A crescente limitação na cobertura de membros protéticos por parte das seguradoras de saúde nos Estados Unidos trouxe à tona uma questão preocupante: será que a vida de milhares de amputados está sendo desconsiderada por essas instituições? O relato de Michael Adams, um amputado de 51 anos que vive em Lafayette, Colorado, serve como exemplo dessa realidade. Ao buscar um plano de saúde, ele tinha uma exigência clara: a inclusão de cobertura para membros protéticos, mais especificamente um membro com joelho controlado por microprocessador, essencial para a sua estabilidade e mobilidade.
Adams, que perdeu a perna direita para o câncer há quatro décadas, encontrou um plano de saúde, um “gold plan”, no mercado de saúde do Colorado, que cobriria a prótese desejada. Contudo, quando chegou a hora de substituir o equipamento, Adams enfrentou um obstáculo imprevisto: a seguradora se recusou a autorizar a troca, alegando que a nova prótese não era “medicamente necessária”. Essa decisão contraria uma lei do Colorado que stipula que tal definição deve ser feita pelo médico do paciente, que, no caso, prescrutou a mesma prótese ao longo dos anos, desde os tempos em que Adams contava com um plano patrocinado pelo empregador.
“O joelho protético eletrônico muda a vida”, afirmou Adams. Ele destacou que sem ele, a experiência de mobilidade se assemelharia a voltar à infância, quando utilizava uma perna de madeira. O joelho, ao detectar variações no terreno e inclinações, endurece ao perceber sinais de queda, evitando acidentes graves.
Enquanto isso, a realidade para muitos que necessitam de uma cirurgia de substituição de articulação estabelece um contraste gritante. Dados da Agência de Pesquisa e Qualidade em Saúde dos EUA (AHRQ) revelam que em 2021, 1,5 milhão de substituições de joelho ou quadril foram realizadas em hospitais do país. O preço médio para uma substituição de quadril ou joelho em hospitais ortopédicos de excelência foi de cerca de US$ 68.000 em 2020. Essa diferença nos custos e a forma como as seguradoras tratam as necessidades de emergência cirúrgica comparadas com a cobertura de próteses talvez ilustrem um viés de sensibilidade à necessidade médica.
Para a comunidade de amputados, as disparidades na cobertura representam um tipo de discriminação que não pode ser ignorada. Jeffrey Cain, um médico e ex-presidente da Amputee Coalition, resumiu a frustração: “Os planos de saúde cobrem uma substituição de joelho se está revestido de pele, mas se é feito de plástico, não vão cobri-lo”. Cain, que perdeu as pernas em um acidente aéreo há quase 30 anos, exemplifica a incongruência das políticas que cercam a cobertura de saúde.
A AHIP (Associação de Planos de Saúde), uma entidade representativa do setor, declarou que normalmente as coberturas são fornecidas quando a prótese é comprovadamente necessária. Contudo, a realidade enfrenta uma discrepância significativa, já que cidadãos com amputações frequentemente têm suas solicitações de cobertura negadas com base em alegações de que os dispositivos não são experimentais ou não se encaixam nos critérios de necessidade médica, mesmo quando tecnologias como joelhos controlados por microprocessadores já são utilizadas há décadas.
Estima-se que atualmente, cerca de 2,3 milhões de pessoas nos Estados Unidos vivem com perda de membros, segundo uma análise da Avalere. Esse número deverá potencialmente dobrar nos próximos anos, devido ao aumento da idade e ao crescimento de amputações relacionadas ao diabetes, traumas e outros problemas de saúde. Curiosamente, menos da metade das pessoas que sofreram amputação recebeu a recomendação de uma prótese. A prática comum entre as seguradoras de saúde é recusar a cobertura alegando que a necessidade médica não é devidamente evidenciada.
Mesmo após a promulgação de leis estaduais, como a de Colorado em 2000 que garante a cobertura de próteses em paridade com o Medicare, muitos planos privados continuam a não ser regulados pelas leis estaduais. Um estudo mostrou que mais da metade dos segurados não estão em planos supervisionados por tais legislações, o que levanta questões sérias sobre a equidade no acesso à saúde.
Como destacou uma análise recente do GAO, embora o Medicare cubra 80% das próteses, apenas 30% dos beneficiários que perderam um membro em 2016 receberam uma prótese nos três anos subsequentes. As barreiras financeiras são, com frequência, uma razão significativa para essa realidade. De acordo com Ashlie White da Amputee Coalition, a maioria dos segurados acaba ficando responsável por algum custo, tornando-se quase comum que as pessoas fiquem endividadas por conta das próteses.
O Bureau de Proteção Financeira do Consumidor dos Estados Unidos está atualmente considerando uma nova regra que poderia proibir os credores de reaver dispositivos médicos, como cadeiras de rodas e membros protéticos, caso haja impossibilidade de pagamento das dívidas. White, apoiando essa ideia, comenta: “É um membro de substituição. Reposse é, de fato, uma punição para a pessoa”.
Adams, após um longo processo, acabou conseguindo a troca de sua prótese pelo plano de saúde, mas isso resultou em um custo de coparticipação de aproximadamente US$ 4.000. Embora o índice de 20% seja acessível para ele, já que é um consultor autônomo, muitos, como Leah Kaplan, lutam para obter uma cobertura que permita acesso à tecnologia de que necessitam.
Kaplan, que nasceu sem a mão esquerda, obteve uma prótese que auxilia na prática de ciclismo, mas ao solicitar uma prótese para atividades cotidianas, sua seguradora negou o pedido. O custo da mão que ela deseja ultrapassa os US$ 46.000, um valor que está além de suas possibilidades financeiras. Apesar de trabalhar com seu médico para apresentar apelações, Kaplan já recebeu três negativas da seguradora e agora se prepara para buscar um auxílio externo.
Esta situação revela não apenas os desafios enfrentados por muitos amputados, mas também a necessidade urgente de uma reforma nas políticas de saúde que abranjam as necessidades reais dos pacientes. Como ficou claro na experiência de Adams e Kaplan, a luta por uma cobertura efetiva de próteses é um aspecto não apenas financeiro, mas fundamental para a dignidade e a qualidade de vida dos indivíduos afetados.
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