Na manhã do dia seguinte à Páscoa de 2023, Dana Mitchell dirigiu-se ao trabalho como qualquer outro dia. Tomou um café e caminhou até a sala de conferências para a reunião matinal habitual de segunda-feira. Enquanto conversava com um colega sobre o bronzeado que havia adquirido nas férias, um acontecimento trágico e inesperado iria mudar suas vidas para sempre.
Ela levantou o olhar e avistou um outro colega, Connor Sturgeon, na porta. Ele segurava uma arma. O caos se instalou quando ele começou a disparar contra Dana e seus colegas no Old National Bank, localizado em Louisville. Em questão de minutos, cinco funcionários do banco foram mortos e outros oito ficaram feridos, incluindo Dana, antes que ele fosse neutralizado pela polícia de Louisville que chegou à cena do crime.
Este incidente não foi, de maneira alguma, um evento isolado nos Estados Unidos. A cada ano, centenas de trabalhadores perdem a vida de maneira violenta em seus ambientes de trabalho. De acordo com um relatório divulgado pelo Bureau of Labor Statistics, o número de homicídios no local de trabalho chegou a 458 em 2023, uma média de quase nove pessoas por semana. Embora este total tenha diminuído em relação às 524 mortes registradas em 2022, o fato de que entre 2018 e 2023 ocorreram 2.762 homicídios em locais de trabalho, apresenta um quadro preocupante para a segurança no trabalho.
O risco de ser assassinado no trabalho é apenas uma das muitas ameaças que os trabalhadores enfrentam diariamente. O mesmo relatório revela que 5.283 pessoas morreram no trabalho em 2023, com os acidentes de transporte sendo a principal causa de morte, responsável pela vida de 1.942 profissionais. Na sequência, as quedas, tropeços e escorregões contribuíram para 885 mortes. No entanto, estas foram mortes acidentais, enquanto os homicídios, por sua natureza, têm um peso e uma preocupação muito maiores.
Com a recente atenção dada ao tema dos homicídios no trabalho, especialmente após o tiroteio fatal do CEO da UnitedHealthcare, Brian Thompson, em um hotel em Nova York, a tragédia que ocorreu no banco se torna ainda mais pungente. A morte de Thompson foi um evento notório, mas muitos homicídios no trabalho não atraem a mesma atenção da mídia. Enquanto tiroteios em massa, como o de Old National Bank, podem receber alguns dias de cobertura nacional, muitos outros incidentes, em que uma única pessoa é morta, muitas vezes passam despercebidos, recebendo apenas atenção local.
A desconexão com a realidade dos ataques armados
Muitos trabalhadores, como Dana e seus colegas, se mostram completamente alheios a estas estatísticas e aos riscos que realmente enfrentam. “Eu trabalhei em bancos por quase 40 anos e nunca considerei a segurança uma preocupação no meu trabalho”, revelou Dana. Apesar das exigências da empresa para assistir a um vídeo de treinamento sobre atiradores ativos, ela admitiu que mal se lembrou do que viu, acreditando que nunca aconteceria em seu local de trabalho.
O estrondo das balas, a atmosfera de pânico e o desespero invadiram o cotidiano calmo do banco. “As pessoas estavam correndo para fora da sala de conferências. Algumas conseguiram escapar, outras não”, lembrou Dana, que antes da tragédia se divertia falando sobre suas férias com os colegas. A situação que se desenrolou rapidamente transformou o que deveria ser um dia comum em um pesadelo.
Nos primeiros momentos do tiroteio, Dana tentou se esconder, mas foi atingida nas costas enquanto se escondeu no chão, rezando para que o atirador não a notasse. Como ela mesma disse, “Eu não sabia se ele ainda estava lá, pensando se isso realmente estava acontecendo comigo. Se esta era a maneira como eu iria morrer”.
O frequente problema das mortes no trabalho
Infelizmente, como mostra o relatório, a realidade é que assassinatos ocorrem em locais de trabalho americanos uma média de três vezes por semana. Os profissionais que falecem frente a esta situação abrangem diversas áreas de atuação, incluindo funcionários de escolas que se tornaram vítimas em tiroteios, assim como policiais em serviço. No entanto, a maioria dos homicídios ocorre em profissões que parecem ser mais seguras, como o comércio varejista. Dos 306 trabalhadores do varejo que morreram no trabalho, 94 foram assassinados, ultrapassando em um o número de policiais e guardas de segurança que perderam suas vidas.
O aumento dos assassinatos em trabalho leva a uma reflexão importante sobre a segurança dos empregados. Não somente em situações graves, mas também na maneira como muitos trabalhadores se sentem despreparados para lidar com tais ameaças. Em um estudo realizado pela American Psychological Association, descobriu-se que apenas um quarto dos adultos afirmou estar estressado pela possibilidade de um tiroteio em massa. O mesmo estudo revelou que o dobro de pessoas expressou preocupação com eventos públicos, como desfiles ou eventos esportivos.
Falta de treinamento nas empresas
A falta de treinamento é alarmante. Jessica Martinez, diretora executiva do National Council on Occupational Safety and Health, afirmou que “a média de uma criança da terceira série recebe um treinamento melhor sobre como agir em caso de um atirador ativo do que a maioria dos trabalhadores”. Ela também destacou que muitos estados exigem que os alunos participem de exercícios de lockdown várias vezes ao ano. A disparidade é visível, enquanto os CEOs, após tragédias como a de Thompson, recebem maior segurança, a maioria dos trabalhadores não conta com o mesmo nível de proteção e preparação.
Dana, que também se considera uma defensora do direito de ter armas, expressou o desejo de ver limites impostos à posse pública de rifles de estilo militar, como o que Connor Sturgeon utilizou. “Essas armas são um exagero”, declarou, enfatizando a necessidade de controles mais rigorosos para impedir que pessoas com problemas de saúde mental adquiram armas de fogo.
Três meses após a tragédia, Dana retornou ao trabalho, mas se sentiu forçada a deixar a posição no início deste ano para cuidar de um familiar. “É muito difícil estar no banco”, admitiu. A culpa do sobrevivente a assombrava, especialmente ao lembrar-se dos cinco colegas que perdeu. “Notar que estou aqui e eles não está me deixando extremamente triste e enfurecida”, lamentou Dana.
Um chamado para a mudança
As estatísticas sobre os homicídios no trabalho são mais do que números frios; elas representam vidas perdidas, histórias interrompidas e comunidades devastadas. As vítimas e suas famílias merecem mais atenção e proteção no ambiente de trabalho. A sociedade precisa se unir para exigir reformas que promovam a segurança e a conscientização sobre essas questões, indo além dos noticiários e se traduzindo em ações significativas para a prevenção de futuras tragédias.