes patas traseiras sejam um legado de Schulz, Jim Davis também introduziu alterações dramáticas em sua criação. Inicialmente concebido como um gato “realista”, Garfield se transformou gradativamente em um “melhor ator”, permitindo que ele interagisse de forma mais expressiva com o seu entorno. Davis descreve essa evolução, dizendo que “nunca foi intencional”, mas simplesmente aconteceu ao longo do tempo para possibilitar novas ações e interação do personagem, como alcançar uma torta em uma prateleira alta.
Outras mudanças no design de Garfield, incluindo o aumento de suas características faciais ao longo dos anos, também foram deliberadas. Em 1983, uma escassez de papel para impressão forçou os jornais a reduzirem a tiragem de Garfield para economizar espaço, levando Davis a ampliar os olhos e a boca do personagem, garantindo que suas expressões permanecessem visíveis, especialmente para os “leitores mais velhos”. Essas modificações formaram um conjunto de decisões criativas que culminaram em um Garfield icônico, tornando-se um dos personagens de quadrinhos mais reconhecíveis em todo o mundo.
A finalização desta viagem por trás da criação e evolução de Garfield revela que a colaboração involuntária de dois gigantes das tiras de quadrinhos se transformou em um legado coletivo que continuará a encantar os fãs por gerações. A presença de Schulz ao lado de Davis em um momento de necessidade artística não apenas alterou o design de um gato icônico, mas também solidificou a amizade e a integração criativa que floresceu entre esses dois titãs da indústria. Assim, o gato de Jim Davis continua a viver em nossos corações, repleto de seu humor característico e travessuras diárias, muito graças à colaboração que começou com um simples pedido de ajuda.
Fontes: Heritage Auctions