A condenação de Urfan Sharif, 42 anos, e sua esposa, Beinash Batool, 30 anos, pelo brutal assassinato de sua filha, Sara Sharif, de apenas 10 anos, representa um sombrio marco em um caso que chocou a Inglaterra e destaca falhas alarmantes no sistema de proteção à criança. Nesta terça-feira, o tribunal decidiu que ambos cumprirão prisão perpétua pelo assassinato, resultante de um histórico de abuso horrível que culminou na morte da criança.
A menina foi encontrada morta em sua casa em agosto de 2023, após uma fuga da família para o Paquistão. Durante o julgamento, os promotores descreveram a série de abusos a que Sara foi submetida como uma verdadeira “campanha de abuso”. De acordo com as evidências apresentadas em tribunal, Sara sofria de mais de 70 lesões recentes e muitas mais antigas, incluindo contusões, queimaduras, fraturas e marcas de mordidas. Os detalhes horrendos revelados no julgamento levantaram questões críticas sobre o fracasso dos serviços sociais e das autoridades em intervir e proteger a criança, que vivia em uma situação de vulnerabilidade extrema.
Após a descoberta do corpo de Sara sob um cobertor em uma cama beliche, a polícia londrina localizou os pais na sequência de uma teleconferência onde Urfan Sharif admitiu ter “punido legalmente” a filha, insinuando que suas ações foram disciplinadoras e não intencionais quanto à morte de Sara. O tio de Sara, Faisal Malik, de 29 anos, também foi findado culpado de causar ou permitir a morte da criança, recebendo uma sentença de 16 anos de prisão.
O julgamento no Tribunal Criminal Central expôs uma série de evidências de negligência e abuso, gerando preocupações sobre a possibilidade de que o sistema de serviços sociais pudesse ter atuado de maneira diferente para proteger Sara. As palavras do juiz John Cavanagh ressoaram no tribunal quando ele declarou: “A morte de Sara foi a culminação de anos de negligência, frequentes agressões e o que só pode ser descrito como a tortura dessa pequena criança” e acrescentou que o grau de crueldade é “quase inconcebível”. Nessas palavras, não ficou clara a contrição, visto que os condenados não demonstraram remorso.
Em resposta ao caso, políticos e outras autoridades expressaram a urgência por uma revisão do que ocorreu e pediram reformas para prevenir a repetição de tais tragédias. Rachel de Souza, comissária de crianças da Inglaterra, disse: “A morte dela é um lembrete doloroso das profundas fraquezas em nosso sistema de proteção infantil que, como país, temos falhado em corrigir repetidamente”.
A história de Sara Sharif é um triste retrato de como as falhas no sistema de proteção à criança podem resultar em consequências mortais, destacando a necessidade urgente de reformas significativas nesse setor. A complexidade do caso se torna ainda mais angustiante ao perceber que os serviços sociais estavam cientes da situação da criança muito antes de sua morte. Urfan e sua ex-esposa, Olga Sharif, estavam no radar dos serviços sociais pelo menos três anos antes do nascimento de Sara e, apesar das evidências de abusos anteriores, o tribunal nunca tomou medidas efetivas para protegê-los adequadamente.
Os detalhes do caso de Sara revelam uma sociedade que falhou em intervir em momentos cruciais. Após a morte de sua mãe, as crianças foram colocadas sob a custódia do pai e da madrasta, apesar de já haverem sido levantadas preocupações sobre a possibilidade de abuso físico e emocional. O Conselho do Condado de Surrey, que levantou repetidas preocupações sobre os riscos à saúde de Sara, planeja revisar as circunstâncias de sua morte. Embora os serviços de acolhimento tenham investigado a criança após relatos de contusões na escola, nenhuma ação adicional foi tomada.
Como se não bastasse, Urfan Sharif tentou afastar Sara da escola, controlando seu acesso à educação para evitar que a violência fosse descoberta. O tribunal descobriu, por exemplo, que ele fez com que Sara usasse um hijab não por motivos religiosos, mas para esconder os hematomas do corpo da criança. Os relatos de um vídeo gravado dois dias antes da morte de Sara, onde ela aparece dançando e sorrindo, contrastam tragicamente com a realidade de sua vida e as condições abusivas que enfrentava diariamente. A seu respeito, o juiz Cavanagh destacou que, apesar de tudo, Sara conseguia sorrir para a câmera, revelando uma resiliência tocante diante da dor insuportável que sofria em seu lar.
A declaração da mãe de Sara, Olga Sharif, após a condenação do casal, expressou sua dor e o abalo que esse caso causou a todos os entes queridos da menina. Ela se referiu a seus assassinos como covardes e sadistas, refletindo a tristeza de uma mãe que perdeu a filha para ações cruéis. Em sua declaração, ela reafirmou que, embora sua filha esteja agora em paz, a luta por uma realidade em que crianças como Sara possam ser protegidas continua. Este caso trágico é um eco das lacunas no sistema de proteção infantil, que deve ser urgentemente revisado para que tragédias semelhantes possam ser prevenidas no futuro.