O impacto das declarações de Orbán e Fico nas relações internacionais e na política interna dos EUA
Em um momento inteiramente atípico, líderes europeus, normalmente hesitantes em comentar sobre as eleições dos Estados Unidos antes de sua realização, se pronunciaram abertamente a respeito de sua esperança em uma vitória de Donald Trump nas próximas eleições de 2024. O primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, um dos principais expoentes da direita populista na Europa, deixou claro, durante uma coletiva de imprensa em Estrasburgo, na França, no dia 10 de outubro, que celebraria tal resultado. “Se o Sr. Trump voltar, abriremos várias garrafas de champanhe,” afirmou Orbán, expressando sua confiança de que Trump, caso reeleito, conseguiria resolver o conflito na Ucrânia antes mesmo de assumir o cargo novamente. Esta perspectiva não é isolada, pois Robert Fico, primeiro-ministro da Eslováquia e outro defensor do populismo, compartilha deste sentimento, prevendo também um rápido término da guerra na Ucrânia a partir de uma eventual reeleição de Trump.
A relação de Orbán com Trump tem sido caracterizada por laços estreitos, com o líder húngaro apoiando sua candidatura e realizando visitas ao ex-presidente na residência Mar-a-Lago, na Flórida, em julho. Em contrapartida, Trump frequentemente se refere a Orbán de forma positiva em eventos políticos e em entrevistas na mídia, um aspecto que, sem dúvida, fortalece a conexão entre eles. Vale lembrar que, durante um debate, quando a vice-presidente Kamala Harris insinuou que líderes mundiais estavam “rindo” de Trump, o ex-presidente se defendeu citando o líder húngaro e suas opiniões favoráveis a ele.
A crescente preocupação dos EUA com a influência russa na Hungria
Entretanto, essa visão positiva de Orbán não é compartilhada por uma parte significativa dos políticos norte-americanos. Um grupo de senadores republicanos que visitou a Hungria se declarou inquieto com o fortalecimento das relações entre o governo húngaro e a Rússia, assim como com a erosão das instituições democráticas no país. O senador Jerry Moran, do Kansas, liderou uma delegação que manifestou preocupações sobre essa relação crescente com Moscou, enfatizando que seria do interesse comum de ambos os países que a Hungria considerasse os avisos de seus aliados e atuasse de acordo.
Sob o governo de Orbán, que está no poder há 14 anos e já ocupou um cargo similar anteriormente, a Hungria tem desenvolvido relações significativamente mais estreitas com a Rússia em comparação a seus colegas da União Europeia. O governo húngaro já enfrentou críticas do bloco por adotar políticas rigorosas em relação à imigração, direitos LGBTQ+ e por restringir a liberdade de imprensa, além de ferir normas democráticas e o estado de direito. Recentemente, Orbán se opôs ao uso de ativos russos congelados, que os EUA e os europeus desejam usar para ajudar a financiar a Ucrânia, condicionando a decisão sobre o prolongamento de sanções contra a Rússia às futuras ações da administração americana após as eleições.
A postura de Orbán e Fico em relação ao financiamento militar da Ucrânia
Um dos pontos centrais da retórica de Orbán refere-se à possibilidade de uma retirada do apoio financeiro e militar dos EUA à Ucrânia, o que, segundo ele, resultaria na cessação do conflito. Ele argumenta que, sem o suporte americano, a Ucrânia “não consegue se sustentar” e que, assim, a guerra estaria fadada ao fracasso. Essa declaração ressoa de maneira significativa, uma vez que os EUA já forneceram mais de 174 bilhões de dólares em ajuda militar e humanitária à Ucrânia desde o início do conflito.
Em similar aliança, o ministro das Relações Exteriores da Hungria, Péter Szijjártó, fez declarações preocupantes, indicando que, na hipótese de Trump não ser reeleito, a Europa teria que se preparar para um “período muito difícil.” Szijjártó comentou que uma vitória de Trump poderia representar uma mudança na política internacional, trazendo com isso uma esperança renovada por paz. Orbán caracteriza Trump como uma figura “não convencional” e “refrescante” entre os líderes mundiais, situação que agrada ao primeiro-ministro húngaro, que vê cada vez mais a política tradicional como monótona e desestimulante.
A reação da diplomacia dos EUA e perspectivas futuras
O embaixador dos EUA na Hungria, David Pressman, expressou sua preocupação com a abordagem do primeiro-ministro húngaro, considerando-a inapropriada e prejudicial às relações bilaterais. Pressman destacou que Orbán tem promovido abertamente suas preferências e seus esforços por uma mudança no governo americano, o que, segundo ele, pode ter consequências negativas para os interesses do povo húngaro. As relações entre os dois países parecem deteriorar-se sob a perspectiva do envolvimento político, algo que Pressman alerta ser uma “proposição perigosa” para a diplomacia necessária entre os aliados ocidentais.
Além disso, Orbán tem amplificado sua presença no cenário internacional por meio de ações que atritam com as normas estabelecidas da União Europeia e da OTAN. Durante o período em que a Hungria assumiu a presidência rotativa da Comissão Europeia, Orbán adotou o slogan “Faça a Europa Grande Novamente”, uma frase que ecoa a retórica de compadres no populismo mundial, criando uma narrativa que parece alinhar-se às ideologias de Trump. Essa abordagem tem gerado críticas e tensões com outros líderes da União Europeia e da OTAN, especialmente quando se trata de sua notável relutância em adotar políticas anti-russas mais contundentes.
Enquanto isso, a Eslováquia, sob a liderança de Robert Fico, adota uma postura similar a de Orbán, mostrando-se receptiva às influências russas e expressando reluctância em fornecer apoio militar à Ucrânia. As consequências dessa aproximação com a Rússia podem culminar em isolamento e crítica internacional, destacando um dilema enfrentado por ambos os países ao tentarem equilibrar suas políticas locais com as exigências e expectativas da comunidade internacional.
A intersecção entre as políticas de Orbán e Fico, suas respectivas conexões com Trump e o contexto mais amplo da política geopolítica evidenciam um momento decisivo para a Europa em sua relação com os Estados Unidos e o restante do mundo. O desenrolar da próxima eleição americana e o papel de Trump em um possível segundo mandato não apenas alterarão a dinâmica política na América, mas também afetarão profundamente a trajetória política e econômica da Hungria e da Eslováquia, assim como suas interações com a Rússia e os demais aliados ocidentais.