A situação financeira do governo dos Estados Unidos tornou-se um verdadeiro drama político, com os congressistas parecendo cada vez mais distantes de cumprir o seu papel fundamental de garantir a saúde fiscal do país. Recentes acontecimentos revelaram que dois bilionários sem cargo eletivo, Donald Trump e Elon Musk, têm exercido uma influência inesperada nos bastidores, abortando um projeto de lei de gastos temporário que foi cuidadosamente elaborado em um esforço bipartidário. O Brasil já ouviu histórias similares de influência de grandes empresários na política, mas poucas delas envolvem uma dinâmica tão direta e impactante como esta. Afinal, em um momento tão crítico, digamos que os americanos estão mais preocupados com o futuro do país do que com a próxima cotação de ações do mercado.
Donald Trump, o presidente eleito que ainda não tomou posse, e Elon Musk, o homem mais rico do mundo que tem interesses financeiros próprios em contratos governamentais, iniciaram uma campanha de descontentamento que desmantelou negociações que já pareciam promissoras. Musk, em sua nova “rede social” X, habitual terreno de provocações acirradas, gerou críticas que levaram Trump a silenciar os apoiadores da proposta de gastos, tornando essencial a colaboração, agora perdida, entre os republicanos e os democratas. Isso faz com que a solução de como financiar o governo dos EUA após o prazo final na sexta-feira se torne uma questão de urgência política, especialmente quando Joe Biden, o atual presidente, permaneceu em silêncio em momentos cruciais.
É de se perguntar, se essa correria de última hora não é a forma preferida de financiar o governo americano, qual seria? A resposta se encontra em como deveria funcionar esse processo segundo a Constituição, que exige que o governo só gaste dinheiro que receba por meio de ‘apropriações feitas por lei’. Em outras palavras, essa abordagem deveria ser baseada em um planejamento claro, com duas casas legislativas – Câmara dos Representantes e Senado – trabalhando em conjunto para criar os 12 projetos de lei de apropriações anualmente necessários para cobrir os gastos do governo, que somaram $1,7 trilhões no ano fiscal 2023.
No entanto, ao analisar mais de perto a execução desse procedimento orçamentário, nota-se que, em 2024, não foi aprovado um único projeto de apropriação dentro do prazo. Apesar de a Câmara ter passado uma versão inicial para metade dos 12 projetos, o Senado não chegou a aprovar nenhum, resultando em um cenário em que nenhuma legislação foi encaminhada para o presidente assinar. Esse resultado é alarmante, considerando que o processo deveria ser finalizado até 30 de setembro, quando começa o novo ano fiscal em 1º de outubro.
Historicamente, o Congresso não tem conseguido cumprir essa tarefa essenciais. Desde 2019, quando cinco projetos de apropriação foram aprovados a tempo, nenhuma legislação similar foi promulgada no prazo. Em uma análise mais profunda, observa-se que, na última década, o Congresso enviou para a mesa do presidente apenas um projeto em 2010 e outro em 2017, revelando uma sequela crônica de ineficiência que poderia ser classificada como um grave problema orçamentário. Os dados disponíveis de relatórios do Office of Management and Budget denunciam essa questão, revelando que o Congresso tem uma clara tendência de procrastinação já observável pelas estatísticas.
Quando o Congresso falha em passar as apropriações normais, a prática usual é aprovar um projeto de lei de financiamento temporário, conhecido como ‘resolução continua’ ou ‘CR’. Esse tipo de projeto, que provavelmente faz a alegria de alguns e a irritação de muitos, garante que o governo continue funcionando enquanto outra solução orçamentária é negociada. Entretanto, essa sistemática apenas ‘compra tempo’, frequentemente mantendo os gastos do ano anterior e não endereçando as reais necessidades do governo.
A falta de um planejamento orçamentário adequado gera uma série de ineficiências. O Relatório da GAO de 2022 identificou essas deficiências e salientou como a burocracia federal se habituou à incerteza do processo, onde as resoluções continuam surgindo dependendo do ano e da dinâmica política. Recentemente, os desafios de evitar um shutdown (interrupção dos serviços) tornaram-se rotina, na ponta de uma espada cujas lâminas afiam anualmente com novas crises orçamentárias.
Com esse ciclo incessante de improviso, o Congresso já não se dá conta de que a maioria das resoluções continua tramita sem que se alcance um consenso. De acordo com informações fornecidas pelo Congressional Research Service, em todos os anos fiscais desde a implementação do atual processo orçamentário, houve pelo menos uma resolução continua em quase todas as situações, exceto em 1997. Isso acentuou a dependência do Congresso dessa manobra como parte do cotidiano legislativo.
Por fim, o tempo necessário para que o governo permaneça financiado e evitando uma interrupção é uma questão que recai sobre as costas dos líderes de hoje no Congresso. Donald Trump e Elon Musk se tornaram símbolos de uma política onde a eficiência parece ter sido superada por interesses pessoais e convicções ideológicas que, na maioria das vezes, não atendem ao bem maior ou às necessidades nacionais. A pergunta que permanece é: como o Congresso coletivamente e os cidadãos individualmente lidarão com essa realidade?
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